Robson Conceição tomou muita porrada até se tornar campeão olímpico na Rio 2016 – tanto dentro quanto fora dos ringues. Um dos golpes mais fortes sofrido pelo mais novo medalhista de ouro do peso pena (até 60kg) veio em 2011, na luta com o fenômeno ucraniano Vasyl Lomachenko pelas oitavas de final do Mundial de Baku.
Estrela da Associação Internacional de Boxe Amador (Aiba), duas vezes campeão do mundo e da Olimpíada e, na época, o melhor atleta peso pena da modalidade, Lomachenko estava invicto há seis anos. Robson foi dormir pensando nas quartas de final e acordou eliminado.
“Foi o momento mais feliz e mais triste da minha carreira. Eu tinha vencido a luta por 20 a 19, mas reverteram o resultado por debaixo dos panos. Quando fui para a pesagem, de manhã cedo, recebi a notícia de que tinha sido punido injustamente por um golpe baixo e inverteram o resultado. O ucraniano venceu por 21 a 20”, diz o brasileiro.
Ele poderia ter acusado o golpe depois de ser eliminado de dois Jogos Olímpicos – de 2008 e de 2012 – logo em seu combate de estreia. Mas, em vez de se deixar desnortear pelos fracassos, o boxeador decidiu que ninguém tiraria o ouro dele no Rio de Janeiro, em 2016.
“Ele sofreu muito. Ninguém deu valor para ele quando ele perdeu na primeira. Hoje, ele é campeão olímpico e não conseguiu esse título do dia para a noite”, afirma Mateus Alves, um dos treinadores de Robson.
A trajetória do brasileiro até o título olímpico é muito parecida com o seu plano para a luta “mais difícil de sua vida”: “era tomar um golpe e dar três ou quatro”, disse. Para cada golpe que levou neste caminho, fez questão de revidar com resultados expressivos.
“O cara é duas vezes medalhista mundial, foi a quatro campeonatos mundiais, cinco Jogos Pan-Americanos e tem mais de 250 lutas. O Robson fez um campeonato incontestável, dominou todas suas lutas. Mostrou jogo de golpe, força e rapidez e vontade de ser campeão. Isso é para coroar o esforço dele”, revela Mateus Alves.
“No meu início no boxe, eu fiz umas dez lutas e perdi todas. Se eu tivesse desistido, hoje eu não seria campeão olímpico”, lembra Robson, que começou no esporte meio que na base do improviso.
Robson vibra ao vencer o francês Sofiane (Reuters/Peter Caborra/Direitos Reservados)
Braço machucado
“Eu tinha um amigo que treinava boxe na academia. O que ele aprendia na aula, ele me ensinava na casa dele. A gente colocava um chinelo grudado no outro para servir de manopla. Quando a bandagem acabava, eu passava no posto médico, fingia que estava com o braço machucado e pedia para enfaixar. Era só sair de lá que eu tirava e ia treinar”, confessa.
A vitória em cima do francês Sofiane Oumiha por decisão unânime leva o baiano que já vendeu picolé na praia e foi ajudante de pedreiro a se tornar um dos maiores do boxe brasileiro.
O nome do primeiro brasileiro a levar o ouro no esporte junta-se aos de precursores como Servílio de Oliveira (bronze nos Jogos da Cidade do México, em 1968), Adriana Araújo (bronze em Londres 2012), Yamaguchi Falcão (bronze em Londres 2012) e Esquiva Falcão (prata em Londres 2012). A campanha do título terminou com uma vitória por nocaute técnico e três por pontos.
“Hoje eu acho que fiz história. Mas só é possível com anos de dedicação e trabalho duro. Esta medalha representa a minha vida inteira. A minha infância humilde, as dificuldades que eu tive sem apoio e sem patrocínio. Nós, brasileiros, somos muito aguerridos e sofridos, porém, não desistimos nunca. Essa medalha é tudo para mim. Estou vivendo um sonho e não quero acordar”, afirma ele, que cumpriu a promessa de presentear a filha Sofia, que faz dois anos nesta sexta-feira (19), com o maior prêmio do boxe olímpico. “Ela foi minha inspiração”.
Apesar dos percalços, Robson sempre mostrou uma convicção inabalável de que voltaria para a Bahia com o título olímpico. “Eu tinha muita fé. Sofri muito nos treinos e treinei muito. Eu me desliguei de tudo, desde as redes sociais até o troca-troca de pins na Vila. Eu cheguei com muito foco e muita vontade”.
Com a medalha desta terça-feira (16), o boxe entra na lista de modalidades que, em algum momento da história, já teve um campeão olímpico brasileiro – as outras são atletismo, vôlei de praia, hipismo, ginástica artística, judô, vela, tiro esportivo, natação e vôlei.
(Agência Brasil)