Força, determinação, cuidado, zelo e amor. É essa a imagem que os filhos têm daqueles guerreiros que atendem pelo nome de pai. Para celebrar esse laço, é comemorado em todo o país, neste domingo (14/08), o Dia dos Pais. Momento de partilhar, unir familiares e reafirmar o amor que os envolvem e que vai além do tipo de sangue que correm nas veias. Pai coloca comida na mesa, compra as vestimentas, oferece amor e carinho para os filhos, mas por trás de tudo isso, existem histórias ocultas que fazem tudo valer a pena.
Esse é o caso de Vicente Nunes. Ele nasceu em um distrito de Montes Claros, chamado Barrocão, e desde pequeno conviveu e sentiu na pele as dificuldades da vida. “A minha vida foi muito sofrida. Nunca tive condição de estudar e desde muito cedo trabalhei. A minha família era muito pobre”, relata. O estudo que não lhe foi possível, esteve ao alcance de seus filhos. Hoje, ele se orgulha de ter os dois filhos formados. O sorriso estampado no rosto revela a alegria de ter superado todas as barreiras para vencer na vida.
Mas, para que esse sonho se tornasse realidade, a jornada não foi fácil. Ele se aventurou em terras goianas, não teve sucesso e teve de voltar para Montes Claros. Em busca de condições melhores, decidiu ir ainda mais longe, mais precisamente para o Mato Grosso. “Trabalhei duro em fazenda. Lá me casei e tive meus filhos e as coisas continuavam difíceis. Diante de todas as dificuldades, voltamos para cá. Quando retornamos, viemos com apenas um berço e mais nada”, relata.
Novamente na maior cidade do Norte de Minas, agora com os filhos, mais desafios. Era preciso alugar uma casa e pagar as contas básicas. Com um cenário desfavorável, o filho Samuel Nunes, começou a ajudar os pais. “Eu ia para a rua engraxar sapato, vender tomate, chupa-chupa, picolé, sapato e salgados”, afirma Samuel.
Samuel Nunes com o pai Vicente e a mãe Maria Moraes (Foto: Arquivo pessoal)
Ver os filhos sonhando em cursar uma faculdade, motivou e encorajou Vicente Nunes a voltar a viajar. “A gente não tinha condição de pagar os estudos dos meus filhos. No início eu trabalhava como servente de pedreiro. Também fui vender livro na rua e ia de porta em porta. Para melhorar a renda, fazia o Norte de Minas todo. Por isso, não acompanhei de perto os estudos deles. Estava sempre viajando”, relembra.
Com todo esforço e determinação, Samuel ingressou em uma faculdade de jornalismo, em 2002, e se formou em 2005. Em uma ocasião, Vicente deixou de reencontrar a família para atender a um pedido do filho. “Lembro de uma época que estava em Uberlândia e tinha o plano de vir embora. Samuel me ligou dizendo que tinha que fazer uma apresentação e precisava comprar um terno. Mandei o dinheiro da viagem para ele e fiquei por lá uns 70 dias, já que não tinha condição de voltar”, observa.
As dificuldades impostas pela vida são lembradas hoje com bom humor. Vicente sorri ao contar um caso inusitado. “Teve um dia que estava prestes a viajar e veio um vento que arrancou o telhado do barracão onde a gente morava. Tive que cobrir com uma lona e viajar. Por conta disso, fiquei 70 dias fora para poder ter o dinheiro para cobrir a casa de novo”, comenta.
Para Samuel, embora a caminhada tenha sido sofrida, ela foi fundamental para a construção dos seus valores. “Isso acabou ajudando a me tornar humilde, educado, a ter caráter. Tudo que vem com dificuldade a gente dá mais valor”, ressalta.
A importância da figura paterna na vida do jornalista está descrita no brilho dos olhos ao falar do pai. “Eu tive a oportunidade que ele não teve. Pude estudar e me formar. Ele foi essencial para que eu pudesse chegar até aqui. Além disso, influenciou na formação do meu caráter; é um legado, um exemplo a ser seguido”, diz.
Após superar todas as dificuldades, Vicente Nunes se orgulha: “A vida para mim é uma vitória”.
Um guerreiro por trás da medicina
Desafios também fazem parte da vida de Sebastião Assis Santos Carvalho. Tudo começou em Gameleira, também distrito de Montes Claros. Vindo de uma família de onze filhos, a vida não foi fácil. Sustentar uma família tão grande se tornou um desafio para os pais de Sebastião, que optaram por vir morar na maior cidade do Norte de Minas. Era década de 1970. Sebastião, com sete anos de idade, já sentia as dificuldades que estavam por vir.
Julie Danielle com o pai Sebastião (Foto: Taislaine Antunes/G1 Grande Minas)
“A vida era muito difícil. A gente morou em casas de aluguel e até mesmo em imóveis tão fracos, que se chovesse, paredes caíam com a gente morando dentro, porque não tínhamos condição de morar em uma residência melhor”, lembra Sebastião.
Aos 14 anos Sebastião se vê em um dilema: estudar ou trabalhar para ajudar em casa. Diante das dificuldades, o sustento da família foi colocado em primeiro lugar. Ele deixa os estudos no sétimo ano para vender frutas e verduras no Mercado Municipal. Lá se foram 16 anos.
Com a já família constituída, Sebastião percebe que ser feirante não satisfaz as necessidades da esposa e de seus sete filhos. É neste momento que decide mudar de ramo. Passa a trabalhar com topa tudo, mas, mais uma vez a dificuldade bate à porta. Sebastião percebe que é hora de mudar e, desta vez, as coisas começavam a melhorar.
“Há cerca de 15 anos montei a borracharia. Deus tem nos abençoado. Com esse trabalho eu tiro o sustento do meu lar. Com muita dificuldade venho lutando, me esforçando para dar educação para meus filhos, para que eles não venham a se desviar para o caminho errado”, conta.
E o esforço deu certo. A filha de Sebastião, Julie Danielle Silva, de 21 anos, deu a maior alegria para o pai: passou no vestibular de medicina da Unimontes, um dos mais concorridos do país. A dedicação e força de vontade em estudar o dia todo em casa e à noite no cursinho, trouxe grande resultado.
“Eu sempre estudei em escola pública e fiz cursinhos gratuitos. Tentei duas vezes, mas não passei. Entretanto, nunca desisti do meu sonho. As pessoas falavam que era muito difícil, mas continuei tentando. Na terceira vez, no ano passado, passei no vestibular”, relembra Julie.
Para ela o pai teve papel fundamental na conquista. “O meu pai é muito especial. Apesar de todas as dificuldades, ele venceu e me ajudou a vencer. Agradeço a Deus por fazer parte da família dele”.
Com o semblante de felicidade, Sebastião diz que a realização do sonho da família provém de muita determinação. “Muitas pessoas falam em sorte, dizem que ela deu sorte, mas na verdade, a sorte é para quem está preparado e é merecedor da conquista”, encerra.
(Fonte: G1 Grande Minas)