Lincoln Gonçalves Santos viveu sete anos, 26 dias e 12 horas na cadeia. Ele foi preso por latrocínio (roubo seguido de morte) em 2005. Esse é um dos crimes com a pena mais alta no Código Penal Brasileiro. A condenação varia entre 20 a 30 anos de detenção.
Mas Santos resolveu mudar de rumo ainda no cárcere, quando se matriculou no curso de direito da Univali (Universidade do Vale do Itajaí), em Santa Catarina. Na sexta-feira passada (24/6/2016), apresentou seu TCC (trabalho de conclusão de curso). Na banca, havia uma pessoa inusitada: a juíza que permitiu que ele estudasse.
Em 2008, Denise Helena Schild de Oliveira, de Florianópolis, aprovou a progressão de regime de Santos do regime fechado para o semiaberto, que permite que a pessoa passe o dia fora e volte à noite para a prisão.
Dois anos depois, em uma visita da juíza à Colônia Penal Agrícola, em Palhoça, para onde Santos tinha sido transferido, ele manifestou a vontade de estudar.
“Não foi uma decisão emotiva, nem sequer eu precisei de tempo para pensar. Me baseei em dois pontos: ele tinha esse direito assegurado pela Lei de Execução Penal e seria uma chance de ressocialização, rara no sistema penitenciário brasileiro”, disse a juíza.
Lincoln convidou juíza para sua banca de TCC (Foto: Marcelo Rovaris Silveira)
O universitário se sente grato. “Minha vida estava nas mãos dela. Ela poderia ter negado e eu continuaria trancafiado, contando o tempo. Mas ela confiou no meu propósito. Disse sim. E só o sim é capaz de mudar nossa sociedade”, explicou.
Santos trouxe sua vivência para a banca da graduação. No trabalho, mostrou que o Brasil ignora os pactos internacionais quando viola a proteção aos direitos humanos no cárcere. O país já foi criticado pela ONU (Organização das Nações Unidas) e pela OEA (Organização dos Estados Americanos) pelas desumanidades no sistema prisional.
Tirou nota dez no TCC. Faltam dois meses para sua formatura e ele já deu entrada nos documentos para fazer o mestrado na instituição. Também foi aprovado na primeira fase da prova da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Seu objetivo é pesquisar com profundidade as possibilidades de ressocialização.
“A cadeia é o inferno. Passei por umas oito em Santa Catarina. É quase impossível deixar o crime com o que o Estado oferece. Fui tratado feito bicho. Dormi em cela insalubre, superlotada, nos davam para comer carne estragada, feijão com barata. Nos domingos, a última refeição do dia era uma sopa rala, servida às 16h. Depois não tinha mais nada. Era fome. Fora todas as vezes que apanhei porque reclamava meus direitos. Isso era tudo o que eu queria: saber os meus direitos”, afirmou.
Segundo o Depen (Departamento Penitenciário Nacional), a população carcerária ultrapassa 600 mil pessoas, destas 40% estão presas sem condenação. O Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo, sendo a maioria (68%) jovem, negra e pobre.
Faltam 760 mil vagas nas prisões (300 mil de deficit e 460 mil de mandados de prisões expedidos e ainda não cumpridos). A superlotação incide diretamente sobre a violência: a taxa de homicídio dentro das cadeias corresponde a 167,5 assassinatos para cada 100 mil habitantes, ou seja, um índice seis vezes maior do que o da rua.
‘É um vitorioso’, diz juíza
Há um mês, a juíza Denise Helena Schild de Oliveira trabalhava em sua sala no fórum da capital, quando foi avisada por um assessor de que um homem estava no corredor e gostaria de falar com ela. Santos queria fazer o convite para a banca do TCC.
A magistrada não se lembrava dele, mas agora dificilmente o esquecerá. Em 18 anos de profissão, foi a primeira vez que participou do TCC de um ex-detento.
“Ele é um caso raro. Eu o ajudei no primeiro passo, foi simples para mim, por isso o mérito é dele. É um vitorioso. Não duvido que se torne professor da Univali”, disse.
Santos ganhou a liberdade no segundo ano da faculdade, em 2012. Reduziu a pena em dois anos por conta do estudo e de ter trabalhado, durante o regime fechado, na Penitenciária de São Pedro de Alcântara.
Outras pessoas o ajudaram. Ele cita com frequência o professor Alceu de Oliveira Pinto Júnior e o professor Rodrigo Mioto dos Santos, que foi seu orientador.
“O Lincoln tem uma história incrível. Ele se transformou pela educação. Há um nítido processo de amadurecimento. Quando entrou na universidade, carregava o estigma do crime, sendo repudiado por algumas pessoas, mas se formará como alguém querido, com um grupo consolidado de amigos. Ele é um cara capaz e muito inteligente”, disse o orientador.
O orientador Mioto, Santos e a juíza Denise (Foto: Marcelo Rovaris Silveira)
(Fonte: UOL Notícias Cotidiano / Repórter: Aline Torres)
Já dizia o mestre Paulo Freire que a “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo”. É disso que o país precisa, trabalhar nas bases de educação, tendo como finalidade o ganho coletivo, para a melhoria de todos. A educação é um importante fator na ressocialização não só da classe penitenciária, mas é também um agente de transformação social, cultural e humano. Parabéns ao Santos, isso é uma vitoria meu caro!
Parabéns ao Dr.Lincoln, e que às autoridades percebam a importância da humanização no sistema carcerário, se não, continuaremos neste ciclo de violência. E que o “Estado” cuide do cidadão desde pequeno, começando pela creche e demais anos escolares, aonde pode ser observado quaisquer problema que o futuro cidadão possa ter em seu desenvolvimento. Parabéns a todos os envolvidos nesse processo de ressocialização.
E tem muitos LinconL porai lutando contra Tudo e contra todos para se ressocializar,o que temos de fazer e dar oportunidade e mudarmos esse sistema prisional e também a nossa visão preconceituosa,pois todos nos erramos e temos o direito a ter uma nova oportunidade na vida.
Seria bom que todo esse empenho e sucesso, pudesse reviver o homem que ele matou. Ele n?o falou em arrependimento, mas em direitos humanos, para humanos réprobos. N?o vi ressocializaç?o, vi a criaç?o de um advogado para bandidos.
“Bandido bom é bandido morto!”, será? O Brasil nunca prendeu tanto, e o senso de segurança tem agradado? Não! Parabéns, Dr Lincoln, nadou contra a correnteza e saiu vitorioso. Vivemos num país cristão e o perdão é nossa obrigação, para alguns isso sempre será falácia. Infelizmente tem muitos encarcerados que não possuem condição de ter a vida em sociedade, é fato. Mas devemos apoiar o que desejam no coração a mudança. Parabéns!