O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) obteve decisão favorável em uma ação civil pública que pedia a proibição da comercialização de animais vivos no Mercado Central, em Belo Horizonte. A decisão se deu em caráter liminar e foi publicada na última sexta-feira (4). A partir da notificação, os vendedores terão um prazo de dez dias para se adequar, sob pena de multa diária de R$ 10 mil para cada comerciante.
Um dos principais pontos turísticos da capital mineira, o Mercado Central foi fundado em 1929. O corredor onde ocorrem as vendas de animais é um dos mais antigos. Cachorros, gatos, coelhos, hamsters e diversos tipos de aves, como patos, galinhas, marrecos, pavão, pássaros e codornas são mantidos em gaiolas no local.
A ação cita 26 estabelecimentos. Os promotores do MPMG sustentam que há diversas irregularidades nesses locais. “A comercialização desses animais não é vedada pela legislação. Eles podem ser vendidos. O que nós estamos acompanhando são as condições em que este comércio e o manejo dos animais estão sendo realizados”, diz a promotora Lílian Marotta. Entre os problemas, segundo o Ministério Público, estão as más condições de higiene, organização, espaço, ventilação e iluminação. O grande número de animais compartilhando espaços pequenos e o controle sanitário insuficiente também foram destacados pelo MPMG.
Os promotores realizaram um amplo levantamento sobre a questão e descobriram que já em 1997 havia um procedimento aberto no MPMG em relação à situação. “Encontramos várias ocorrências contendo reclamações de consumidores e usuários do mercado questionando o desconhecimento da procedência das espécimes e a falta de aplicação de vermífugos e vacinas. Pessoas também reclamaram que compraram animais que contaminaram outros animais em suas casas”, afirma Lílian.
Para corroborar as alegações, foram anexados ao processo laudos técnicos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Instituto Mineiro de Agropecuária, da Polícia Civil e do Conselho Regional de Medicina Veterinária, que tem uma resolução desde 2014 fixando regras para venda e exposição de animais. Segundo Lílian, foram feitas reuniões com o município e com o Mercado Central para estudar adaptações no edifício que permitissem oferecer melhores condições aos animais, mas o MPMG acabou concluindo que o local não é apropriado para esse tipo de comércio.
Os promotores apontaram também a existência de riscos para a saúde pública, considerando que o Mercado Central recebe cerca de 15 mil visitantes diários e é um local para venda de alimentos, onde existem inclusive bares e restaurantes. “A lei que criou o Código Sanitário de Belo Horizonte proíbe que animais sejam vendidos nos mesmos lugares que alimentos. A rigor, a legislação municipal não autoriza esse comércio que ocorre no Mercado Central, mas o município tem sido permissivo”, acrescentou Lilian.
Entidades de proteção aos animais já vinham reivindicando a proibição há alguns anos. Para a Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda), a prefeitura de Belo Horizonte sempre evitou tomar uma ação. “É um grande passo. Há cinco anos, denunciar maus-tratos de animais era muito complicado. Era como se a cultura aceitasse que os animais pudessem ser tratados de forma cruel. Essa situação tem mudado e uma ação como essa certamente contribui muito para que essa mudança se fortaleça”, destaca Maria Dalce Ricas, superintendente executiva da associação.
A ativista destaca que o Mercado Central é coberto e totalmente fechado. “Ali não tem luz solar, que é fundamental para qualquer espécie viva. Os animais passam a noite lá, sem espaço para se movimentarem. Fora o estresse a que são submetidos, sendo manipulados constantemente e entregues ao barulho intenso do ambiente”. Para Maria Dalce, a decisão judicial tem o valor pontual de dar dignidade a esses animais e também a importância de contribuir para uma mudança de comportamento da sociedade. “Nós entendemos que a relação das pessoas com os animais domésticos influencia diretamente na cultura de proteção ao meio ambiente”.
A comerciante Vilma Cardoso reclama de falta de diálogo e diz que representantes do Ministério Público estiveram na loja dela há muito tempo para verificar documentação. “Eu trabalho aqui há 26 anos. Essa loja tem 70 anos. Ela foi do meu pai e quando ele morreu eu passei a tomar conta, para cuidar da minha mãe e da minha familia. Isso é o nosso trabalho”, diz.
Vilma refuta acusações de maus-tratos. Segundo ela, a rotatividade é grande, e os animais ficam no máximo uma semana no estabelecimento. “Estão subestimando a inteligência dos meus clientes. Dizendo que eles não sabem identificar um animal saudável. Claro que sabem. E aí como vou tratar mal os animais que vou vender? Eu alimento muito bem porque quero atrair os clientes.”
Por meio de sua assessoria, o Mercado Central informou que ainda não foi notificado da decisão, mas adiantou que irá recorrer. A prefeitura de Belo Horizonte também avisou que não recebeu a notificação e, por enquanto, não irá se pronunciar.
(Agência Brasil)