Superlotação carcerária tem atrasado registro de flagrantes em Minas Gerais

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A demora no atendimento na Central de Flagrantes da Polícia Civil (Ceflan) em Belo Horizonte foi discutida na manhã desta terça-feira (23/2/16) pela Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Os presentes falaram sobre os problemas causados pelo atraso e sobre suas possíveis causas, que iriam desde a superlotação do sistema carcerário até o corte de verbas para a segurança pública. Representantes do Ministério Público (MP) informaram que já foi ajuizada ação cautelar para resolver a questão.

A principal motivação da reunião foi uma ocorrência em maio do último ano. Na ocasião, uma guarnição da Polícia Militar (PM) teria aguardado por mais de 40 horas para que tivesse seu flagrante de porte ilegal de armas lavrado no local.

O 1º sargento da Polícia Militar, Júlio Cezar de Britto, que comandou a operação, disse que ele e outros dois policiais, em uma incursão no Aglomerado da Serra, pediram reforço e receberam apoio de outra viatura. Então, teriam conseguido prender em flagrante um homem que portava uma pistola e chegado ao Ceflan aproximadamente às 2h30 do dia 11 de maio, mas só teriam sido liberados depois das 20 horas.

“Prendemos em flagrante e levamos para a apreciação do delegado para ele ratificar a prisão, mas foi alegadao que não havia vagas carcerárias para receber o suspeito”, contou Britto. Segundo ele, do lado de fora da delegacia, havia, no mínimo, dez viaturas, mas sem recebimento de ocorrências. De acordo com o sargento, as condições de alimentação e de uso de banheiro foram precárias durante todo o período.

Os outros policiais presentes na reunião confirmaram a versão de Britto. O cabo Rogério Felipe Duarte acrescentou que esse tipo de situação tem sido recorrente. “Nos casos com vítimas e testemunhas é ainda pior. As testemunhas acabam indo embora e as vítimas sofrem de novo ao ter que esperar tanto tempo”, disse Duarte.

O sargento da PMMG, Júlio Cezar de Britto, a promotora, Janaína Dauro, e presidente da Comissão de Assuntos Carcerários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Fábio Márcio Piló, participaram de audiência na Comissão de Segurança Pública da ALMG – Foto: Guilherme Bergamini / ALMG

Ministério Público propõe ação cautelar

Nenhum representante da Polícia Civil compareceu à reunião, o que foi criticado pelos parlamentares presentes. O representante da Subsecretaria de Administração Prisional, Aílton Aparecido de Lacerda, por sua vez, disse que o órgão “está fazendo todo o esforço para tentar minimizar o problema e tem feito o que é possível dentro das suas limitações”.

O deputado Sargento Rodrigues (PDT), presidente da comissão e um dos autores do requerimento para a reunião, criticou a falta de informações precisas do representante da subsecretaria. Ele questionou sobre as quatro mil vagas no sistema prisional que o Governo do Estado teria anunciado no último ano, mas Aílton Lacerda disse não ter conhecimento sobre o assunto.

A promotora Janaína de Andrade Dauro, da Promotoria de Justiça Especializada em Direitos Humanos, Apoio Comunitário e Controle Externo da Atividade Policial, disse que o MP já tinha conhecimento da situação e ajuizado uma ação cautelar, na qual pede várias liminares para resolver os problemas.

Segundo a promotora, alguns dos pedidos foram para garantir a alimentação dos agentes policiais durante a espera e manter agentes penitenciários no Ceflan, para que os policiais civis não precisem fazer a guarda dos presos. Também foram solicitadas informações sobre providências e investimentos desde o início da interdição de unidades prisionais, em 2012. “A ação foi proposta em junho de 2015, mas ainda não obtivemos resultados”, lamenta Dauro.

Garantir a dignidade dos profissionais durante seu trabalho, com oferta de condições dignas, e assegurar a continuidade de serviços como patrulhamento foram, de acordo com Dauro, as principais motivações da ação proposta pelo MP. “Todos os desdobramentos dessa demora no atendimento que previmos aconteceram. Policiais militares sem descanso, autos em flagrantes lavrados sem a presença dos policiais envolvidos na prisão, agentes da Polícia Civil sendo acusados de desídios (negligência). Tudo aconteceu e o prejuízo foi de todos”, disse.

Convidados expõem problemas do sistema carcerário

“O problema é muito maior. Estamos falando de superlotação do sistema carcerário, de morosidade de juízes e promotores, tudo isso está nas raízes dessa questão”, afirmou o presidente da Comissão de Assuntos Carcerários da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Fábio Márcio Piló. Ele exemplificou a cadeia de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde, segundo ele, 180 presos estão em um espaço para apenas 97. Dentre os que estão lá, 45 já teriam direito a benefício, como progressão para regime semiaberto, mas ainda não tiveram seus pedidos julgados.

Para Fábio Piló, o reflexo disso chega até o Ceflan, que acaba abrigando presos que não deveriam estar lá e ocupam as vagas dos flagrantes. Ele falou, ainda, das más condições das unidades carcerárias, que chamou de desumanas. “Joga-se o preso na cadeia e acredita-se que o problema está solucionado. Estão dando tiros no pé. Aquela pessoa vai voltar um dia para a sociedade, e vai voltar revoltada, vai voltar um monstro. Aquilo não reeduca ninguém”, disse.

Outra crítica foi quanto à burocracia do sistema de flagrantes. Para o cabo da PM Berlinque Cantelmo, representante da Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares de Minas Gerais, os militares estariam preparados para lavrar os autos em flagrante, no mínimo nos casos de crimes com menor potencial ofensivo. “A sociedade precisa de um modelo mais prático e a Polícia Militar tem o maior efetivo das forças de segurança”, argumentou.

O baixo número de policiais militares foi um dos pontos criticados pelo deputado Cabo Júlio (PMDB), que também foi um dos autores do requerimento para a audiência pública. “O Estado precisa estar preparado para receber os suspeitos que a Polícia Militar prende”, disse.

Sargento Rodrigues, por sua vez, criticou o corte de verbas destinadas à segurança. Segundo o parlamentar, em 2015, o valor investido na PM teria caído de R$ 376 milhões no ano anterior para cerca de R$ 280 milhões. Os investimentos na Polícia Civil, no mesmo período, teriam sofrido uma redução de quase 10%, ainda segundo o deputado. O deputado João Leite (PSDB) completou desaprovando a negativa do Estado em oferecer auxílio alimentação aos servidores policiais.

(Fonte: ALMG)

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