A Justiça Federal em Janaúba (MG) recebeu a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) relacionada à Operação Curinga, oriunda de investigação conjunta com a Polícia Federal e o Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS). Tal operação desarticulou um esquema de fraudes envolvendo a concessão irregular de benefícios previdenciários rurais no município de Monte Azul, norte de Minas, em 2014.
Foram denunciados o vice-prefeito da cidade, Antônio Idalino Teixeira, os vereadores Geraldo Moreira dos Anjos e Marineide Freitas Ferreira Silva, o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Monte Azul, Antônio Fernandes Tolentino, e o secretário do sindicato, Nilton Rodrigues Nunes. O grupo irá responder, conforme a participação de cada acusado, pelos crimes de organização criminosa (art. 2º da Lei nº 12.850/2013) e estelionato contra a Previdência Social (artigo 171, parágrafo 3º, do Código Penal). Marineide Freitas responderá, nesta ação penal, apenas por organização criminosa.
Segundo a denúncia, os acusados falsificavam documentos e forjavam fatos para conceder aposentadorias e outros benefícios previdenciários rurais a pessoas que não preenchiam os requisitos legais. Em troca, exigiam e recebiam vantagens patrimoniais indevidas, além de apoio político na região. O prejuízo mínimo aos cofres públicos calculado até o oferecimento da denúncia chega a R$ 184.681,86.
Além dos crimes cometidos contra a previdência, as investigações demonstraram também que os acusados praticavam crimes eleitorais e contra a Administração Pública do município de Monte Azul, os quais foram remetidos para apuração pela Promotoria de Justiça de Monte Azul/MG.
Esquema
O MPF relata que os acusados usaram a estrutura do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Monte Azul para a realização dos requerimentos administrativos dos benefícios previdenciários. Pessoas que nunca tinham trabalhado como produtores rurais recebiam declarações falsas atestando que elas exerciam a profissão – inclusive fornecendo declarações de tempo de serviço que não condiziam com a realidade.
A organização também usava o sindicato para agenciar terceiros para que se passassem por confinantes dos interessados – isto é, pessoas que declaravam possuir imóvel vizinho ao de um requerente e que perante a autarquia confirmavam que o beneficiário possuía um imóvel rural (uma das condições para comprovar o trabalho rural e se habilitar a receber os benefícios).
O sindicato ainda era usado para que os acusados recrutassem proprietários de imóveis rurais para simular a celebração de contratos de comodato com os supostos segurados. O objetivo era constituir prova da qualidade de produtor rural daqueles que, não possuindo propriedade campestre, decidiam tomar parte dos expedientes fraudulentos do grupo.
Divisão de tarefas
Cada um dos acusados desempenhava papel específico na organização. Antônio Idalino Teixeira, que além de vice-prefeito de Monte Azul exerce o cargo de tesoureiro do sindicato, atuava como líder. Ele se utilizava do cargo político e tinha o comando funcional e financeiro do sindicato, fornecia transporte aos interessados em receber os benefícios até a agência do INSS no município de Espinosa, fornecia gasolina e serviços com dinheiro da entidade e até mesmo com recursos públicos. Utilizava-se do sindicato – e, portanto, das fraudes praticadas mediante tal estrutura – como reduto eleitoral para captação ilícita de votos.
Teixeira era auxiliado por Geraldo dos Anjos, que tinha um forte vínculo com o sindicato por razões políticas e financeiras. Geraldo era responsável pela montagem dos documentos para os interessados em receber os benefícios previdenciários que eram encaminhados ao sindicato para confecção das falsas declarações de exercício de atividades rurais. Ele também manipulava atas de associações comunitárias e/ou de produtores rurais para inserir o nome de pessoas que não exerciam nenhum tipo de atividade no campo. Além disso, valendo-se do seu cargo político também auxiliava os demais acusados na distribuição de benefícios, tais como colchões, transporte e gasolina aos eleitores. Como pagamento pelos serviços prestados, o vereador exigia dos beneficiários vantagens financeiras após a obtenção fraudulenta dos benefícios, que em seguida eram repartidas entre o grupo.
Nilton Nunes trabalhava em estreita colaboração com Geraldo dos Anjos, agendando visitas ao INSS para os indicados pelo vereador ou mesmo patrocinando pessoalmente alguns interessados em suas causas na agência da previdência. Instruía também interessados a falsificarem documentos e era responsável pelo rateio dos valores auferidos entre o grupo.
Já Marineide Silva, vereadora e também funcionária do sindicato, orientava os interessados que não eram proprietários de imóveis rurais a providenciarem falsos contratos de comodato, agendava atendimentos no INSS e instruía os interessados em como proceder na autarquia federal. Além disso, realizava intenso trabalho de convencimento político junto aos indivíduos atendidos no sindicato para, na qualidade de eleitores, votarem e apoiarem os candidatos apoiados por ela e pela organização.
Por fim, Antônio Tolentino, como presidente do sindicato, assinava as falsas carteiras de associados e as falsas declarações de exercício de atividade rural emitidas em nome do sindicato com objetivo de ludibriar o INSS.
Crimes eleitorais e contra a Administração municipal
Os acusados usavam a estrutura do sindicato para fornecer serviços eleitoreiros em benefício do vice-prefeito e dos dois vereadores, que angariavam votos em favor de candidatos por eles apoiados nas eleições de 2014. Em troca de votos, os acusados, além de conseguir os benefícios indevidos junto ao INSS, forneciam materiais de construção, tratamentos médicos e odontológicos, serviços de limpeza e até mesmo combustível.
As investigações revelaram ainda que foram cometidos crimes contra a Administração do município de Monte Azul em benefício de particulares com objetivo de compra de votos. Para isso, os acusados superfaturavam notas fiscais, emitiam notas frias e usavam veículos e combustível públicos para transporte de eleitores até a agência do INSS.
Afastamento
Para evitar que novas fraudes aconteçam neste ano de eleições, o MPF pediu que todos os acusados fossem afastados de seus cargos no sindicato e que também fossem proibidos de ter acesso à associação. Também pediu que eles não mantivessem contato com pessoas que venham a suceder-lhes em suas funções.
Ao receber a denúncia do MPF, o Juízo Federal reconheceu o risco dos acusados ainda usarem a estrutura do sindicato para cometer mais crimes, deferindo o pedido de afastamento. “De fato, há fortes indícios de que a permanência dos denunciados na estrutura administrativa do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Monte Azul permitirá a continuidade da prática delitiva, pois permanecem nos mesmos postos que ocupavam ao tempo em que desveladas as condutas ilícitas”.
(Fonte: Ministério Público Federal em Minas Gerais)