Valorização da carne chama atenção para a importância da renovação do rebanho bovino comercial em Minas Gerais

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Apesar da pandemia da covid-19, tirando o sossego de brasileiros e afetando as variadas cadeias econômicas produtivas do país, a pecuária de corte no Brasil atravessa um bom momento, com a valorização da carne bovina, principalmente no mercado internacional.  Em Minas Gerais, por exemplo, o preço à vista da arroba do boi gordo (equivalente a 15 quilos), tendo como referência, dados da Scot Consultoria, do último dia 14, variava de R$ 218,50, no Sul mineiro, a R$ 225,50, em Belo Horizonte. 

No mercado interno, sustentados pelo bom desempenho das exportações e pela baixa oferta de animais prontos para o abate, os preços do boi gordo seguem firmes, segundo avaliação de pesquisadores do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Escola Superior de Agricultura Luiz Queiroz (Esalq), pertencente à Universidade de São Paulo (USP). Para o Cepea, a expectativa é que as exportações da carne mantenham o bom desempenho, demonstrado nos sete primeiros meses de 2020, tanto em volume quanto em receita.

De janeiro a julho, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), os embarques de carne bovina in natura totalizaram 946,67 mil toneladas, 17,2% superiores aos dos sete primeiros meses de 2019 e um recorde para o período. Em julho, especificamente, as exportações brasileiras de carne in natura somaram 169,24 mil t, apenas 0,73% abaixo do recorde verificado em outubro do ano passado.

O cenário, portanto, é bastante favorável à bovinocultura de corte no país, e, naturalmente em Minas Gerais, como confirmam profissionais da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG). A empresa pública mineira é vinculada à Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa-MG). 

“O bezerro de corte de qualidade teve uma valorização de 50% do valor da arroba do boi gordo, hoje estimado na faixa de R$ 200 a R$ 220 e existe uma tendência de permanecer essa valorização, por um motivo muito simples. O mercado está exigindo um animal que tenha condição de abate de até dois anos de idade, com peso morto variando de 21 a 24 arrobas”, explica o coordenador técnico de Bovinocultura, o engenheiro agrônomo José Alberto de Ávila Pires. Segundo Ávila, essa onda do mercado da pecuária de corte, que considera “excepcional”, deverá permanecer, mesmo com a pandemia, causada pelo novo coronavírus, prejudicando outros setores da economia.

Pró-Genética e Pró-Fêmeas

O diretor técnico da Emater-MG, Feliciano Nogueira, também reconhece o bom momento vivido pela bovinocultura de corte. “É um momento muito especial, esse que a pecuária de corte vem passando, em termos de mercado. A demanda por bezerros de qualidade está extraordinária”, admite. Nogueira chama atenção para o Programa de Melhoria da Qualidade Genética do Rebanho Bovino de Minas Gerais (Pró-Genética/Pró-Fêmeas), que tem por objetivo promover o aprimoramento do rebanho bovino do Estado e assim fortalecer as cadeias produtivas de carne e leite. Segundo o diretor técnico, “é preciso levar em conta, a importância econômica, social e até ambiental (pois são grandes as áreas de pastagens) da bovinocultura, em Minas Gerais”. 

De fato, os números sobre a atividade chamam a atenção. O estado mineiro possui 360 mil propriedades rurais que têm na bovinocultura, sua principal prática. Na produção de leite, Minas ocupa o primeiro lugar no ranking brasileiro.  São 9,5 bilhões de litros de leite, o equivalente a R$ 15,3 bilhões, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que considera a média de R$ 1,61 por litro de leite, preço pago ao produtor, em julho deste ano. O volume da produção de leite mineiro equivale a cerca de 27 a 28% da produção brasileira, estimada em 33,840 bilhões de litros. O estado é também o segundo produtor de carne no Brasil, com produção anual de cerca de 1 (hum) milhão de toneladas, o equivalente a R$ 14 bilhões, de acordo dados do IBGE. No total, as duas cadeias, leite e carne representam cerca de R$ 29,3 bilhões, sendo 52,22% referentes ao leite e 47,78% à carne. 

Tornado uma política pública do Estado mineiro, o Programa Pró-Genética/Pró-Fêmeas é coordenado pela Seapa-MG e executado por suas vinculadas Emater-MG, Epamig e IMA. O trabalho é feito em parceria com associações de criadores de animais de alta linhagem genética, como a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), prefeituras municipais e instituições privadas do tipo:  sindicatos de produtores rurais, cooperativas agropecuárias e agentes financeiros. A proposta é estimular a renovação do rebanho comercial, de pequenos e médios produtores, dando a eles as oportunidades de terem animais de genética superior, os mesmos já presentes nos chamados rebanhos de núcleos ou rebanhos de elite.

Em cada município, o Pró-Genética/Pró-Fêmeas é realizado por meio de feiras e leilões, promovidos por um arranjo local entre as instituições parceiras. Produtores interessados em adquirir touros e matrizes geneticamente superiores, comparecem nestes eventos e negociam diretamente com os criadores/vendedores. Antes da pandemia da covid-19 essas feiras e leilões eram presenciais, agora deverão ser todas on-line. 

A nova modalidade foi inaugurada no período de 1º a 7 de agosto com a realização da 1º Feira Virtual do Pró-Genética e Pró-Fêmeas do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. “O programa trabalha no incentivo ao uso desses animais melhorados e melhoradores pelos criadores do rebanho bovino comercial”, explica o coordenador técnico da Emater-MG e agrônomo, José Alberto de Ávila Pires, que aponta o potencial reprodutivo de um touro aprimorado. Segundo ele, um touro dessa estirpe é capaz de acasalar 50 vacas e deixar 40 crias.

Na mesma linha de raciocínio, o diretor técnico da empresa pública de extensão rural também complementa: “O programa nada mais é que um processo de democratização da genética melhorada, produzida pelos criadores e suas associações. É um veículo para que essa genética chegue a esses rebanhos comerciais, qualificando os animais, a partir das crias do touro melhorador ou da fêmea melhoradora e gerando mais eficiência para esse produtor”.

Pesquisa 

Pesquisa realizada em 2016, pelo Instituto de Políticas Públicas e Desenvolvimento Sustentável da Universidade Federal de Viçosa (UFV), a pedido da Seapa-MG, apurou indicadores que comprovam o impacto positivo do Programa de Melhoria da Qualidade Genética do Rebanho Bovino de Minas Gerais, na produção e produtividade do produtor que investiu em touros, adquiridos por meio do programa.

O levantamento, feito com 166 produtores, divididos em dois grupos: tratamento (beneficiários do programa) e controle (não beneficiários), conseguiu mostrar por exemplo, que a taxa de parição foi 5% maior entre os beneficiários do Pró-Genética. Apurou também que o peso médio do desmame nos beneficiários foi 0,76 arrobas a mais em comparação aos não beneficiários do programa. “Isso são indicadores relevantes, pois mostram que o touro melhorado consegue transferir para os seus filhos, características produtivas de herbabilidade média-alta, o que tem um impacto significativo”, explicou o professor Marcelo José Braga, que liderou o estudo da UFV.

A pesquisa também conseguiu aferir evidências que comprovam os bons resultados do Pró-Genética, a partir das opiniões expressadas pelos entrevistados sobre o programa. Foi apurado por exemplo, que 78% dos produtores relataram um melhoramento do rebanho bovino. Para 60,84%, os bezerros foram desmamados mais pesados e 52,40% mencionaram que as filhas deram mais leite. Outros 31,32% dos pesquisados consideraram que a renda melhorou.

Tais constatações reforçam os testemunhos de pequenos e médios produtores, atendidos pela Emater-MG e que foram ouvidos pela reportagem. Todos eles revelaram em seus depoimentos, sentimentos de satisfação e realização com os resultados de suas experiências de renovação do rebanho, a partir do Pró-Genética. 

Produtores 

Em Ituiutaba, no Triângulo Mineiro, o médio produtor Cláudio Roberto Pereira, dono da Fazenda Santa Rita, onde reside com a família, está, aos poucos, investindo na genética de seu rebanho, que ele diz ser pequeno, porque o local não comporta muitos animais. Cláudio comprou pelo Pró-Genética, com recursos próprios, um guzerá leiteiro e um nelore, que já gerou um bezerro, hoje com 15 meses.

“Normalmente, o bezerro comum custa R$ 2 mil, mas o filho do touro melhorado já está valendo R$ 200 a mais”, comemora.  Segundo Cláudio, ele recomendaria, sim, a compra de animais melhorados, por meio do programa e aponta a negociação direta com os criadores como mais um fator positivo. “Fiquei muito satisfeito, os bezerros são melhores e pude negociar com os donos dos touros”, conclui.

Da mesma região do Triângulo Mineiro, o produtor de Santa Vitória, Ésio Paranaíba Junior, considera que fez uma “ótima compra” na feira de Pró-Genética, realizada no seu município, em 2018. Na ocasião, ele comprou um garrote de corte, da raça nelore, de dois anos, no valor de R$ 6,5 mil com recursos próprios. A compra, bem negociada com o criador da raça, foi parcelada com cheques, segundo Ésio.

“O grande diferencial de uma feira do Pró-Genética é a diversidade de produtores, com touros de vários tipos de genética e linhagem, dando ao comprador mais opções de animais aperfeiçoados. A diversidade aumenta as chances de o produtor ter um resultado melhor dos filhos nascidos do cruzamento do touro melhorado com uma vaca”, garante.  Ésio informa que o touro melhorado, adquirido na feira do Pró-Genética, já reproduziu 40 crias, entre machos e fêmeas e que todos os bezerros foram vendidos.

“Até no visual a gente enxerga a superioridade de um touro melhorado geneticamente. Ele é mais pesado, mais forte. Meu rebanho hoje tem animais adquiridos de três produtores diferentes. Não tem outro caminho para renovar o rebanho”, afirma. Ésio Paranaíba diz que se enquadra entre médio e pequeno produtor.

Entusiasta do Programa Pró-Genética/Pró-Fêmeas e pecuarista em Itinga, no Vale Jequitinhonha, Júlio Otoni, tem uma propriedade de 77 hectares e um rebanho bovino de 35 cabeças da raça Tabapuã. Apesar de ser considerado pequeno produtor, Otoni afirma ter mais produtividade, em sua propriedade, do que muita fazenda grande, pois investe na renovação genética de seus animais e em tecnologias tais como, trator e balança, agregando valor a sua atividade.  Júlio garante que não perde um evento do programa, na região, e que já comprou três tourinhos e fêmeas em feiras realizadas pelo programa.

“O meu plantel melhorou muito, pois pude acessar o crédito rural, o que facilitou bem. Tem produtor que quer quantidade e não valoriza a qualidade. Mas é na qualidade do rebanho que a gente consegue diminuir custos e agregar valor a um bezerro, por exemplo. Mais quantidade significa também mais gastos com sal, remédios e mão de obra, com a contratação de mais vaqueiros”, argumenta. Ainda conforme o pecuarista de Itinga, os três tourinhos comprados via Pró-Genética já procriaram e foram todos vendidos. “E tem fila de espera por mais. É por isso que é bom investir em genética”, avisa. 

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