Familiares de um preso que foi decapitado, e que depois teve o corpo carbonizado por outros detentos, durante uma rebelião na Cadeia Pública de Governador Valadares, em 6 de junho de 2015, deverão ser indenizados pelo Estado de Minas Gerais em R$ 120 mil, por danos morais.
A decisão é da 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que reformou parcialmente sentença da comarca de Governador Valadares apenas para modificar questão referente à correção monetária sobre o valor.
O Estado de Minas deverá ainda pagar à mãe da vítima pensão mensal de 1/3 do salário mínimo, até o dia 10 de cada mês, desde a data do óbito até quando o rapaz, então com 28 anos, completaria 75 anos. Também deverá pagar os valores pretéritos da pensão alimentícia.
Omissão do Estado
A mãe e os três irmãos do preso sustentaram nos autos que houve omissão por parte do Estado de Minas Gerais no dever de assegurar a integridade física da vítima, que estava sob custódia estatal.
De acordo com a família, a vítima foi brutalmente assassinada, durante a rebelião, por meio de pedradas, chuços e chutes. Foi depois decapitada e, por fim, teve fogo ateado ao corpo.
Na Justiça, os familiares afirmaram que, além dos danos morais sofridos pela mãe e pelos irmãos do preso, houve ainda dano de ordem material, uma vez que o filho era arrimo de família.
Em primeira instância, a juíza Dilma Conceição Araújo Duque, da 1ª Vara Cível de Governador Valadares, condenou o Estado a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 60 mil para a mãe e R$ 20 mil para cada um dos irmãos. Determinou também o pagamento de pensão de 1/3 do salário mínimo à genitora.
Recursos à sentença
Diante da sentença, ambas as partes recorreram. O Estado sustentou que somente em casos específicos, em que tenha ficado caracterizado que a Administração tinha conhecimento da situação – e, com isso, tivesse como evitar a ocorrência do evento danoso e, ainda assim, nada fez, ou fez mal ou tardiamente –, poderia, eventualmente, ser responsabilizada.
Para o Estado, não teria havido omissão estatal, por isso não havia que se falar em indenização. Alternativamente, pediu que, se mantida a condenação, o valor da indenização pelo dano moral fosse reduzido.
Em relação ao dano material, afirmou que não havia prova da dependência econômica da genitora, o que afastava a possibilidade de recebimento de pensão. Alegou ainda que, na qualidade de detento, a vítima não exercia atividade remunerada.
Por sua vez, os familiares do preso recorreram pedindo o aumento da indenização por danos morais para R$ 100 mil, para cada autor, tendo em vista ser imensurável a dor causada pela morte de um ente próximo, em especial diante das circunstâncias trágicas do assassinato.
Culpa concorrente
Ao analisar os autos, o relator, desembargador Leite Praça, citando laudo do IML, verificou não haver dúvidas nos autos de que a morte do detento se deu dentro do presídio público, tendo sido executada por outros detentos, que, além de decapitarem a vítima, carbonizaram o corpo.
Para o relator, era preciso reconhecer a existência de ato omissivo estatal ao deixar de zelar pela vida de preso sob sua custódia, direito constitucionalmente garantido, em inciso do art. 5º da Constituição Federal, que dispõe ser assegurado aos presos “o respeito à integridade física e moral.”
“Para configuração da responsabilidade de indenizar é necessário que se verifique a presença simultânea de três elementos essenciais, quais sejam: a ocorrência induvidosa do dano; a culpa ou dolo do ofensor; e o nexo causal entre a conduta ofensiva e o prejuízo da vítima”, enumerou o relator.
Na avaliação do desembargador, uma vez demonstrada a culpa concorrente do Estado pela morte de detento em presídio, em virtude de omissão de agentes penitenciários, faz jus a autora à indenização por danos morais, cuja mensuração deve observar o caráter pedagógico, compensatório e punitivo da medida.”
No caso dos autos, o magistrado ressaltou: “(…) não se pode negar que os fatos acima relatados causaram danos emocionais e sofrimentos aos autores, na medida em que ninguém duvida da dor e tristeza advinda da perda de um ente familiar próximo (filho/irmão) de maneira tão brutal.”
Em relação ao dano material, o relator observou não haver prova de que a mãe do preso dependia economicamente do filho. No entanto, ressaltou, entendimento unânime do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelece não ser necessária essa demonstração no caso de família de baixa renda, pois se presume “a ajuda mútua entre os integrantes do núcleo familiar.”
Assim, o relator manteve a decisão que obrigou a Estado de Minas a indenizar a família, por danos morais e materiais. Em seu voto, ele foi sendo seguido pelos desembargadores Versiani Penna e Carlos Henrique Perpétuo Braga.
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(Fonte: TJMG)