Depressão atinge 28,9% de vítimas de tragédia em Mariana, diz UFMG

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Mais de dois anos após o rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana (MG), quase 30% dos atingidos sofrem com depressão. O percentual é cinco vezes superior ao constatado na população do país. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2015, 5,8% dos brasileiros tinham depressão (11,5 milhões de pessoas).

Os dados fazem parte do projeto Prismma, um estudo da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) sobre a saúde mental da população de Mariana (MG) atingida pelo rompimento da barragem, ocorrido em novembro de 2015.

O transtorno de ansiedade generalizada foi diagnosticado em 32% dos entrevistados, apontando para uma prevalência três vezes maior que a existente na população brasileira.

O estudo foi conduzido em parceria com a Cáritas, entidade escolhida pelos atingidos que moram em Mariana para prestar assessoria técnica no processo de reparação. No total, 64 entrevistadores aplicaram um questionário à população impactada nos dias 15, 16 e 17 de novembro do ano passado. Dos 479 indivíduos abordados, 225 adultos e 46 crianças e adolescentes até 17 anos aceitaram participar da pesquisa. O restante se recusou, alegou medo de assinar documentos ou tinha outra justificativa para não responderem às perguntas.

Além da depressão e do transtorno de ansiedade generalizada, foram avaliados também o transtorno de estresse pós-traumático, o risco de suicídio e os transtornos relacionados ao uso de substâncias psicotrópicas, como álcool, tabaco, maconha, crack, cocaína. “Encontramos uma prevalência aumentada de transtornos psiquiátricos relacionados ao estresse na população atingida quando comparados aos dados descritos na literatura”, registra o estudo.

A dependência de álcool foi diagnosticada em 5,8% da população e a de tabaco em 20%, enquanto 0,9% foi considerado dependente de maconha e 0,4% dependente de cocaína ou crack. Já o risco de suicídio foi identificado em 16,4% dos entrevistados. Entre eles, estão pessoas que declararam desejo de morte, relataram ideias suicidas, afirmaram que planejaram se suicidar no último mês ou reconhecerem já ter tentado alguma vez colocar fim à própria vida.

Entre as crianças, o principal achado da pesquisa da UFMG foi a alta frequência de entrevistados que preencheram critérios para transtorno de estresse pós-traumático, superior a 82%. Nos adultos, este diagnóstico envolveu 12% dos atingidos. No recorte por sexo, notou-se que a prevalência nas mulheres, de 13,9%, foi superior em comparação com os homens, que ficou em 8,6%.

Adoecimento

A tragédia de Mariana provocou a liberação no ambiente de aproximadamente 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos, que causaram devastação da vegetação nativa e poluição de afluentes e do Rio Doce, alcançando até sua foz no Espírito Santo. Dezenove pessoas morreram e comunidades foram destruídas. Em Mariana, os distritos de Bento Rodrigues e Paracatu foram arrastados pela lama. O episódio é considerado a maior tragédia ambiental do país.

Passados mais de dois anos da tragédia, as indenizações das vítimas ainda estão sendo calculadas e os moradores que perderam suas casas continuam morando em imóveis alugados pela empresa enquanto convivem com atrasos na reconstrução dos distritos destruídos.

Segundo o relatório final da UFMG, o adoecimento da população não é um fato isolado e está conectado com estresses e processos de sofrimento social que as famílias têm vivenciado. “Estudos têm mostrado que as lembranças do ocorrido nas tragédias podem tornar-se profundamente vivas na memória, levando a respostas pós-traumáticas. As doenças físicas crônicas, as preocupações com os meios de subsistência, a perda de emprego, a ruptura de laços sociais e as preocupações com as indenizações também foram associadas a respostas pós-traumáticas”, registra.

De acordo com a literatura médica, a percepção dos riscos de danos à saúde e de morte, a perda de moradia e de entes queridos e a consciência da falta de uma satisfatória assistência em saúde são também fatores que podem levar a um diagnóstico de depressão em populações acometidas por desastres. A discriminação também é apontada como um elemento agravante, o que levou a pesquisa da UFMG a identificar se os entrevistados já haviam sido vítimas de atitudes preconceituosas motivadas pela sua condição de atingido.

Os resultados mostraram que 62,7% responderam já ter sofrido algum tipo de discriminação e 27,1% alegaram já ter sofrido algum tipo de discriminação verbal. Em 21,3% desse casos, a ocorrência se deu em lojas, restaurantes ou lanchonetes e em 12,4% em repartições públicas, como Receita Federal, cartório, departamento de trânsito, companhias de água, luz, esgoto e outras. Além disso, 17,3% dos entrevistados descreveram tratamentos diferenciados por colegas de trabalho e 12,9% já se sentiram excluídos em sua vizinhança. Relatos de preconceito foram tema de reportagem da Agência Brasil em novembro do ano passado.

A UFMG colheu ainda indicadores sobre a qualidade do sono. Dificuldades para dormir no último mês foram relatados por 52% dos atingidos. Por outro lado, 53,8% classificaram seu sono como sendo ótimo ou bom, enquanto 26,2% o consideraram regular e 19,6% ruim ou péssimo. O uso de medicamentos para dormir foi constatado em 18,2% da população e de antidepressivos em 16,9%. Em todos os casos, os entrevistados afirmaram que os remédios foram prescritos por médico.

A expectativa dos pesquisadores é de que os dados possam fomentar a discussão sobre políticas públicas e planejamento em saúde, além de permitir uma melhor orientação e alocação de recursos e estabelecer programas adaptados à realidade atual dessa população. Eles também sinalizaram a importância de planos de ação em casos de tragédia para minimizar os transtornos vinculados à saúde mental.

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(Fonte: Agência Brasil)

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