MPF instaura mais de 200 procedimentos para apurar fraudes com dinheiro público

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Investigação é feita contra deputados, prefeitos, ex-prefeitos, ONGs e empresários suspeitos de desviar verbas do Ministério do Turismo

Um dos maiores esquemas de corrupção envolvendo emendas parlamentares ao Orçamento da União rendeu, somente em Minas Gerais, até agora, 202 procedimentos instaurados pelo Ministério Público Federal (MPF), entre inquéritos e ações judiciais cíveis e criminais. Eles apuram a participação de deputados, prefeitos e empresários em irregularidades na aplicação de verbas do Ministério do Turismo destinadas a realização de festas, com a contratação de artistas e bandas de música. A maioria desses procedimentos investiga contratos firmados com as prefeituras durante o período de 2007 a 2009, quando a pasta recebeu um volume elevado de emendas parlamentares que, juntas, chegaram a atingir a cifra de R$ 782, 5 milhões. Segundo dados da Controladoria Geral da União (CGU), o total de emendas parlamentares destinadas ao Ministério do Turismo aumentou 600% nesse período. Irregularidades na aplicação desses recursos foram denunciadas em 2009 por uma série exclusiva de reportagens publicadas pelo Estado de Minas.

Só na Justiça Federal mineira já tramitam 53 ações. Ao todo são investigadas 98 das 853 prefeituras mineiras , o que representa 11% do total de municípios, em todas as regiões do estado. É possível que haja um número maior de cidades, pois algumas apurações tramitam em sigilo e não há como levantar o nome dos envolvidos. Algumas prefeituras são acusadas de irregularidades em mais de um procedimento, caso de Itabirinha de Mantena, cidade de pouco mais de 10 mil habitantes, no Vale do Rio Doce, alvo de quatro ações. Entre 2007 e o ano passado, a cidade recebeu R$ 2,4 milhões de repasses do Turismo para a realização de sete festas e também para a reforma de praças e do centro de eventos. A maioria dos convênios dessa cidade foi bancado com emendas parlamentares de autoria do ex-deputado federal Carlos William (PSC) e do deputado federal João Magalhães (PMDB), acusados pelo MPF de participação nos desvios.

Outros municípios, como Reduto, na Zona da Mata, e Matias Cardoso, no Norte, respondem a três ações. E muitos outros são alvos de dupla investigação. Sete organizações não governamentais que receberam verbas para eventos também respondem a inquéritos. A região do estado com maior número de ações é o Norte de Minas, com 17 já em tramitação, seguida do Leste mineiro, com 16 processos.

As fraudes com verbas do Ministério do Turismo para a realização de festas substituíram outros esquemas de desvio de recursos públicos que utilizavam roteiro semelhante: um deles tinha como objeto a aquisição de ambulâncias pelas prefeituras por preços superfaturados e com dispensa de licitação. Para desmantelar a quadrilha, a Polícia Federal montou a Operação Sanguessuga, que prendeu empresários e políticos. Em outra operação, a João de Barro, a PF desmontou um esquema de fraudes em obras públicas nos municípios, principalmente na área de saneamento.

(Sedes da WM e da Tama, em Caputira. Empresas acusadas de participar do esquema que desviou recursos do Ministério do Turismo para realizar festas – Foto: Carlos Henrique Cruz/Estado de Minas)

Esquema nacional

O MPF define todos esses casos como “um esquema de corrupção envolvendo parlamentares federais, prefeitos e ex-prefeitos municipais e empresários, que, com a manifesta intenção de desviarem verbas públicas federais, utilizaram um mesmo modus operandi nos convênios celebrados com o Ministério do Turismo para a celebração de festas”. A atuação consistia, de acordo com o MPF, em fraudar os procedimentos licitatórios, para direcioná-los a empresas previamente escolhidas, que, por sua vez, utilizavam falsas cartas de exclusividade com os artistas contratados para os eventos. Os cachês eram superfaturados, e o valor excedente, rateado entre os participantes das fraudes.

Em São Paulo, já foram ajuizadas 31 ações de improbidade administrativa envolvendo 39 prefeitos e ex-prefeitos de cidades do interior do estado e 43 representantes de empresas intermediadoras de shows artísticos contratadas irregularmente para a realização de eventos promovidos com recursos públicos do Ministério do Turismo. Somente nessas cidades paulistas, o Ministério fechou 81 convênios, no valor total de R$ 13, 9 milhões. Algumas prefeituras, como Jales, no Noroeste, assinaram sete convênio de festas. Também existem ações e procedimentos de investigação em curso na Paraíba, Ceará, Bahia e Espírito Santo.

Prefeitos com bens bloqueados

O Ministério Público Federal (MPF) conseguiu, este mês, o bloqueio dos bens dos atuais prefeitos de Frei Inocêncio, Carlos Vinício de Carvalho Soares (PR), e de Caputira, Wanderson Oliveira Teixeira (PTB), e de seu pai, o ex-prefeito da cidade, Jairo de Cássio Teixeira, réu em outras ações do MPF que tratam de irregularidades na aplicação das verbas do Ministério do Turismo para a realização de festas.

O prefeito de Caputira é sócio da Linearte, contratada sem licitação pela Prefeitura de Frei Inocêncio. Wanderson já teve ligações com a WM Produções, registrada em Raul Soares, em nome de Ramiro Andrade Grossi, também réu em outras ações por causa das mesmas irregularidades, mas que emitia notas fiscais com endereço de uma casa na zona rural de Caputira. Também são alvo dos bloqueios os sócios das empresas que realizaram os eventos nas duas cidades, funcionários públicos e o ex-deputado federal Carlos William. O bloqueio atinge a cifra total de R$ 380 mil.

No caso de Frei Inocêncio, no Leste de Minas Gerais, os recursos eram destinados à realização de um evento chamado “Feira da Amizade”. Uma emenda parlamentar do então deputado Carlos Willian, no valor de R$ 100 mil, foi repassada para bancar os gastos com a feira, entre eles a contratação de artistas, feita sem licitação. Para justificar a dispensa da concorrência, o município exigiu da Linearte uma carta de exclusividade dos artistas apenas para os dias do evento, o que, para o MPF, já demonstra como o procedimento foi forjado, “já que nenhuma outra sociedade empresária poderia participar do certame, e tal fato já era de conhecimento dos requeridos”.

Na verdade, a legislação brasileira até admite a contratação direta, ou por meio de empresário exclusivo, de artistas consagrados pela crítica e opinião pública, mas, de acordo com o MPF, a Linearte não é e nunca foi empresária exclusiva dos artistas que se apresentaram no evento. “Sendo, portanto, ilegal a contratação dessa empresa pelo município de Frei Inocêncio”, afirma o MPF na ação. De acordo com a denúncia, a prefeitura chegou a simular a realização de uma pesquisa de opinião entre a população do município para justificar a escolha das bandas. O valor do prejuízo aos cofres públicos, calculado pelo Ministério do Turismo em março de 2013, foi de R$ 134.370,80.

Já em Caputira, o MPF conseguiu o bloqueio dos bens de Jairo Cássio de Teixeira, conhecido como Jairinho, dono da Tamma Produções, empresa denunciada por irregularidades na aplicação das verbas para festas em outras cidades. Ele é acusado de diversas irregularidades na execução do convênio firmado com o Ministério do Turismo para a realização do carnaval de 2008 na cidade. Em 2007, o então prefeito firmou convênio com o Ministério do Turismo, no valor de R$ 70 mil, para a apresentação de shows musicais no carnaval de 2008. De acordo com o MPF, a prefeitura simulou a inexigibilidade de licitação para a contratação dos artistas que iriam se apresentar durante o carnaval, alegando que a empresa contratada, Rogério Tavares Rodeio e Show, tinha a exclusividade dos artistas. Também afirma ter sido uma fraude a concorrência realizada para a contratação da empresa responsável pela montagem da infraestrutura dos shows. (Estado de Minas)

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