Reserva Mata do Passarinho evita a extinção de aves ameaçadas no Vale do Jequitinhonha

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Numa área de 3 mil hectares, a ONG mineira Fundação Biodiversitas criou a Reserva Mata do Passarinho, onde trabalha para a conservação de mais de 300 espécies de aves, entre elas quase 40 ameaçadas de extinção, como o raríssimo entufado-baiano (Merulaxis stresemanni).

Araçari-banana (Pteroglossus bailloni)

Com 650 hectares, a Reserva Mata do Passarinho – localizada no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, – é um alento para os que se preocupam com a preservação não somente da flora, mas também da fauna brasileira. A área, protegida pela Fundação Biodiversitas, abriga 319 espécies de aves devidamente catalogadas, sendo que 38 dessas encontram-se à beira da extinção. Para divulgá-las, a organização não governamental acaba de tirar do prelo o livro Guia fotográfico da Reserva Mata do Passarinho, de autoria dos ecólogos Thais Aguilar e Alexandre Enout, e fotografias de Ciro Albano.

“O objetivo (com esse guia) é divulgar o trabalho de conservação do remanescente florestal do Baixo Jequitinhonha e do grande número de espécies raras no local. Além disso, queremos mostrar a conservação do entufado-baiano (Merulaxis stresemanni) e estimular o ecoturismo na reserva, pois é um local de extrema importância para tal”, diz Enout. A ave citada pelo autor, o entufado-baiano, é exclusiva da Reserva Mata do Passarinho e oito indivíduos são monitorados constantemente. Estipula-se, porém, que cerca de 30 animais da espécie vivam na área. “Acreditamos que exista uma população maior, pois o entufado, além de raríssimo, é uma ave difícil de ser observada, pois fica nas áreas fechadas da floresta”, complementa Enout.

Entufado-baiano (Merulaxis stresemanni)

Grande vedete do livro, o entufado-baiano foi redescoberto em 2005 pelo ornitólogo Rômulo Ribon, da Universidade Federal de Viçosa (UFV). A espécie fora descrita pelo ornitólogo alemão Helmut Sick em 1960, partindo de exemplares coletados em Salvador e Ilhéus, na Bahia, na década de 1830 e em 1945, respectivamente. Depois disso, o primeiro registro da ave viria somente em 1995, com o achado do francês Gerard Baudet na Fazenda Jueirana, localizada em Una, município baiano próximo do estado de Minas Gerais. Depois de inúmeras tentativas de tentar encontrá-lo novamente, o entufado só foi avistado 10 anos depois na cidade de Bandeira, situada às margens do rio de mesmo nome e do Rio Rubim, no Vale do Jequitinhonha. O programa de conservação da espécie então iniciou-se com a aquisição da Fazenda Sossego do Arrebol e a criação da Reserva Mata do Passarinho, iniciativa da Biodiversitas em parceria com a prestigiosa American Bird Conservancy (ABC) – instituição que mantém e apoia diversos programas de conservação de aves nos Estados Unidos e ao redor do mundo.

A reserva faz parte de um ameaçado fragmento de floresta atlântica de apenas 3 mil hectares e tem como vizinhos fronteiriços propriedades particulares. O ecoturismo ainda não deslanchou na Mata do Passarinho, mas com determinadas ações a tendência é que se fortifique. “É uma reserva nova e estamos trabalhando nela desde 2007. Temos guarda-parques, guias, estradas, aceiros e um sistema de trilhas de 20 quilômetros de vários níveis de dificuldade”, especifica Alexandre Enout. “Estamos também construindo alojamentos que devem ser inaugurados no fim do ano. Chalés integrados com o ambiente. Ainda não estimulamos o ecoturismo, mas como o uso público ainda não foi implementado o número de visitantes é modesto”, completa. Estima-se que depois de todas as instalações prontas a reserva receba cerca de 1 mil turistas por ano.

Observação

O perfil dos visitantes da Reserva Mata do Passarinho é diverso, mas seus gostos convergem para uma só paixão: o amor pelas aves e a arte de observá-los. De acordo com Alexandre Enout, “são pessoas de profissões diversas que às vezes não têm nada a ver com a área da biologia, como advogados ou professores, mas que são verdadeiros entusiastas (da observação de aves)”. Noventa por cento dos turistas são estrangeiros e a maioria vem dos Estados Unidos e da Europa, locais onde a prática é corriqueira. Os japoneses também nutrem esse hábito. Vale destacar que não se pode influenciar o comportamento das aves e tampouco fustigar seu ambiente. O número de bird watchers no Brasil vem crescendo a cada dia e já há um site para o grupo, o Wiki Aves (www.wikiaves.com), que fornece dados e imagens interessantes para os adeptos da observação desses animais.

Crejuá (Cotinga maculata)

Algumas espécies em extinção que habitam a Reserva Mata do Passarinho

Entufado-baiano (Merulaxis stresemanni)
Anambezinho (Iodopleura pipra)
Tiriba-grande (Pyrrhura cruentata)
Trepador-sobrancelha (Cichlocolaptes leucophrus)
Caburé-miudinho (Glaucidium minutissimum)
Araponga (Procnias nudicollis)
Cuitelão (Jacamaralcyon tridactyla)
Bem-te-vi-pequeno (Conopias trivirgatus)
Acrobata (Acrobatornis fonsecai)
Benedito-de-testa-amarela (Melanerpes flavirons)
Uru (Odontophorus capueira)
Catatau (Campylorhynchus turdinus)
Araçari-banana (Pteroglossus bailloni)
Rabo-amarelo (Thripophaga macroura)
Tiriba-de-orelha-branca (Pyrrhura leucotis)
Papinho-amarelo (Piprites chloris)
Sabiá-pimenta (Carpornis melanocephala)
Crejuá (Cotinga maculata)
Apuim-de-costas-pretas (Touit melanonutus)
Choquinha-pequena (Myrmotherula minor)

* Segundo listas de espécies ameaçadas de Minas Gerais e da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Ameaças são reais

A Reserva Mata do Passarinho ainda conta com algumas ameaças. Caça e exploração dos recursos da floresta estão entre as principais. Para tentar inibir a presença de pessoas com objetivo de prejudicar a área, a Fundação Biodiversitas conta com o apoio dos vizinhos ao espaço para coibir as ações. “Mantemos um trabalho de fiscalização por meio de nossa presença institucional, tendo contato direto com os vizinhos, que atuam como nossos parceiros para dificultar a entrada das pessoas na reserva que querem caçar e desmatar o espaço”, afirma Enout. Apesar de pacas e tatus configurarem entre os “produtos” mais requisitados pelos caçadores que povoam a região, aves raras e populares como o macuco, uma ave tipicamente “de chão”, também se tornam alvo de cobiça. Apesar disso, a atividade dos cortadores de árvores e caçadores diminuiu depois da chegada da Biodiversitas na região.

Além do macuco, outras espécies ameaçadas que povoam o imaginário das pessoas também estão presentes na Mata do Passarinho. A famosa araponga (Procnias nudicollis), o cuitelão (Jacamaralcyon tridactyla) e o papagaio-de-peito-roxo (Amazona vinacea), conhecido vulgarmente pelas alcunhas de curraleiro ou téu-téu, também dão suas “bicadas” por lá, para a alegria dos observadores dessas belezas.

Contraste

Outra ave curiosa que enfeita a reserva é o crejuá. Por causa de sua tonalidade de azul brilhante contrastada com um tom mais arroxeado, nenhuma lente é capaz de captar a “cor real” da espécie. Os equipamentos eletrônicos extraordinariamente são incapazes de traduzir a coloração verdadeira. Por esse motivo a ave também é um grande sucesso entre os observadores. E que as lentes e os olhos continuem a adorar essas magníficas criaturas sem afetá-las. O guia teve apoio da Petrobras e também da Fundação Grupo Boticário.

GALERIA DE FOTOS:

(Fonte: Jornal Estado de Minas / Fotos: Ciro Albano – Acervo Biodiversitas)

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