Comissão ouve relatos de constrangimentos e humilhações impostos a mulheres em visitas a familiares detidos.
Constrangimentos, violência e abusos impostos repetidamente a familiares de presos, principalmente mulheres, são comuns durante revistas íntimas em dias de visita nas unidades do sistema prisional mineiro. A denúncia foi reiterada em diversos pronunciamentos feitos durante audiência da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas (ALMG) realizada na manhã desta quarta-feira (17/6/15). A reunião foi requerida pelo deputado Gilberto Abramo (PRB), autor do Projeto Lei (PL) 821/15, que proíbe a realização do procedimento nos presídios do Estado.
Mãe de um ex-presidiário, Cleusa Rodrigues de Souza deu um emocionado testemunho, lembrando o período em que visitou o filho. “As mulheres submetidas à revista íntima são na maioria humildes e negras, massacradas emocionalmente. Eu me sentia invadida, e hoje tenho marcas que nunca me deixarão. Presenciei cenas difíceis de descrever, uma realidade que fere e macula a alma, deixando marcas muito profundas que nem o tempo pode apagar”, desabafou.
Para Maria Tereza dos Santos, presidente do Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade, os familiares são tratados como se o único propósito das visitas fosse levar objetos ilícitos aos presos. “Mas o que se apreende com os familiares é muito pouco se considerarmos tudo o que é encontrado hoje dentro do sistema”, defendeu. “É preciso colocar escâner corporal nos presídios e oferecer uma capacitação em direitos humanos para os profissionais – os palavreados que eles usam e as humilhações que impõem aos visitantes são absurdos. E os abusos são cometidos com a conivência de muitos dirigentes de presídios”, denunciou.
Ermelinda Fátima Ireno de Melo, superintendente do Consórcio Regional de Promoção da Cidadania Mulheres das Gerais, ressaltou que a revista íntima é uma extensão da pena dos presos imposta às mulheres, sobretudo as pobres e negras. “Os dados mostram que a maior quantidade de objetos ilícitos que entra nos presídios não vem de familiares. Mas é mais fácil transferir a responsabilidade às parentes dos presos, em vez de aceitar que a maioria desses objetos no sistema é decorrente da corrupção dos agentes internos”, alertou.
A promotora Nívia Mônica da Silva também reiterou que as mulheres são as grandes vítimas da revista íntima. “Esse tipo de ação é ineficiente para impedir a entrada de armas, drogas e celulares nas penitenciárias. Outras ferramentas deveriam ser utilizadas, como detectores de metal, escâner corporal e bloqueadores de celular”, ressaltou. De acordo com ela, em 2013 houve uma média de 500 apreensões de objetos ilícitos por mês no sistema prisional do Estado, e desse total, apenas 11 foram encontrados com visitantes.
O assessor jurídico da Pastoral Carcerária, Paulo César Malvezzi Filho, informou que, no Estado de São Paulo, onde foram realizadas 3,5 milhões de revistas em 2014, em apenas dois casos foram encontrados objetos ilícitos.
Revista íntima já foi abolida em outros Estados
Em Goiás, a revista íntima foi abolida em 2012, segundo o promotor Aroldo Caetano da Silva, da Promotoria de Execução Penal daquele Estado. Segundo o promotor, o fim da revista íntima não aumentou a insegurança nos presídios nem o número de objetos ilícitos apreendidos no sistema prisional.
Ele exibiu um vídeo mostrando como era feita a revista em Goiás, com todas as mulheres nuas em ambiente coletivo. Segundo ele, isso era feito com adolescentes e até idosas de mais de 80 anos – filhas, mães e irmãs de presidiários. Segundo o promotor, o vídeo expõe a forma como a revista ainda ocorre em muitos Estados, inclusive em Minas Gerais. “É preciso um pouco mais de compromisso ético do Estado para acabar com tal abuso”, defendeu.
O defensor público Fernando Camargos ressaltou que o Estado precisa avançar na criação de instrumentos que coíbam esse tipo de prática, como ocorreu recentemente no Rio de Janeiro, outro Estado que já conseguiu acabar com a revista íntima, segundo ele. “O próprio desnudamento das mulheres já configura revista vexatória. Impingir aquela humilhação às pessoas já é uma condenação e viola o princípio da presunção de inocência”, alertou.
Subsecretário alega que é preciso garantir segurança nas prisões
O subsecretário de Estado de Administração Prisional, Antônio de Pádova Marchi Júnior, fez uma explanação sobre o sistema prisional mineiro, destacando as dificuldades decorrentes da superlotação e do número insuficiente de agentes penitenciários.
Ele ressaltou a importância de se trabalhar para garantir segurança a familiares, sentenciados e agentes, abordando as implicações de se acabar imediatamente com a revista íntima. Segundo ele, é preciso levar em conta os custos dos equipamentos necessários para substituir a revista íntima. Por outro lado, afirmou que levará o debate para agentes e diretores, sobretudo em relação “à efetividade de sempre haver respeito aos direitos humanos”.
O ouvidor do Sistema Penitenciário, Marcelo Costa, ressaltou que os servidores precisam compreender que a sua atividade não pode vir carregada de vingança ou preconceito. Ele também destacou a necessidade de se intensificar a capacitação dos profissionais para minimizar os constrangimentos e humilhações que ocorrem na revista íntima. “Qualquer procedimento, por mais difícil que seja, é menos danoso quando feito com educação e respeito”, avaliou.
Visita a Goiás – O deputado Gilberto Abramo destacou que, com o fim da revista íntima, poderiam ser reduzidas outras despesas públicas, como as da área de saúde, decorrentes das consequências emocionais e físicas dessa situação para as mulheres submetidas a esse constrangimento.
O deputado João Leite (PSDB) lembrou uma série de leis já existentes que garantem os direitos individuais e coíbem abusos como os que foram relatados na reunião. Por fim, apresentou requerimentos de ações e providências decorrentes da audiência, como uma visita a Goiás para conferir os resultados do fim da revista íntima naquele Estado.
(Fonte: ALMG)