Se você acessou portais de notícias ou redes sociais ou ligou a sua TV nas últimas horas, então é provável que você tenha se deparado com a triste imagem de um policial carregando o corpinho sem vida de uma criança.
A cena se desenrolou às margens de uma praia turca próxima à badalada cidade de Bodrum, e o menino morto foi identificado como sendo Aylan Kurdi, de apenas 3 anos, que pertencia a uma família síria que tentava fugir da guerra.
Segundo Jessica Elgot, do jornal The Guardian, as autoridades turcas revelaram que Aylan era um dos 12 sírios que morreram afogados — entre eles estavam também seu irmão, Galip, de 5 anos, e sua mãe — enquanto tentavam chegar à cidade de Kos, na Grécia, nesta quarta-feira. As investigações apontaram que a família pretendia seguir da Europa até o Canadá para se reunir com parentes que vivem no país, mesmo tendo o pedido de asilo negado pelo governo canadense.
Tentativa desesperada
Segundo os relatos, a família dos meninos havia fugido da cidade de Kobani, localizada no norte da Síria — palco de sangrentas batalhas entre as Forças Curdas e insurgentes do Estado Islâmico no início deste ano. Os parentes que vivem no Canadá estavam tentando apadrinhar o grupo e inclusive haviam arrecadado doações em dinheiro para custear a viagem. Contudo, como o plano não deu certo, desesperada, a família optou por tentar fugir de barco até a Grécia.
As autoridades canadenses permitem que refugiados de guerra entrem legalmente no país, mas, para isso, pelo menos cinco cidadãos devem se comprometer em oferecer apoio emocional e financeiro aos estrangeiros. Além disso, os expatriados devem ter em mãos documentos oficiais que comprovem sua situação, e o problema é que o fluxo de fugitivos é tão grande que as autoridades simplesmente não estão dando conta de emitir os papéis de todo mundo.
Somente o pai dos pequenos, Abdullah, sobreviveu à trágica travessia, e, em um telefonema aos parentes no Canadá, ele teria revelado que apenas deseja retornar à sua cidade natal para poder enterrar a esposa e os filhos.
Situação desesperadora
Segundo Helena Smith, também do The Guardian, os refugiados viajavam em dois botes que transportavam 23 pessoas no total, mas as embarcações viraram depois de se separarem na península de Bodrum. Entre os mortos, havia uma mulher e cinco crianças. Por sorte, 15 pessoas foram resgatadas a tempo por helicópteros; contudo, três integrantes do grupo continuam desaparecidos, e a esperança de encontrá-los com vida é mínima.
As vítimas se somam aos milhares de sírios que já perderam suas vidas tentando escapar da guerra e dos fundamentalistas islâmicos que ocupam o país. Só nos primeiros cinco meses do ano, as autoridades europeias resgataram mais de 42 mil pessoas que pretendiam chegar ao continente, e, durante o verão europeu, mais de 2,5 mil refugiados morreram tentando.
A estimativa é de que mais de 4 milhões de sírios tenham chegado à Europa, e o cálculo é que cerca de 270 mil entraram no continente a partir da Grécia — sendo que 50 mil chegaram só no mês de julho. Na última quarta-feira, cerca de 2,5 mil refugiados desembarcaram na cidade grega de Lesbos — onde 15 mil aguardam liberação para embarcar com destino a Atenas, de onde devem seguir viagem para Macedônia, Sérvia, Hungria e Alemanha.
E a situação nas ilhas gregas é caótica, pois as autoridades simplesmente não conseguem lidar com a quantidade de pessoas chegando. Os recursos do governo grego são limitados, faltam abrigos, as condições de higiene são calamitosas e não há oficiais suficientes para registrar todos os refugiados, o que acaba por tornar o processo de emissão de documentos e realocação ainda mais lento. Nem mesmo a ajuda de voluntários é suficiente para amenizar a situação.
Crise humanitária
O problema é bastante complexo e tomou proporções gigantescas. Os governos europeus há anos vêm tentando encontrar formas de frear o incessante fluxo de imigrantes ao continente. No entanto, o que muitos falham em entender é que a crise atual não se refere a um problema de imigrantes buscando melhores oportunidades econômicas, mas de pessoas desesperadas que estão arriscando suas vidas para escapar de conflitos armados em seus países de origem.
De acordo com o The Economist, desde a Segunda Guerra Mundial a Europa não se depara com um fluxo de refugiados tão grande, e a escala da crise é estarrecedora. De todos os estrangeiros chegando ao continente, entre 60% e 70% são refugiados — sendo a maioria proveniente da Síria (69%), Afeganistão (18%), Iraque e Somália.
Assim, apesar de ser uma questão delicada, organizações humanitárias de várias partes do mundo estão pressionando a União Europeia para que ocorra uma intervenção rápida e sejam encontradas formas de absorver as ondas de refugiados que estão chegando ao continente.
Nesse sentido, uma análise revelou que, embora o número de imigrantes que entraram no continente este ano pareça extraordinário, ele corresponde a míseros 0,027% da população europeia. Ou seja, sendo a velha Europa o continente mais rico do planeta, os dirigentes podem muito bem se organizar para lidar tranquilamente com um fluxo tão pequeno de imigrantes — quando comparado aos 740 milhões de europeus que já vivem no continente.
Enquanto as tensões aumentam, o pequeno Aylan Kurdi se transformou no novo retrato dessa terrível crise humanitária, e artistas do mundo inteiro estão fazendo homenagens tocantes depois que a foto do menino comoveu a todos. Veja algumas delas a seguir:
(Fontes: Tecmundo / Mega Curioso / The Guardian / Jessica Elgot / Helena Smith / The Economist – Imagens: The Guardian / The Economist / Bored Panda / Julija Neje / The Sleuth Journal)