O cálculo e o pagamento das indenizações finais aos atingidos da tragédia de Mariana (MG) poderão finalmente ocorrer em 2017. Essa é a aposta tanto do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) como da Fundação Renova, que foi criada pela mineradora Samarco para gerir os projetos de reparação dos danos causados pela tragédia.
A tragédia de Mariana completou um ano no dia 5 de novembro de 2016. O rompimento da barragem de Fundão, pertencente à Samarco, liberou mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos em 2015, que provocaram devastação da vegetação nativa, poluição da Bacia do Rio Doce e destruição dos distritos de Bento Rodrigues e de Paracatu, além de outras comunidades. Dezenove pessoas morreram. O episódio é considerado a maior tragédia ambiental do país.
Apenas alguns impactados já receberam verbas indenizatórias. Em acordo com o MPMG, a Samarco antecipou em 2016 valores para quem perdeu veículos e moradia. Foi definido um montante padrão. No caso da moradia, por exemplo, quem perdeu casa recebeu R$ 20 mil e quem perdeu moradia de fim de semana, R$ 10 mil. As famílias das 19 pessoas que morreram também obtiveram um adiantamento, calculado em R$100 mil. Esses valores, porém, são parciais.
“Agora estamos caminhando para o cálculo da indenização final que irá dizer exatamente o valor das perdas, contemplando todos os direitos violados dos atingidos. Do valor calculado, serão descontadas as antecipações que já foram pagas”, explica Guilherme Meneghin, promotor do MPMG na comarca de Mariana.
Um cadastro classificando a situação de todos impactados está sendo realizado em conjunto pelo MPMG, pela Samarco e pelas suas acionistas Vale e BHP Billiton. O levantamento abrangerá os milhares de atingidos em toda a área afetada, de Minas Gerais ao Espírito Santo. Constarão no cadastro, por exemplo, informações como o perfil socioeconômico de cada um e a relação de bens perdidos. Serão considerados dados da Defesa Civil, do MPMG e também apresentados pelos próprios atingidos. As informações serão analisadas caso a caso.
Ainda não foi decidido o futuro dos terrenos que foram destruídos pelo rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana (Foto: Arquivo/Léo Rodrigues/Agência Brasil)
Aposta em acordos
Guilherme Meneghin acredita que até fevereiro o cadastramento será concluído. “A nossa expectativa é que em 2017 nós tenhamos ainda o cálculo e o pagamento das indenizações finais”, afirma. O MPMG tem a expectativa de que os atingidos e a mineradora cheguem a um acordo sobre as indenizações. Do contrário, o Judiciário é quem deverá arbitrar os valores e, nesse caso, a conclusão do processo em 2017 fica improvável.
A Fundação Renova também aposta na realização de acordos. Mas admite tratar-se de um desafio difícil. “Pode ser que nós encontremos indivíduos que não vão concordar com o processo e prefiram buscar uma solução através do trâmite de uma ação judicial”, diz o gerente executivo de Programas Socioeconômicos da Fundação Renova, José Luiz Furquim.
Ações conjuntas
Segundo Meneghin, que é o responsável no MPMG por resguardar apenas os interesses dos atingidos de Mariana, a união dos moradores dos distritos de Bento Rodrigues e Paracatu tem sido um marco. Com exceção de quem perdeu parentes, ninguém entrou com ação individual.
O MPMG ajuizou diversas ações civis públicas, nas quais todos foram beneficiados. Com essa estratégia se obteve, por exemplo, a antecipação das indenizações, o compromisso da Samarco de pagar aluguel de casas temporárias em Mariana, a distribuição das doações em dinheiro pela prefeitura, o atendimento psicossocial e o direito à assistência técnica de confiança dos atingidos.
Essa atuação coletiva é, na opinião de Meneghin, fundamental também na definição das indenizações. “É um processo complexo. São 1,5 mil atingidos só em Mariana, cada um com diferentes experiências de vida, com danos pessoais, materiais e morais muito diversificados. Tinha pessoas com patrimônio pequeno, outras com patrimônio grande. Mas será um processo participativo”, diz.
Durante o processo de decisão, o MPMG dialoga com a comissão de moradores dos distritos atingidos, que conta atualmente com uma assessoria técnica fornecida pela Cáritas, com profissionais de diversas áreas, como arquitetos, advogados, agrônomos e historiadores.
Auxílio financeiro
Enquanto as indenizações não chegam, uma notícia deixou os atingidos aliviados nesse fim de 2016. O auxílio mensal concedido pela Samarco a todos os que perderam renda em decorrência da tragédia foi renovado por dois anos. Os valores são pagos por meio de um cartão, e cada beneficiado recebe um salário mínimo, acrescido de 20% para cada dependente, além do valor de uma cesta básica.
Conforme acordado em dezembro de 2015, esse auxílio teria validade inicial de um ano. Ele foi reconhecido como um direito assistencial dos atingidos e não configura indenização. Ou seja, seus valores não serão abatidos no cálculo final das indenizações. No início de novembro deste ano, moradores já manifestavam preocupação com uma possível interrupção do benefício.
“Minha diária de pedreiro era R$130. Nesses distritos pequenos há pouca mão de obra qualificada. E eu tinha moto, então também atendia aos distritos vizinhos. Fazia muito serviço. Aqui no centro de Mariana é muito difícil conseguir trabalho, porque envolve confiança. Como uma pessoa vai te dar uma obra para fazer se ela não te conhece?”, disse o pedreiro Tcharle do Carmo Batista, de 23 anos, que morava em Paracatu, distrito localizado a 34 quilômetros do centro do município.
Em audiência judicial realizada no dia 28 de novembro, o MPMG e a Fundação Renova concordaram que a maioria dos atingidos não conseguiu reativar suas atividades econômicas. Em novo acordo, o cartão foi renovado até dezembro de 2018.
Moradias
Outra novidade que deverá ocorrer em 2017 é o início da reconstrução física dos distritos destruídos. Atualmente, os moradores desses locais moram em casas alugadas pela Samarco em bairros variados de Mariana, o que será mantido até o reassentamento. A mineradora, por meio da Fundação Renova, pretende entregar as novas comunidades em 2019. Os terrenos já foram definidos, e a aquisição do local onde será o novo Bento Rodrigues já ocorreu. O processo de compra da área em que Paracatu será reerguido está avançado e deverá ser concluído no início do próximo ano.
De acordo com o cronograma, estão previstas para 2017 as obras de supressão vegetal e terraplanagem e o início da abertura de ruas. Já as novas casas devem começar a ser construídas somente em 2018, conforme desejos dos moradores. A Fundação Renova realizou neste ano diversas reuniões para fazer um mapeamento de expectativas e apresentar um desenho urbanístico. “Em um processo como esse, a construção em si nem é tão complexa se comparada com toda a discussão e definição que tem que ocorrer antes”, diz José Luiz Furquim, Fundação Renova. As novas moradias serão consideradas para o cálculo das indenizações finais.
O futuro dos terrenos nos distritos destruídos ainda será discutida. Está pendente a definição se eles serão usados como contrapartida dos atingidos. “Há famílias que querem manter os terrenos e outras que já manifestaram que não têm interesse. Nossa ideia é discutir a solução em conjunto”, acrescenta Furquim.
As comunidades de Bento Rodrigues e Paracatu foram tombadas pelo Conselho Municipal do Patrimônio Histórico de Mariana. O objetivo é construir um memorial, na forma de um museu ou parque, ainda a ser definido.
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(Fonte: Agência Brasil)