Rosilene Ávila – Quero colo!

1

Atendendo às solicitações dos amigos, mas também e principalmente por conta da minha saudade e da minha necessidade de analisar pessoas e circunstâncias, tentarei ilustrar alguns temas, contando a vocês, orgulhosa de meu mineirês fluente, algumas histórias que se passam ou se passaram, de personagens que vivem e que viveram. Em muitas dessas histórias, minha mãe estará presente, pois apesar de ter falecido quando eu tinha apenas oito anos de idade, é uma presença constante em meu modo de ser, minhas ações e reações, meu jeito de viver e conviver, o que comprova para mim, muito do que vamos falar hoje. Espero que possam aproveitar a leitura.

Determinada a tentar ser melhor a cada dia, vejo-me diante de tremendos desafios: quero ser uma boa mãe, uma boa esposa, uma boa profissional, quero ser uma boa aluna no curso de administração pública, uma boa escritora nesta coluna… Parece muito, mas quando digo que estou determinada a tentar, deixo claro que me permito errar, chorar, aprender, ouvir, perdoar, recomeçar e até mesmo dormir de vez em quando.

Pois bem, nessas minhas tentativas de aprender a ser melhor, ao participar de uma palestra da psicanalista Marli Andrade, cujo tema era educação infantil, fui levada a meditar sobre a importância de estarmos atentos às necessidades e possibilidades dos pequenos de zero a oito anos de idade, esta fase tão importante, que define tantas coisas na vida da gente. Baseando-se em informações dos especialistas na área da psicanálise, não é exagero dizer que tudo ou grande parte do que somos, de como encaramos a vida, como convivemos conosco e com as pessoas ao nosso redor, se deve à maneira como vivemos os nossos primeiros oito anos.

Em determinado momento, a palestrante levantou uma questão sobre lembranças da infância e a primeira imagem que me veio à mente, foi: eu no colo da minha mãe. Lembrei-me que passávamos horas assim. Ela sentada num banco de madeira, sem nenhum conforto, e eu no colo dela. Não sei se ela dormia ou pensava, se lembrava ou se preferia não lembrar. Sem televisão, sem celular, sem computador, sem conversa, sem temor… Só ela e eu na cozinha escura. E eram horas mesmo. Eu cochilava, acordava, dormia de novo. Não sei ao certo quantos anos eu tinha, mas sei que era bem pequena, pois meus pezinhos não tocavam o chão. Ficava com as pernas penduradas e o banco não era alto. Às vezes eu escorregava e ela me puxava e me colocava de novo em uma posição confortável. E era um silêncio que nunca mais ouvi, uma paz que nunca mais senti, era uma sensação tão boa, que só depois de crescida posso entender o quanto me fez bem aqueles momentos.

Minha mãe era uma pessoa triste e impar! A história de vida dela vai muito além do que minhas simples palavras podem expressar. Mas somente depois de muitos anos eu detectei essa tristeza da minha mãe. Até então, sentada ali naquele colo magro e pálido, eu só sentia paz, segurança, amor. Era como se o mundo todo se resumisse ali, naquela cozinha simples, de casa simples, de gente simples, do interior de Minas Gerais: uma *lamparina a querosene que queimava ao longe, o fogão a lenha vermelho, já com poucas brasas e uma panela de ferro com água morna em cima, uma prateleira com vasilhas limpinhas, uma *cigana gigante que ficava no canto, o banco de madeira, minha mãe e eu.

Voltando à palestra, não foi falado especificamente sobre colo, mas várias informações valiosas foram adquiridas e indico a todas as pessoas que lidam com crianças, seja em casa ou na escola (abaixo deixo o link de contato da palestrante). Resumindo, ficou pra mim muito claro, a dica da especialista: “Se queremos que nossos filhos se tornem adultos emocionalmente equilibrados, devemos provocar sorrisos”. É claro que a disciplina deve permear equilibradamente esse processo. Saí de lá com conhecimentos e orientações importantes sobre a complexa arte de cuidar e educar crianças e com a doce lembrança do colo da minha mãe, que me acompanhou o resto da semana, fazendo com que, passada a sensação de nostalgia, me sentisse um pouco mais culpada que habitualmente. A realidade é que as mães de hoje, mesmo aquelas bem instruídas e equilibradas não deixam de andar com a “culpa atrás da orelha”.

Seguindo o raciocínio, vamos à parte em que nos permitimos errar, aprender e recomeçar: muitas vezes não temos tempo disponível para colocar nossos filhos no colo. Os pequenos levantam os bracinhos e pedem: _ Colo, colo! Pegamos um pouquinho, e já temos que voltar para o chão ou nem pegamos, provocandos lágrimas ao invés de sorrisos. Os motivos são variados. Consistentes ou não, cada qual, com o seu cada um:

– “Está na hora de sair pro meu de trabalho!” – eu não participei da queima dos sutiãs, meu filho não tem nada com isso, mas eu amo e/ou preciso do meu trabalho! – justificado.

– “Está na hora de ir pra faculdade!” – eu não estudei na época certa, meu filho não tem nada com isso, mas eu não posso perder a oportunidade de correr atrás de meu sonho e/ou melhorar as condições de vida da família! – justificado.

_ “Estou conversando no celular!” – será mesmo tão importante?

_ “Estou vendo TV!” – definitivamente, não é tão importante.

_ “Tenho uma festa!” _ deixa eu pensar… Dessa vez vou fazer a festa com meu filho!

_ “Estou arrumando a casa!” – este motivo é realmente forte, mas… Amanhã também tem casa pra arrumar.

_ “Estou cansada!” – bocejando bem, quero dizer, pensando bem, nada melhor que um abraço de mãe e filho para revigorar as forças da mãe, aumentar a serotonina do filho, o que pode evitar entre outras coisas, a fibromialgia. (aprendi isso na palestra também).

Todos temos os nossos motivos. E são reais, são justos e são urgentes. No entanto, a fase de colo das crianças vai passar (ou não). Cada criança, na sua individualidade e no seu tempo, vai expressar à sua maneira o seu “quero colo”. Vale a pena usar o bom senso para que possamos atender na medida do possível e com equilíbrio a necessidade de colo dos nossos pequenos e até mesmo dos maiores, porque na medida certa, não tem contra indicação. Quem não gosta de colo de mãe, independente da idade?

A dica de hoje, referendada por especialistas da área, é que colo não é questão de quantidade, e sim de intensidade, de qualidade. Carinho, afeto e toque faz toda a diferença na vida de uma criança e no futuro de um adulto.

Vamos utilizar o tempo possível e inventar o tempo que faltar para pegar nosso filho no colo, abraçar, acarinhar, afagar. Pode ser a lembrança mais valiosa e feliz da vida dele… Sem contar os efeitos que isso provoca no cérebro. Mas sobre isso, vou deixar a fala pra quem entende do assunto.

Indicação da palestra mencionada neste texto: Marli Andrade


(*Cigana – Panela de ferro redonda e com três pés – Imagem ilustrativa)


(*Cozinha a lenha – Imagem ilustrativa)


(*lamparina a querosene ou querosene – Imagem ilustrativa)

1 COMENTÁRIO

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui