Desproteção de nascentes, rios secando, escassez de água, falta de ações para conservação de mananciais e má qualidade de serviços. Esse foi o cenário relatado por representantes de municípios mineiros do Vale do Jequitinhonha que participaram, nesta quarta-feira (21/8/19), de audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Realizada na Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização a pedido do vice-presidente, deputado Marquinho Lemos (PT), a reunião foi marcada, entre outros, pela exibição de video mostrando situações de seca e pela defesa da regulamentação, pelo Poder Executivo, da Lei Estadual 12.503, de 1997, conhecida como “Lei Piau”.
A lei cria o Programa Estadual de Conservação da Água, obrigando as concessionárias de serviços de abastecimento de água a investir, na proteção e na preservação ambiental da bacia hidrográfica em que ocorrer a exploração, no mínimo 0,5% de sua receita operacional ali apurada no exercício anterior ao do investimento.
Um terço do montante será para reconstituição da vegetação ciliar ao longo dos cursos de água. E também um terço para preservação ou recuperação de nascentes.
Situação diferente estaria ocorrendo em mananciais do Vale, cujos municípios reivindicam, junto com o Norte de Minas, prioridade nas ações e programas de preservação e recuperação mencionados na audiência.
Barro – Membro do Comitê da Bacia do Rio Araçuaí, José João de Figueiró Oliveira informou que, depois do Rio Jequitinhonha, o Araçuaí é um dos principais mananciais da região. “Mas em menos de cinco anos morrerá. A situação hídrica do Médio Jequitinhonha é terrível”, advertiu ele, sobre a ausência de ações de proteção na localidade.
Um dos complicadores, segundo José João, estaria na instalação de barragem no Rio Setúbal, um dos principais afluentes do Araçuaí e que abastecia vários municípios. “Desde a obra dessa barragem, a água nunca mais foi limpa, virou barro e sem condição de uso”, denunciou.
Ele também disse que o programa Pró-Mananciais, citado pela Copasa como ação de proteção e preservação de bacias em Minas, não teria chegado à região abarcada pelo Araçuaí. E também manifestou preocupação com propostas que vêm à tona periodicamente, como a privatização de serviços de abastecimento e saneamento. “Aí é que vamos mesmo ser esquecidos”, previu ele.
Reservatórios comprometidos
O presidente da Câmara Municipal de Diamantina (Jequitinhonha), vereador Edivan Silva Soares, registrou, por sua vez, que a Copasa só opera na sede do município, onde a situação do abastecimento ainda estaria sob controle.
O contrário ocorreria, contudo, nos 10 distritos e 100 povoados que pertencem ao município e são atendidos pela Copanor, dependendo da captação de água em poços artesianos. “Nesses locais nós vivemos um drama. Por semana, de três a quatro povoados ficam sem água por muitos dias”, criticou.
Já o vereador Fábio Pinheiro do Nascimento, presidente da Câmara Municipal de Coluna (Rio Doce), relatou que a captação de água no município é feita em poços profundos. “Mas alguns poços já estão esgotados e nossos rios completamente poluídos”, denunciou ele, informando que há dois meses reservatórios do município já estariam sendo abastecidos por caminhões-pipa vindos de outras cidades.
Copasa destaca programa, mas adesão depende de critérios
O superintendente de Meio Ambiente da Copasa, Nelson Cunha Guimarães, informou que a concessionária e sua subsidiária, a Copanor, estão presentes em 636 dos 853 municípios mineiros. Em 263, são prestados serviços de água e de esgoto; em 373, só de água.
Segundo ele, quando da revisão tarifária feita em 2017 pela Agência Reguladora de Água e Esgoto do Estado (Arsae-MG), foram garantidos recursos para a preservação ambiental a partir de agosto daquele ano, quando a empresa iniciou o Programa Socioambiental de Proteção e Recuperação de Mananciais, o Pró-Mananciais.
Embora presente em apenas 187 municípios até o momento, ele destacou que o programa tem caráter contínuo e permanente e abrangência crescente.
Explicou que a adesão ao Pró-Manancial tem as prefeituras como parceiras relevantes, podendo ser pleiteada com base em critérios para a priorização dos municípios a serem atendidos, tais como qualidade da água, tipo de captação, escassez hídrica e população.
Ele citou Carbonita como um dos selecionados para o programa, assim como disse que demandas do Serro e de Coluna serão encaminhadas às áreas pertinentes da empresa.
Dentro do Pró-Mananciais, ele disse que já houve o plantio de 375 mil mudas e o cercamento de nascentes e áreas de proteção nos municípios já participantes, totalizando 700 mil metros cobertos.
Arsae só tem cinco fiscais
Conforme destacado pelo Gerente de Fiscalização Econômica da Arsae-MG, Rômulo José Soares Miranda, investimentos da Copasa e Copanor no Pró-Minas estão previstos em R$ 20 milhões/ano até a próxima revisão tarifária, montante que, segundo ele, estaria próximo do patamar definido pela Lei Piau.
Contudo, ele considerou que a Arsae tem uma equipe insuficiente de fiscalização desses investimentos em recuperação e proteção, com apenas cinco fiscais para ir a campo em todo o Estado. Outra questão seria o fato de que não há previsão legal de aplicação de sanções, levando à adoção apenas de medidas compensatórias às concessionárias.
Bacias – Já a representante do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), Thais de Oliveira Lopes, destacou o lançamento, em março, pelo órgão, do Programa Estratégico de Revitalização de Bacias Hidrográficas de Minas Gerais – Somos Todos Água, que prevê ações integradas e permanentes em áreas prioritárias.
O programa terá como norte os planos diretores de baciais já existentes no Estado, disse ela, ressaltando que o Igam tem trabalhado internamente em propostas para a regulamentação da Lei Piau.
Deputados cobram investimentos
Ex-prefeito de Carbonita, o deputado Marquinho Lemos disse ser preciso chamar a atenção dos governantes e da sociedade para a situação das nascentes. Segundo o parlamentar, seu município deverá sofrer novamente a situação vivida entre 1997 e 1998, quando a Copasa transferiu a captação de água do Rio Curralinha, que secou, para o Soledade, um dos maiores da região, que agora também estaria secando. “Mesmo com essa experiência, a Copasa não se preocupou em fazer nada para recuperar nascentes”, disse o deputado.
A deputada Rosângela Reis (Pros), presidenta da comissão, classificou o cenário exposto como triste e preocupante. “Há anos a legislação aguarda regulamentação, enquanto a população está pagando um preço alto pela situação, com prejuízos também à saúde”, disse ela, mencionando problemas que estariam ocorrendo também no Vale do Aço.
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(Fonte: ALMG)