Seis professores da rede estadual de ensino de Minas foram exonerados por assediar sexualmente e abusar de seus alunos, entre crianças e adolescentes. Outros 11 casos são investigados pela Controladoria-Geral do Estado (CGE). Relatos de assédio via redes sociais e até atos sexuais com estudantes estão detalhados em processos avaliados pela CGE, aos quais o Estado de Minas teve acesso com exclusividade.
Entre os relatos está o caso de um professor de uma escola estadual de Curvelo, na Região Central do estado, que, em 2002, aproveitou-se da condição proporcionada pelo cargo para explorar sexualmente um adolescente de 15 anos, segundo sentença da juíza Ana Paula Lobo, da Comarca de Turmalina. Colegas do estudante e a própria vítima afirmaram, no decorrer do processo, que o professor oferecia presentes, dinheiro e até viagens em troca de relações sexuais. O acusado foi condenado a prisão em regime semiaberto em 2011 e, apesar de afastado da sala de aula, somente na semana passada foi exonerado do cargo na rede pública de ensino, após processo da CGE.
As decisões do órgão correicional foram tomadas nos últimos meses, fruto de força-tarefa formada no início do ano para analisar eventuais irregularidades e casos de corrupção envolvendo funcionários do governo acumulados nos últimos anos. Ao se deparar com os relatos de abuso e assédio sexual por professores, o grupo produziu um relatório paralelo.
Os 17 casos (considerando os seis demitidos e os 11 ainda em investigação) representam 0,0085% do universo de 200 mil professores da rede estadual, mas são considerados gravíssimos, por envolver crianças e adolescentes e a relação de confiança e poder em sala de aula. “Consideramos esses casos prioritários, pois são extremamente graves”, afirma o controlador geral do estado, Mário Spinelli. Ele acredita que as penalidades podem ter caráter preventivo. “Profissionais de todas as categorias do estado devem saber que serão punidos”, alerta.
Após a decisão da CGE, uma cópia do inquérito é encaminhada para o Ministério Público, que denuncia os acusados judicialmente. Spinelli destaca o uso da internet como ferramenta para o assédio sexual. “Uma clara demonstração de que os pais devem monitorar o uso que os filhos fazem das redes sociais”, entende o controlador.
DIÁRIOS DO ASSÉDIO
Como parte do mesmo esforço, no fim do mês passado a CGE exonerou um professor de uma escola de Barbacena, na Zona da Mata. O servidor pediu números de telefone de duas alunas, usando o pretexto de que repassaria por WhatsApp o resumo de um trabalho escolar. O material enviado coincidia com o conteúdo cobrado na prova e, segundo a investigação, o acusado exigiu das estudantes que, a partir do “favor prestado”, elas não deixassem de responder às mensagens dele no WhatsApp.
O investigado passou então a enviar vídeos e imagens pornográficos para as alunas, uma delas de 13 anos. Uma das fotos levou a menina a mostrar as conversas para os pais, que denunciaram o professor à escola e à polícia.
Outra rede social foi o caminho adotado por mais um abusador para chegar às suas vítimas. Em uma escola estadual de São João del-Rei, no Campo das Vertentes, um professor usava mensagens privadas do Facebook para assediar duas alunas. Foi exonerado pela CGE na semana passada. De acordo com relato dos pais de uma das meninas, de 13 anos, ela tinha muita dificuldade de falar sobre o tema, inclusive com a psicóloga, que passou a acompanhá-la depois que o caso foi descoberto.
O relatório produzido pela CGE discorre sobre o poder que os professores exercem. “É indubitável a influência dos docentes na vida de seus pupilos, vistos muitas vezes como referência e formadores de opinião”, frisa o relatório. O manual de conduta disciplinar da Controladoria-Geral da União (CGU) explicita que a conduta escandalosa não precisa ser cometida publicamente para que se caracterize a infração disciplinar.
Várias mensagens que foram anexadas ao processo são impublicáveis. Em uma delas, o professor diz que desejava ver fotos da aluna de biquíni, sugerindo à menina poses e partes do corpo que deveriam ser mostradas, e pedindo que as imagens fossem mandadas por e-mail. Em outra mensagem, o docente diz preferir mulheres magras e faz elogios a detalhes físicos da estudante de 13 anos.
Em Unaí, na Região Noroeste, outro professor assediou um aluno de 15 anos, também usando o Facebook. O estudante respondeu à mensagem indignado e avisou que denunciaria o assédio na secretaria da escola. A acusação foi comprovada, e o professor, exonerado pela CGE na semana passada.
PASSEIO PAGO
Em uma cidade do Sul de Minas, um professor de sociologia foi denunciado por vários estudantes e, segundo acusação do Ministério Público, usava da condição do cargo para prejudicar alunas e beneficiar alunos. O relatório do MP traz o depoimento de um dos estudantes, que conta que o professor sentou em seu colo dentro da sala de aula e que passava as mãos em partes íntimas de um colega.
O mesmo estudante relatou ainda que o professor levou os alunos a uma cachoeira, pagou todas as despesas, mas impôs a condição de os garotos nadarem nus. Um dos estudantes desenvolveu síndrome do pânico por causa do assédio, mas a mãe só acreditou no filho depois que ele iniciou um tratamento psicológico. O professor foi exonerado em junho deste ano.
Em 2012, o professor de educação física de uma escola estadual de São Gonçalo do Rio Preto foi denunciado por abusar de adolescentes, mas também foi exonerado apenas neste ano. De acordo com relato de um dos alunos, o professor o chamou ao banheiro e o tocou, alegando buscar identificar se o estudante tinha hérnia. O procedimento ocorreu outras duas vezes, até que o abusador fosse denunciado.
PORTA ABERTA
Professores exonerados por abuso e assédio sexual podem voltar à sala de aula caso sejam aprovados em outros concursos públicos. A Lei estadual 869/1952 impede apenas que assumam cargo comissionado. Há uma proposta da Controladoria-Geral do Estado no sentido de impossibilitar que servidor comprovadamente envolvido nesse tipo de caso volte a lecionar, mesmo com concurso público.
(Fonte: Jornal Estado de Minas)