A procuradora-geral da República (PGR), Raquel Dodge, pediu para que o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconsidere decisão que concedeu habeas corpus (HC) preventivo a Hugo Alves Pimenta – condenado por homicídio na conhecida Chacina de Unaí. Um dos principais argumentos do agravo regimental apresentado pela PGR é o de que seja restabelecida a jurisprudência do Plenário do próprio STF, que prevê o início da aplicação da pena após decisão da Justiça em segundo grau. Também, em parecer enviado ao STF, no mesmo HC, a PGR requereu que a Corte não conheça o habeas corpus impetrado pela defesa.
De acordo com ela, “exigir o trânsito em julgado após o terceiro ou quarto grau de jurisdição para, só então, autorizar a prisão de réu condenado, é medida inconstitucional, injusta e errada. Também favorece a impunidade e põe em descrédito a Justiça brasileira, por perda de confiança da população em um sistema em que, por uma combinação de normas e fatores jurídicos, a lei deixa de valer para todos”.
No agravo regimental, Dodge lembra que pedido de HC, no mesmo sentido, foi negado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), e que a decisão monocrática é uma afronta ao enunciado da Súmula 691/STF. A PGR salienta que é fundamental o respeito ao devido processo legal. “O enunciado afirma que o Superior Tribunal de Justiça não exerceu sua jurisdição no habeas corpus lá impetrado, apenas examinou o pedido de liminar. Enquanto o STJ não decidir o pedido desse HC, não é possível excepcionar a jurisdição do Supremo Tribunal Federal, que é pacífica sobre essa situação”. A PGR também pede o indeferimento de extensão do HC a outros réus.
Raquel Dodge chama a atenção também para o respeito ao princípio da colegialidade, definido por ela como o “fundamento de validade e de força das decisões dos órgãos colegiados, nos quais, assim como na democracia, prevalecerá o entendimento majoritário segundo as regras de votação preestabelecidas, ou seja, maioria simples ou qualificada”. Por isso, a PGR pede que, caso o ministro Marco Aurélio não reveja a decisão, o HC seja julgado pela Primeira Turma da Suprema Corte. E, caso seja provido o agravo, seja facultada “às instâncias ordinárias a execução da pena, independentemente de eventuais recursos excepcionais ao STJ ou STF”.
No parecer, Raquel Dodge criticou o sistema recursal brasileiro, “ao permitir a interposição sucessiva de uma infinidade de recursos e outros mecanismos de impugnação da condenação, possibilita que o momento do trânsito em julgado da decisão condenatória se protraia no tempo de modo quase infinito, a depender da disposição da defesa de recorrer”.
Entenda o caso
Hugo Pimenta teve a condenação confirmada pelo Tribunal Federal da 1ª Região (TRF1). A pena estipulada foi de 31 anos e 6 meses de reclusão. Ele foi considerado culpado de ter cometido homicídio qualificado, mediante recebimento ou promessa de recompensa e dissimulação para assegurar a execução ou a impunidade de outro crime. A trama ficou conhecida como “chacina de Unaí”, e culminou no assassinato de três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho, no município mineiro.
O réu firmou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público Federal (MPF), no qual prevê a redução da pena em 2/3. Inicialmente, Pimenta havia sido condenado a 46 anos, 3 meses e 27 dias de reclusão, pelo Tribunal Federal do Júri. No julgamento do caso, o TRF1 reduziu a pena por ter afastado a qualificadora referente à emboscada. Mas a redução não ficou na proporção firmada no acordo de colaboração. Houve recurso do MPF nesse quesito.
A defesa alega que a decisão do Tribunal do Júri foi expressa ao afirmar que o réu teria direito de recorrer em liberdade até o trânsito em julgado final do processo e que, nesse ponto, não houve recurso do MPF. No agravo regimental e no parecer, a PGR afirma que “à época em que foi proferida a sentença que determinara a expedição de mandado de prisão somente após o trânsito em julgado da condenação, prevalecia na jurisprudência a impossibilidade da execução provisória da pena, de modo que se existisse eventual recurso da acusação – tal como argui a defesa para justificar a peculiaridade do caso a incidir a inexistente reformatio in pejus – sequer seria admitido”.
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(Fonte: PGR/MPF)