Se depender de relatório apresentado na Câmara dos Deputados, em Brasília, para criar o Estatuto de Controle de Armas de Fogo, taxistas e caminhoneiros passarão a poder trabalhar armados pelas ruas e estradas do país. O Estatuto do Desarmamento, em vigor, faculta essa permissão apenas a policiais e outros profissionais da área da segurança e Justiça. Caso o texto preparado pelo relator, o deputado federal mineiro Laudívio Carvalho (PMDB), seja aprovado sem modificações na comissão especial criada para avaliar o tema, o projeto de lei vai a votação no plenário. Na sessão de quinta-feira, um pedido de vista coletivo adiou a votação do relatório para semana que vem.
Porém, aumentar a permissividade para o porte de armas é tema que alarma especialistas em segurança, especialmente quando se trata de colocar armamento nas mãos de profissionais que vivem em um contexto de conflito, como o trânsito. Para o pesquisador do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp) da UFMG Frederico Couto Marinho, a realidade brasileira é violenta e, grande parcela dessa realidade é provocada por armas de fogo. “Temos aqui o maior número absoluto de homicídios do planeta e parte por motivos banais, como brigas de vizinho e de trânsito e violência doméstica”, destaca o pesquisador. “Não se pode inserir um fator que leva ao crime e que pode aumentar a taxa de homicídio em uma sociedade como a brasileira”, afirma Marinho, para quem a intenção do deputado é a de aumentar a sensação de segurança, mas ignora o grau de violência da sociedade.
O presidente do Sindicato dos Taxistas de Belo Horizonte e Região Metropolitana, Ricardo Faeda, acredita que andar armado pode ser positivo para a categoria, embora pondere que o assunto mereça análise de estudiosos. “Quando um criminoso entra em um táxi para assaltar, se o taxista estiver armado, terá uma oportunidade de defesa e de resguardar sua vida”, argumenta. O sindicalista destaca, porém, que não tem conhecimentos técnicos sobre o assunto e espera que os responsáveis pela legislação sejam respaldados por especialistas em segurança pública.
Relator da proposta, o deputado Laudívio Carvalho argumenta que seu relatório apenas explicita algo que já estava previsto no Estatuto do Desarmamento.
“Eu só trouxe para o conhecimento das pessoas o que já prevê o atual estatuto. Ele prevê que o proprietário pode manter arma em sua residência ou local de trabalho”, afirma. A proposta pode contornar decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que não permite carregar armas nos táxis, caminhões e embarcações, mesmo que estes sejam entendidos como locais de trabalho.
O coordenador do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, avalia que a propostas teria um impacto ruim para a segurança pública. “As pessoas precisam pensar como será conviver com taxistas e caminhoneiros andando armados. Como será da noite para o dia conviver com pessoas com arma na cintura”, considera Langeani. O coordenador da ONG aponta que 70% dos homicídios do Brasil são cometidos por arma de fogo e que as alterações propostas pelo deputado favorecem a entrada de mais delas em circulação.
Origem
O deputado Laudívio Carvalho foi eleito pela primeira vez no ano passado, e faz parte de um grupo de parlamentares conhecido como Bancada da Bala, pelo apoio a leis controversas, como a ampliação das possibilidades de armamento da população e redução da maioridade penal. Antes de ser político, o radialista apresentava um programa policial em uma rádio de Belo Horizonte. Para o parlamentar, o cidadão que não acredita no sistema de segurança pública tem direito de comprar uma arma.
O estatuto e o projeto
O Estatuto de Desarmamento, de 2003, permite que qualquer cidadão tenha a posse de arma, desde que seja submetido a testes psicotécnicos e não tenha antecedente criminal. A posse, entretanto, permite apenas que a arma fique em casa ou no local de trabalho. Já o porte de arma, que permite ao cidadão circular com o armamento, é restrito apenas aos profissionais da segurança pública e Justiça. Além de taxistas e caminhoneiros, o relatório apresentado na Câmara prevê que deputados, senadores, funcionários do Ibama, agentes de trânsito, aposentados das polícias e das Forças Armadas e mais servidores do Poder Judiciário tenham direito ao porte. Outra mudança é que o estatuto em vigor exige renovação do registro da arma de três em três anos, enquanto a proposta pretende tornar o registro definitivo. Pela lei atual, para obter o registro, é preciso ter mais de 25 anos de idade e não possuir antecedentes criminais. O texto de Carvalho reduz a idade para 21 anos.
(Fonte: Jornal Estado de Minas)