A Vale, BHP e Fundação Renova foram duramente criticadas em audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada na Casa nesta quarta-feira (18/9/19). Denúncias envolvendo as empresas e a fundação apontam para criminalização de pessoas pertencentes às comunidades tradicionais da região de Ponte Nova (Mata). Nenhum representante das três instituições compareceu à reunião.
O promotor de Justiça e coordenador de Inclusão e Mobilização Social (Cimos), André Sperling Prado, disse que as empresas controlam a fundação, criada para que elas escapassem das críticas devidas. “A Renova quer lucrar com a diminuição das indenizações e da penalização das empresas. Absurdo que o criminoso possa apontar quem é a sua vítima e quem vai receber indenização. Sem cabimento a demora em reconhecer os pescadores de subsistência como atingidos. A fundação deveria indenizar, mas pensa no lucro e não na reparação”.
O procurador regional dos Direitos do Cidadão e coordenador da Força Tarefa do Rio Doce do Ministério Público Federal, Helder Magno da Silva, denunciou que a fundação tentou descaracterizar as atividades dos garimpeiros faiscadores e pescadores artesanais, alegando que garimpo é ilegal e por isso eles não deveriam ser indenizados.
“Discutimos e mostramos que era uma atividade tradicional, mas a situação dos pescadores ainda está em aberto. Só porque não vivem na beira do rio eles não tiram o sustento dele? Essa é uma estratégia de negação de direitos. Não trabalham pela reparação integral, mas pelo pagamento mínimo. E os governos federais e estaduais estão do lado das empresas e contra os atingidos. Sabemos que o estado colocou dentro do Comitê Interfederativo (CIF), no Ibama, pessoas para dizer ‘sim’ à Renova, pessoas acessíveis às empresas”, revoltou-se.
Sperling lembrou que o CIF foi criado para regular as ações da Renova, mas que a fundação têm recorrido ao judiciário em várias ocasiões, esvaziando essa regulamentação.
Coordenador do Programa de Mapeamento de Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais da Universidade Federal de Minas Gerais, Aderval Costa Filho enfatizou que desde o começo as empresas têm usado estratégias desclassificatórias, colocando garimpo e pesca apenas como atividades financeiras e afirmando que essas comunidades não estão nas áreas impactadas diretamente.
“Garimpo e pesca não estão sendo considerados como modo de vida, os vínculos comunitários estão sendo desprezados. E quem faz uso do rio nem sempre é ribeirinho. Nós trabalhamos na nossa pesquisa com dimensão demográfica, não com os limites políticos estabelecidos. A Renova reclama que mexemos ‘onde não somos chamados’. Mas eu sou perito, tenho competência técnica, não vou fazer meu trabalho de forma precária só porque convém à empresa”.
O pesquisador se disse, ainda, preocupado com o grande sofrimento emocional que está constatando nos depoimentos dos atingidos. “Muitos fazendo uso de antidepressivos e esse número só tem crescido. Vamos entregar resultados dos questionários que estamos aplicando em tempo hábil e além disso fazer a mensuração das perdas e danos. Mas é um absurdo condicionar a indenização à entrega dessas pesquisas”, explicou.
Membro da Comissão dos atingidos de Rio Doce, Ronaldo Adriano de Sousa questionou a decisão da fundação de não dar direito ao auxílio emergencial para os atingidos que estejam trabalhando. “Hoje eu se não tivesse trabalhando minha família etária passando fome porque meu direito não foi reconhecido. Acabam com nosso rio, despejam lama e dizem que se eu tiver outro trabalho não tenho direito ao auxílio emergencial? Isso é absurdo. E se a lama andou cinco quilômetros dentro de Ponte Nova como que a cidade não foi atingida? E quem morreu não foi só o rio, mas também as cidades”.
O coordenador de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Secretaria de Estado de Governo, Clever Alves Machado, disse que levará todas as denúncias para serem discutidas na Câmara Técnica de Certificação e na Comissão de Populações Tradicionais dentro da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese). “Temos aparatos legais que garantem a fiscalização fundamental da fundação e que o diálogo seja constante”.
Os deputados do PT Beatriz Cerqueira, Betão e Leninha também questionaram a atuação da fundação e o posicionamento das empresas. “Eles destroem o rio e o modo de vida das pessoas e nós que temos de provar esses direitos? Como transformar sossego e liberdade em dinheiro? Não tem como. Não vai repor a destruição na vida dessas pessoas. Foi um erro nosso não ter criado um controle e monitoramento dessa fundação e levamos esse aprendizado para a CPI de Brumadinho”, completou a deputada Beatriz Cerqueira.
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