Precariedade de cadeia pública de Governador Valadares é denunciada em audiência

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Deputados reforçam, em debate da Comissão de Segurança Pública da ALMG, luta pela instalação de nova unidade na região.

Superlotação, rebeliões e fugas. Essa é a rotina da Cadeia Pública de Governador Valadares (Vale do Rio Doce), o que tem tirado o sono de lideranças e moradores da região. A busca de uma solução imediata para o problema levou a Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) a realizar uma audiência pública na manhã desta terça-feira (28/4/15), na Câmara local, atendendo a requerimento do deputado Cabo Júlio (PMDB). Entre as soluções propostas, está a construção de uma nova unidade e a transferência dos presos condenados.

Comissão debateu a situação da cadeia pública localizada no Bairro Santos Dumont, em Governador Valadares, e a criminalidade na região – Foto: Guilherme Dardanhan / ALMG

Logo no início da reunião, Cabo Júlio (PMDB) traçou um panorama do problema, apresentando várias reportagens sobre a unidade prisional, situada em uma área residencial, no Bairro Santos Dumont. “Ela está abrigando atualmente quatro vezes mais presos do que foi projetada. E vamos deixar de prender mais criminosos? A situação não é diferente no restante do Brasil, mas precisamos encontrar soluções. O problema é basicamente de gestão, de estabelecer prioridades”, afirmou.

A capacidade do local é, originalmente, para 290 detentos, mas aprisiona atualmente 823 presos, sendo 52 mulheres. Destes, 207 são condenados. “Há a perspectiva de o Governo do Estado construir seis novas cadeias emergencialmente. Já me reuni com o Executivo e reforcei que temos que enfrentar o problema de frente, sem medo. Acho que uma dessas cadeias deveria ser construída aqui na região”, defendeu Cabo Júlio, que lembrou também a necessidade de reforçar o número de agentes prisionais na cidade.

Apesar de defender medidas visando a uma solução imediata do problema, o presidente da comissão, Sargento Rodrigues (PDT), alertou o que ele classificou como “tratamento romântico” que muitos acabam conferindo a aqueles que violam a lei. “Eu confio na atuação correta dos nossos policiais militares e na avaliação do delegado que ratifica a prisão em flagrante. Entre superlotar a cadeia ou deixar o cidadão desprotegido, prefiro a cadeia superlotada”, afirmou, reforçando o papel da Assembleia na fiscalização do Executivo e na formulação de políticas públicas. “O sistema prisional é o filho mais novo do sistema de defesa social, já que nossas forças policiais são centenárias. Muito já foi feito nos últimos anos, mas ele ainda precisa de ajustes”, acrescentou Sargento Rodrigues.

A deputada Celise Laviola (PMDB) destacou ainda que o plantão regionalizado da Polícia Civil tem agravado o problema prisional em algumas cidades polo do interior, como Valadares, já que leva para essas cidades criminosos presos em flagrante em outras cidades, nos finais de semana.

Já o deputado Bonifácio Mourão (PSDB) analisou a evolução do fenômeno da criminalidade na sociedade atual, concluindo que não existem soluções simples para problemas complexos como a questão prisional. Ele também relacionou a superlotação das celas à formação de criminosos cada vez mais violentos. “A construção de novas prisões ameniza a situação, mas é apenas um analgésico diante de um problema que é bem maior”, ponderou.

Superlotação

O diretor da Cadeia Pública, João Menezes de Souza, há mais de oito anos no cargo, reconheceu a gravidade do problema. Ele lembrou recente incêndio no local, provocado em protesto pelos presos, que por pouco não terminou em uma tragédia, com a morte de dezenas de detentos. “Por sorte, temos uma equipe muito competente, que tem conseguido conduzir a situação da melhor maneira possível. Mas são cerca de 19 presos por cela”, alertou. Outro fator que segundo ele tem permitido manter a situação sobre controle, mesmo que temporariamente, é a estreita colaboração com a prefeitura e outras instituições municipais.

A titular da Vara de Execuções Penais de Governador Valadares, a promotora Ingrid Veloso Soares do Val, lembrou várias ações em curso para forçar melhorias na unidade. Elas preveem, entre outras medidas, o reforço no aparato de segurança e a transferência imediata dos presos condenados e dos albergados, deixando apenas os presos provisórios no local, aqueles que ainda aguardam julgamento, cumprindo assim a destinação original da instituição.

“Pedimos também a duplicação da cadeia, já ganhamos em primeira instância, mas nem isso agora daria conta de toda a situação”, disse Ingrid do Val. A promotora também alertou para o fato do entorno da cadeia ter se transformado, nos últimos anos, em uma região residencial, densamente povoada, inclusive com unidades do programa federal de habitação “Minha Casa, Minha Vida”.

Defensoria Pública e OAB pedem mais agilidade da Justiça

O defensor público Thiago Alves Figueiredo também denunciou o grande número de presos provisórios na Cadeia Pública de Governador Valadares, segundo ele, a raiz do problema. “Sei que soltar todos os presos provisórios não é a solução adequada, mas precisamos debater a qualidade das prisões no Brasil. A Defensoria tem priorizado o atendimento daquela pessoa que pode responder ao processo em liberdade”, apontou o defensor, que reclamou ainda da demora na análise dos pedidos pela Justiça.

O secretário-geral da 43ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Adilson Aurélio Domiciano, fez coro, lembrando a existência de mais um milhão de mandados de prisão em aberto atualmente no País, frente a uma média de 40% de presos provisórios dividindo o espaço com condenados. “Fui presidente de uma Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) durante dois anos e lá, de cada dez presos, oito são recuperados. Há alternativas ao sistema tradicional, mas muitas vezes a sociedade não está pronta para elas”, afirmou.

Na outra ponta, reforçando a fala do deputado Sargento Rodrigues, o chefe do 8º Departamento de Polícia Civil de Governador Valadares, delegado Ailton Aparecido Lacerda, defendeu a opção jurídica tomada por um delegado ao decidir sobre a ratificação ou não da prisão em flagrante, normalmente feita por policiais militares, mesmo que ao custo da superlotação das prisões.

“Na nossa região, a Polícia Civil já transferiu muitas unidades para a Suapi (Subsecretaria de Administração Prisional), mas ainda faltam algumas, e administrar uma cadeia pública sem a estrutura adequada realmente não é fácil. A Polícia Civil não tem o preparo correto para lidar com o preso. Espero que esse processo de transferência continue e possamos liberar o policial civil para a investigação de crimes”, advertiu o delegado.

Na mesma linha, o comandante do 43º Batalhão da PM, tenente-coronel Fabrício Casotti, também defendeu que a segurança do cidadão seja priorizada. “Somos sensíveis ao problema, mas temos primeiro que defender a sociedade. A Polícia Militar está cumprindo o seu papel”, afirmou.

E a capitã Janine Faria, representante do 6º Batalhão de Bombeiro Militar, alertou ainda para as dificuldades de combate a incêndios e outras situações de risco na cadeia de Valadares. “Nas diversas intervenções e vistorias que fizemos no local, vimos que a situação é muito complicada, representando um risco não somente para os detentos, como também para a população do entorno”, destacou.

Prefeitura

O chefe de gabinete da Prefeitura local, Anselmo China, lembrou as várias ações do Executivo municipal para dar o apoio necessário às forças de segurança pública. “A Assembleia precisa promover uma ampla discussão em nosso Estado que não priorize apenas a política do encarceramento, que tem mostrado o seu esgotamento. Precisamos agir em prol de políticas de prevenção, e a Prefeitura tem desempenhado o seu papel, na medida do possível, mesmo com algumas resistências da sociedade”, disse. Ele lembrou recente tentativa da prefeitura de doar um terreno para a construção de uma nova Apac na cidade – a unidade atual atende apenas mulheres –, que enfrenta grande resistência da vizinhança.

O vereador Paulinho Costa, que levou o pedido da audiência pública à Assembleia, reforçou a situação precária da cadeia de Valadares. “É um barril de pólvora, uma panela de pressão. Governador Valadares é uma das cidades mais violentas do Brasil, situada em uma região muito pobre, e que cada vez empobrece mais. É grave o problema de desemprego, mas nossa cidade sempre cai no esquecimento. A situação da cadeia é um reflexo disso, só que lá não dá mais para esperar uma solução”, reivindicou.

(Fonte: Portal da ALMG)

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