O Rio Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, tem registrado vazões críticas – quando é necessário impor restrições ao uso – com mais frequência nos últimos quatro anos. Esse período já é o pior dos últimos 20 anos. A água que resta ainda sofre com a descarga de esgoto, sobretudo dos municípios de Turmalina, Minas Novas, Francisco Badaró e Araçuaí.
As informações são do Instituto Mineiro de Gestão de Águas (Igam) e foram apresentadas em audiência pública da Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização, realizada na quarta-feira (5/6/19), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Na reunião, foram discutidas também medidas para a revitalização do manancial.
O Araçuaí abastece 23 municípios, com 290 mil pessoas, e é um dos principais afluentes do Jequitinhonha. Mas está “por um fio”, segundo o prefeito de Araçuaí, Armando Paixão. “Se a situação continuar a mesma, em três ou quatro anos não teremos água para beber”, alertou. De acordo com o prefeito, como a cidade está próximo à foz do rio, recebe água de péssima qualidade.
Sobrevivência – Em 2018, segundo Armando Paixão, a prefeitura gastou R$ 800 mil com caminhões-pipa para levar água à zona rural. Neste ano, deve gastar R$ 1 milhão. “É água para sobrevivência. O morador do campo não pode produzir e nem gerar renda com ela”, observou. Ele pediu a união de todos os órgãos para um trabalho de longo prazo em prol do rio.
Na fase de debates, Josias Gomes, membro do Comitê da Bacia Hidrográfica (CBH) do Araçuaí, acrescentou que nem mesmo a Copanor consegue limpar a água da barragem do Rio Setúbal, que abastece parte da região. A água, segundo ele, está sendo levada à zona rural de Araçuaí junto com sulfato de alumínio, para os próprios consumidores, sem experiência, fazerem a sedimentação.
O prefeito de Berilo, Lázaro Neves, lembrou a tese de que a região se transformaria em deserto e salientou que o primeiro passo para isso, o desaparecimento das nascentes, já ocorre há muito tempo. “O Rio Araçuaí está na UTI. E, por tabela, morrem outros rios”, apelou também o Frei José Natalino Martins Jardim, pároco de Berilo e presidente da Caritas Diocesana.
Participantes destacaram problemas como a destruição de nascentes e as grandes outorgas de água – Foto: Guilherme Dardanhan/ALMG
CBH denuncia falta de licenciamento em barragens
As barragens dos Rios Setúbal e Calhauzinho, que impactam diretamente o Rio Araçuaí e são geridas pelo governo de Minas, não têm licença de operação. A denúncia é da presidente do CBH do Rio Araçuaí, Bruna de Souza Otoni. “O Estado não cumpriu nenhum dos programas de controle do plano ambiental da barragem e está ausente do comitê”, reforçou, apelando para a regularização.
Para a presidente, é preciso também regulamentar a preservação da Serra do Gavião, onde estão localizadas nascentes dos Rios Araçuaí e Jequitinhonha. Com o pisoteio e fogo no alto, não teremos água”, afirmou. Outro problema, segundo ela, é a monocultura de eucalipto, que chega a 150 mil hectares na bacia. “Há outorgas de águas para eles também”, pontuou.
Ocupações irregulares, com supressão de matas ciliares, falta de saneamento e de reuso da água, presença de lixões e aterros, além da mineração, foram outros problemas citados por Bruna. Ela também lamentou o sucateamento dos órgãos ambientais da União e do Estado, inclusive com contingenciamento de recursos para os comitês.
Prefeitos e vereadores de várias cidades estiveram na audiência. Na fase de debates, vários participantes reforçaram os problemas relacionados ao abastecimento de água no Vale do Jequitinhonha, como o pisoteamento de nascentes pelo gado, a monocultura de eucalipto, as grandes outorgas para uso de água e também os gargalos sociais gerados por essa situação.
Programas – Por outro lado, Igam e Copasa apresentaram projetos que podem beneficiar a região. Está em fase de consulta pública para priorização de áreas, por exemplo, o Somos Todos Água, do Igam, voltado para a recuperação dos cursos d’água com vistas à segurança hídrica e à diversidade.
A Copasa/Copanor citou o Pró-mananciais, que investiu R$ 423 mil em cinco cidades da região. O programa faz replantio de nascentes, cercas e pequenas barragens, com educação ambiental de crianças. Outros R$ 22,5 milhões serão aportados no semiárido para projetos alternativos de oferta hídrica. Há, ainda investimento de R$ 10 milhões em Araçuaí para Estações de Tratamento.
Para o vice-presidente da Copasa, Tadeu José de Mendonça, o grande desafio é o uso racional da água. Outros órgãos públicos também enviaram representantes, como a Emater, que tem experiência em construções de barraginhas e adequação ambiental de estradas vicinais e se dispôs a trabalhar na zona rural dos municípios. O Instituto Estadual de Florestas (IEF) também se colocou à disposição.
Deputados pedem providências
Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), autor do requerimento para a audiência, ressaltou a importância ambiental, cultural, histórica e econômica do Rio Araçuaí. “Esse patrimônio do Jequitinhonha sofre com descaso, assoreamento, esgoto e desmatamento de mata ciliar”, contrapôs. Ao final da reunião, ele sugeriu vários requerimentos solicitando providências dos órgãos públicos.
Natural do Jequitinhonha, Doutor Jean Freire (PT) enfatizou o descaso com a região. “Produzimos 90% do lítio brasileiro e mendigamos água”, comparou. Ele anunciou a formação da Frente Parlamentar do Semiárido Mineiro, que vai tratar da situação dos rios. “Não podemos discutir os grandes sem tratar dos pequenos”, salientou.
Já Rosângela Reis (Pode), presidente da Comissão, também reforçou que a discussão sobre o Rio Araçuaí é ainda mais importante em função de a água ser escassa na região.
VER PRIMEIRO
Receba as notícias do Aconteceu no Vale em primeira mão. Clique em curtir no endereço www.facebook.com/aconteceunovale ou no box abaixo:
(Fonte: ALMG)