Pedreiro do Vale do Aço que passou seis anos em árvore de BH arruma emprego e deixa o local

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Após o período vivendo em rede no alto de uma mangueira perto da Praça da Liberdade, em BH, pedreiro consegue emprego com carteira assinada e se muda para uma casa alugada

No meio da natureza, a um quarteirão da praça mais nobre de Belo Horizonte, deitado em uma rede e de olho nas estrelas. Essa é a vida que muita gente pediu a Deus e poucos conseguem, mesmo clamando aos céus dia e noite. Mas o pedreiro Reginaldo de Souza Reis, de 40 anos, realizou tal sonho, embora de forma inusitada. Munido de coragem e audácia, ele passou os últimos seis anos no alto de uma árvore, mais propriamente, sobre galhos de uma mangueira na Rua Bernardo Guimarães, entre a Rua da Bahia e a Avenida João Pinheiro, no Bairro de Lourdes, Região Centro-Sul. Ontem foi a despedida de Reginaldo de sua “cobertura” e ele promete voltar aos fins de semana. “Aqui é bom demais, tenho de tudo”, disse Tarzan, apelido carinhoso recebido dos amigos e moradores da região.

“Não sonho, não rolo na rede e não caio no passeio”, Reginaldo de Souza Reis, de 40 anos, que promete voltar à mangueira na Rua Bernardo Guimarães nos fins de semana – Foto: Túlio Santos / Estado de Minas

Simpático e de papo bom, Reginaldo estudou até a “terceira série do curso primário”, o correspondente hoje ao quarto ano do ensino fundamental, é separado – “minha mulher mora nos Estados Unidos” – e tem um casal de filhos que vive em Ipatinga, no Leste de Minas. “Estou mudando, pois arrumei trabalho de carteira assinada e aluguei uma casa no Bairro São Gabriel, Região Norte da capital”, explicou o pedreiro, que, enquanto não tinha serviço, tomava conta de carros na rua. Ao subir com habilidade no pé de manga, faz questão de avisar ao repórter: “Não bebo nada de álcool, viu?”.

Antes de se mudar para a mangueira da Bernardo Guimarães, Reginaldo pensou em construir a sua “casinha” em uma castanheira próxima à Rua da Bahia. Desistiu, por ela ser muito alta, e escolheu um galho mais baixo da sua atual mangueira, hoje carregada de frutos da variedade coquinho. A transferência para o andar superior se deu quando o primeiro galho foi podado, impedindo necessidades básicas: que a rede de dormir ficasse amarrada ao tronco, a caixa de isopor para guardar as roupas se sustentasse nas cordas e a lona preta pudesse ficar esticada a fim de proteger da chuva.

Impossível não admirar a destreza de Tarzan ao escalar o tronco e chegar à rede, que fica a quatro metros do chão e está na área de metro quadrado mais caro da capital – cerca de R$ 12 mil para imóveis novos e R$ 7 mil para usados. Satisfeito, o pedreiro, nascido em Coronel Fabriciano, também no Leste do estado, está há 17 anos em BH e se orgulha ao contar que, na cobertura, não tem mosquito, não faz calor, há muita sombra, transborda de segurança e, à noite, só se ouve mesmo o som do silêncio. “Não sonho, não rolo na rede e não caio no passeio”, afirma, com convicção. Num minuto, sorri com malícia ao declarar que teve encontro íntimo entre as folhas. “E deu tudo certo, pois ninguém estava vendo.”

Como um menino

O amor pela vida ao ar livre, longe de multidões e perto da natureza, vem da infância. “Eu era menino e gostava de subir em árvores. Se pudesse hoje, moraria num lugar cheio de bicho e sem gente. Não precisaria nem de salário, trabalharia pela comida. O ser humano é muito difícil”, raciocina Reginaldo, enquanto estica o braço e colhe a manga, mostrando que, mesmo na ebulição urbana, mora no centro da natureza.

Ao passar pela rua e ver Tarzan no seu hábitat, o técnico em informática Iago Ferreira, de 20, morador do Bairro Candelária, em Venda Nova, fez uma foto com seu telefone celular e comentou: “Ter uma casa na árvore é o sonho de toda criança”. Perto dali, a estudante Larissa Xavier, de 21, considerou “interessante e ousado” o modo de viver desse “Tarzan da cidade”. Já o amigo de longa data, o lavador de carros Renato Lúcio, de 43, confessou que nem terá tempo para saudade. “Já dividimos uma casa e esta aqui será de veraneio”, brincou apontando para o galho.

Sempre sorridente, Reginaldo enumera outras vantagens de viver na árvore. Como está a um quarteirão da Praça da Liberdade, pode ver a iluminação de Natal antes de todo mundo e também se deliciar primeiro com as mangas. “O movimento nesse pedaço vai das 7h às 23h. Já vi muitas cenas aqui do alto, casais namorando, brigas, assaltos, corre-corre. Mas ninguém nunca me incomodou. Para tomar banho e demais necessidades, vou ao posto de gasolina, onde também assisto aos jogos de futebol. Como não gosto de novela, o meu companheiro à noite é um rádio de pilha.” E o endereço?, pergunta o repórter. “Não tenho nem dou, aliás, nem tenho celular”, responde Tarzan, que recebe habitualmente a visita de passarinhos, micos e até morcegos, “que não me incomodam”.

(Fonte: Estado de Minas)

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