O número de crimes violentos em Minas Gerais mais que dobrou nos últimos quatro anos e o ritmo de crescimento desse problema na zona rural tem acompanhado o das cidades. A constatação é do coordenador do Centro de Pesquisa em Segurança Pública da PUC Minas, Luís Flávio Sapori. Ele participou do Debate Público Segurança no Campo, realizado no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na tarde desta segunda-feira (1º/8/16).
Promovido pelas Comissões de Segurança Pública e de Agropecuária e Agroindústria, o evento teve como objetivo discutir o crescimento da violência na zona rural e propor alternativas para enfrentá-lo. Participaram do debate trabalhadores rurais ligados à Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e produtores vinculados à Associação dos Sindicatos dos Produtores Rurais do Centro de Minas (Asprocem), que, juntos, lotaram o Plenário.
Segundo Luís Sapori, se, em 2012, a média mensal de crimes violentos era de aproximadamente 5 mil (60 mil ao ano), o número de 2015 chegou a 11 mil, totalizando 132 mil crimes violentos anuais. Os dados são da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp), que considera crimes violentos: homicídio tentado e consumado, estupro tentado e consumado, roubos e extorsões mediante sequestro, além de sequestros e cárceres privados.
“Esse número de crimes violentos é o maior da história de Minas Gerais. É um escândalo, uma vergonha. O sentimento de insegurança no campo é o mesmo vivenciado nas cidades em todas as regiões do Estado”, criticou o especialista. Ele refutou o argumento de que o aumento da criminalidade violenta em Minas estaria seguindo uma tendência nacional. “Apenas em alguns estados, como Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte e Rio de Janeiro, o número é crescente. Mas, em outros, como Espírito Santo e São Paulo, a violência está caindo”, destacou.
Trabalhadores e produtores rurais lotaram o Plenário da Assembleia de Minas durante debate público nesta segunda-feira (1º de agosto de 2016) – Foto: Willian Dias / ALMG
Tráfico – Na avaliação de Luís Flávio Sapori, uma das maiores causas desse incremento é a chegada, ao meio rural, do tráfico de drogas, especialmente do crack. “Essa droga gera consumidores compulsivos, que roubam para alimentar o vício. Mas o problema maior é o traficante. Tráfico significa arma de fogo e homicídios”, explica.
Esse fator, avalia Sapori, explicaria apenas uma parte do problema, sendo a outra evidenciada pela atuação deficiente das polícias, da Justiça e do sistema carcerário. Na opinião dele, em Minas, a impunidade teria aumentado nos últimos cinco anos, facilitando a ação dos criminosos. “Atualmente, no campo, há quadrilhas especializadas em roubos de cargas de frutas e de sacas de café. Elas praticam crimes por anos e anos e nenhuma medida é tomada”, criticou.
Para ele, o atual governo do Estado não prioriza a área de segurança e muito menos a integração entre as Polícias Militar e Civil. “Quando acontece um assalto em uma área rural, é chamada a PM, mas ela não vai resolver o problema, pois isso depende de investigação. Se não houver trabalho de inteligência, se o delegado não conversar com o comandante da PM de cada região, não há como melhorar”, advertiu.
Conselhos – Como medidas para reduzir a criminalidade no Estado, Luís Sapori apontou soluções de curto, médio e longo prazo. A curto prazo, ele sugeriu a organização local dos produtores rurais, priorizando a criação de Conselhos de Segurança Pública (Conseps), reunindo dirigentes das polícias e do Ministério Público na região.
A médio e longo prazos, o especialista defendeu a priorização da segurança pública pelo governo estadual, a atuação conjunta das Polícias Militar e Civil, além do fim da influência político-partidária na indicação de delegados. Outra ação seria a montagem de uma força-tarefa de investigação em cada uma das 17 regiões de Minas, com prazo para apresentação de resultados. Por fim, ele sugeriu o investimento nas patrulhas rurais e, ainda, a criação de redes de produtores rurais protegidos, nos moldes da rede de vizinhos protegidos.
PIB rural – O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Roberto Simões, questionou a falta de recursos para a segurança rural: “42% do PIB mineiro em 2015 foi gerado na agropecuária. Será que não há dinheiro para proteger um setor que gera tanta renda e emprego? Ninguém pode nos acudir?”, questionou.
Entre outras medidas para reverter o atual quadro de insegurança no campo, ele propôs a implantação de uma polícia especializada no meio rural e ainda, a ampliação do efetivo policial. Também solicitou a reativação de postos e barreiras de fiscalização, mais investimentos em telefonia móvel na área rural e a aprovação do Projeto de Lei Federal 3.722/12, que altera o Estatuto do Desarmamento, ampliando a utilização de armas nas propriedades rurais.
Já o coordenador do Departamento Técnico de Desenvolvimento Econômico da Associação Mineira de Municípios (AMM), Leandro Rico, disse que os prefeitos reclamam que não têm mais condições de custear despesas das polícias em cada cidade. Segundo ele, a parceria se exauriu porque as prefeituras já fazem mais do que podem na área de segurança e é necessária uma participação maior do governo do Estado.
O presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg), Vilson Luiz da Silva, criticou o argumento utilizado pela Polícia Militar para não atender as ocorrências na área rural: “Quando acontece um crime no campo, o produtor liga para a PM e ela alega que não tem gasolina. Mas quando é para multar, a Polícia Ambiental vai com caminhonete nova ao local e penaliza o produtor”.
Deputados querem delegacia especializada em roubo rural
O presidente da Comissão de Agropecuária, deputado Fabiano Tolentino (PPS), anunciou que protocolou na manhã desta segunda (1º), um projeto de lei para a criação do Plano Estadual de Segurança em Defesa do Campo. A proposta inclui a criação de uma delegacia especializada em roubos e furtos rurais. “Nós, do campo, não estamos mais vendo alternativas. A segurança pública está um caos”, salientou.
Tolentino defendeu o uso de armamentos pelo produtor rural. “Nós não temos armas, mas os bandidos têm”, pontuou. Ele afirmou ainda que faltam investimentos e servidores nas Polícias Militar e Civil. “Queremos prioridade do governo no trabalho das polícias para que possamos ter segurança no campo e na cidade também”, destacou. Por fim, o parlamentar pediu a nomeação de 1.341 investigadores aprovados em concurso da Polícia Civil.
O deputado João Leite (PSDB) também disse ser a favor do porte de armas para proprietários rurais. Para ele, é uma forma de os trabalhadores conseguirem se defender. Em sua opinião, criminosos têm que ir para cadeia “para que produtores tenham sossego para trabalhar na terra”.
Ausência – O presidente da Comissão de Segurança Pública, deputado Sargento Rodrigues (PDT), criticou a ausência do secretário de Estado da pasta na reunião. Lembrou, ainda, que a violência rural é um problema sério em várias cidades de diferentes regiões do Estado, exemplificando com o caso de um produtor rural mineiro que já foi roubado seis vezes este ano. “Levaram máquina, café e muitas outras coisas”, ressaltou. Ele também criticou o que chamou de “redução de gastos” na área de segurança pública no Estado.
O deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB) foi enfático: “os produtores rurais pedem socorro”. Ele também relatou casos de assaltos no campo. “Faltam estrutura e pessoas na polícia, sim. Mas há muita omissão policial também. Grande parte dos crimes é por falta de ação”, ponderou. Ele também defendeu o porte de armas para produtores rurais.
Já o deputado Inácio Franco (PV) também criticou a ausência do secretário de Estado e destacou a importância da área rural para o desenvolvimento do País.
O deputado Alencar da Silveira Jr. (PDT) concordou com o representante da AMM quanto à situação difícil dos municípios. “As prefeituras não aguentam mais arcar com despesas da área de segurança nos municípios”, disse ele, pedindo mais investimentos por parte do Estado.
Polícia Ambiental é alvo de críticas
Na conclusão dos trabalhos, diversos participantes do Debate Público Segurança no Campo criticaram a atuação da Polícia Militar Ambiental, cujo rigor em aplicar multas contrastaria com as falhas na repressão de outros crimes. Também pediram a liberação do uso de armas de fogo pelos produtores rurais. Todos relataram aumento do número de assaltos e homicídios em seus municípios.
Após ouvir as demandas, o subchefe do Estado-Maior da PM, coronel Robson José Queiroz, disse que a ampliação das redes de vizinhos protegidos e o reforço da patrulha rural nos municípios são, de fato, medidas para uma melhor articulação entre as forças policiais e a população do campo.
“Temos apenas 71 redes na área rural, com patrulha rural em 251 municípios. São números pequenos para um estado com a extensão de Minas Gerais. Temos de trabalhar juntos, pois há muito a ser feito”, ponderou o oficial, que prometeu discutir as sugestões apresentadas com a cúpula da PM.
O delegado de Polícia Civil, Felipe Costa Marques de Freitas, ponderou que o aumento no consumo de drogas como o crack vem mudando o perfil dos crimes e dos criminosos no campo. Esses últimos se tornam mais agressivos e mais dispostos à prática de assaltos a mão armada, mais rentáveis do que o furto. Ele também criticou a legislação brasileira, que considera muito branda na punição de criminosos.
“Os bandidos são liberados não porque queremos, a culpa é da lei. A gente trabalha muito, é triste ver as pessoas desiludidas com a polícia. Estamos passando por um processo difícil, mas temos esperança de que isso vá mudar. A informação deve chegar até nós. Se vocês sabem quem são os criminosos, devem denunciar, devem ser testemunhas. Faremos o possível, mas vocês também têm de nos ajudar”, pediu.
(Fonte: ALMG)