Paulo Henrique Silva – Se a temos, por que não usamos a democracia em sua plenitude?

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A democracia no Brasil ainda é um bebê, pois tem apenas 29 anos, sendo que o início do processo de redemocratização do nosso país ocorreu em 1985 com a eleição, de Tancredo Neves, para a Presidência da República, ainda que pelo por voto indireto de um colégio eleitoral, após o período em que vigorou o regime militar, de 1964 a 1984.

Fica mais fácil compreender esta ‘infância democrática’ do nosso país, comparando-a, por exemplo, ao ambiente democrático dos Estados Unidos da América, que tiveram o seu primeiro presidente em 1789 – George Washington foi eleito unanimemente pelos eleitores em 1788.

Outro ponto primordial para entender a realidade do Brasil é a sua Constituição, aprovada em 1988. Também para efeito apenas de comparação e entendimento, os Estados Unidos aprovaram a sua primeira e, até hoje, única Constituição, em 1787.

Sinteticamente, democracia – termo de origem grega: demo/povo + kratos/poder = d?mokratía ou “governo do povo”, é um regime de governo em que as decisões políticas estão com o povo, que elegem seus representantes por meio do voto.

Agora de forma mais abrangente, o Estado Democrático de Direito, a democracia em sua essência, está assegurado na Constituição da República Federativa do Brasil, no Título 1 – Dos Princípios Fundamentais, em seu artigo 1º. Por lá, encontraremos os fundamentos que, legalmente, regem o nosso convívio, sempre ligado ao conjunto de direitos e deveres ao qual o cidadão está sujeito em relação à sociedade.

Tudo certo, mas e aí? A simples existência de uma democracia representativa, aonde por meio do voto o cidadão elege seus representantes, é o suficiente para garantir a vivência e a plenitude dos fundamentos do tal Estado Democrático de Direito?

Destrinchando, o Estado Democrático de Direito é a plenitude da democracia, superando o simples estado de direito, enquanto sistema submisso às leis promulgadas, situação jurídica garantidora dos direitos de cada cidadão, desde o simples indivíduo até as autoridades públicas, nas esferas dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Neste contexto, com o direito do voto garantido, o dever de fiscalizar a atuação do representante eleito é uma obrigação de cada cidadão, mesmo sabendo que existem aqueles que vendem o seu direito por uma nota de R$ 50,00 e depois ficam ‘cornetando’ toda a classe política.

Se um indivíduo vende o seu voto – e vamos tratar aqui com esta transparência, pois todos sabem que esta é uma realidade do nosso país, com que moral ele vai querer fiscalizar o eleito, se ele foi o primeiro a se corromper? Qual é a contribuição para a sociedade, de um indivíduo que age desta forma? E no âmbito familiar: o que vai ensinar aos seus filhos?

E depois não me venha dizer que todo político é ladrão!

Desta forma, para que a democracia não se torne apenas uma palavra cada vez mais distante de sua essência e do seu verdadeiro sentido, o exercício diário da cidadania é uma obrigação de cada cidadão.

Vou contar uma experiência que vivenciei. Nas andanças de trabalho, parei para abastecer o carro em um posto de combustíveis e paguei a frentista com seis notas de R$ 20,00. De pronto, ela me abordou e disse: “Esta nota está esquisita, meio aveludada”. Percebi na hora que alguém me havia passado um verdadeiro “mico leão dourado”, pois a nora era falsa.

Chegando ao próximo município, sede da microrregião em que estava, fui ao Banco do Brasil para confirmar a falsidade da nota e entregá-la para posterior envio ao Banco Central, procedimento este previsto na legislação e que evitaria que mais alguém tivesse o mesmo dissabor que eu, pois poderia haver algum tipo de comunicado daquela agência para as demais na região.

Para minha surpresa, após comprovar a fraude, ouvi do caixa que me atendeu: “Faz de conta que eu nem vi esta nota” e abriu um sorriso amarelo.

Então precisei explicar que estava ali para o recolhimento da nota falsa e para que alertasse as demais agências da região, evitando quem sabe a proliferação do prejuízo para outras pessoas. Comentei ainda que não seriam vinte reais que me deixariam mais pobre, ou mais rico, aí é depende do ponto de vista.

Esclarecida minha intenção, o servidor público (!?!) foi providenciar a documentação para a retenção.

Voltou meio sem jeito, com o documento para assinatura e agradeceu com um aperto de mão e com um semblante de como eu estivesse fazendo um ‘enorme favor para a humanidade’. Quando virei de costas, pude ouvir o comentário: “Não podemos perder a esperança”.

Pois bem, se um cidadão comum vai cumprir com o seu dever perante a sociedade e, tal atitude, por mais simples e óbvia que seja, causa espanto em um servidor público, aí já é passada a hora de repensarmos o papel de cada um de nós no nosso dia a dia, na vida em sociedade e no cumprimento dos nossos deveres enquanto cidadãos.

Citando Amarildo Vieira Santos: “É preciso que a cidadania do outro seja preocupação de cada um. A cidadania é pessoal, intransferível, ninguém terá mais se o outro tiver menos”.

Com certeza, democracia e cidadania são conceitos indissociáveis.

A cidadania é o componente fundamental da democracia e, para construir uma sociedade livre, justa e solidária, como previsto na nossa Constituição Federal, é preciso ter a coragem de se esforçar não somente pelo Eu, mas também para o Nós.

Forte abraço!

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