A Defensoria Pública do Estado ingressou nesta terça-feira (3/5/16) com mandado de segurança no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ) para anular a reintegração de posse de área ocupada por 40 famílias do acampamento Aurora, no município de Jequitinhonha (Vale do Jequitinhonha). O anúncio foi feito durante audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) pela defensora pública Ana Cláudia da Silva Alexandre. O despejo das famílias está marcado para esta sexta-feira (6).
No mandado com pedido de liminar, que recebeu o apoio da comissão por meio de requerimentos aprovados, a Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais pede que o Tribunal declare a incompetência da comarca local, que é de vara única e sem juiz titular, para julgar a ação de reintegração, e por consequência a nulidade do despejo. O órgão pleiteia a remessa dos processos que tratam da questão à Vara de Conflitos Agrários de Minas Gerais, na Comarca de Belo Horizonte.
Conforme exposto por Ana Cláudia, a intenção da Defensoria é adiar prazos e prosseguir as negociações em busca de uma solução definitiva para as cerca de 200 pessoas que vivem no acampamento, formado por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que estão na área desde maio do ano passado.
Não havendo uma decisão judicial em contrário até esta sexta (6), o comandante da 15ª Região da Polícia Militar de Minas Gerais, coronel PM Aroldo Pinheiro de Araújo, garantiu que tudo será feito para que o cumprimento da ordem de desocupação transcorra de maneira pacífica. De acordo com o comandante, diante da demanda para que o processo seja remetido à Vara de Conflitos Agrários, a ordem judicial de desocupação já teria sido recolhida e remetida à Comarca de Almenara, também na região.
“É necessário aguardar uma decisão da juíza de Almenara, mas mantida a desocupação, enquanto eu estiver no comando, o movimento jamais será pego de madrugada”, afirmou o coronel, referindo-se ao MST, ao destacar que preza por ações com data e horário marcados e efetivo reduzido, por acreditar no diálogo e na conciliação.
O oficial lembrou ainda que durante encontro na região, em 6 de novembro do ano passado, os sem-terra pediram que fosse dado um prazo de seis meses para o cumprimento da ordem judicial de desocupação, o que foi feito na época. Na ocasião, segundo ele, as famílias foram informadas de que adiamentos caberiam à Justiça, mas seis meses acabaram transcorrendo em função de outras reuniões realizadas numa tentativa de acordo.
O acampamento Aurora é composto por cerca de 200 pessoas – Foto: Pollyanna Maliniak / ALMG
Requerimentos à Justiça visam suspender desocupação
Diante da situação exposta na audiência, a comissão aprovou requerimento do deputado Doutor Jean Freire e da deputada Cristina Corrêa, ambos do PT, para o envio de ofício ao presidente do TJ solicitando que a petição da Defensoria Pública seja deferida com urgência. Os parlamentares também tiveram aprovado pedido para envio de ofício à juíza da única vara da Comarca de Jequitinhonha, Karla Dolabela Irrthum, para a suspensão dos processos que envolvem a reintegração de posse da área da ocupação Aurora.
Para o deputado Doutor Jean Freire, que solicitou a audiência, a situação do acampamento Aurora é decorrente da falta de políticas públicas e de reforma agrária. “Visitei a área e desde o início da ocupação foi possível ver a transformação da terra que produz de maneira social”, defendeu.
O deputado Rogério Correia (PT) endossou o colega e defendeu, ainda, que Minas tenha uma lei que regule a atuação e os procedimentos dos órgãos e instituições em situações como esta, estabelecendo, entre outros, prazos e horários para o cumprimento de mandados de reintegração de posse. Em referência ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, Rogério Correia defendeu, ainda, que movimentos sociais como o MST estejam atentos a direitos e programas sociais que, segundo disse, podem vir a sofrer cortes com “o golpe em andamento no País”.
Solução definitiva pode levar um ano
O representante do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária em Minas Gerais (Incra-MG), Melchior Augusto de Melo, anunciou que o órgão identificou uma área alternativa para as famílias do acampamento Aurora, também próxima ao município de Jequitinhonha. Contudo, pelos prazos legais e estudos necessários, ele estimou em um ano o prazo para que o reassentamento seja efetivado.
Melchior creditou a demora do processo a questões legais. Algumas delas, segundo ele, referem-se à Lei Federal 11.428, de 2006, que restringe a cessão de terras que tenham vegetação da Mata Atlântica para fins de exploração. O representante do Incra informou que isso tem gerado à autarquia dificuldades para obter áreas rurais para assentamento, inclusive no caso do Aurora.
A área alternativa identificada começa a ser vistoriada na semana que vem, quando a equipe do Incra-MG vai a campo. Contudo, Melchior afirmou que a conclusão do relatório de vistoria deve ocorrer em seis meses, prazo de direito dos proprietários do terreno para conhecimento do processo e manifestação. Só então o processo poderá ser remetido ao órgão em Brasília para decisão e emissão de decreto presidencial.
Impasse – Manifestando preocupação com uma eventual desocupação da fazenda Aurora de imediato, a prefeita de Jequitinhonha, Iracilda Dias da Silva, ressaltou que o Executivo municipal, em busca de uma solução, participou de várias reuniões sobre a situação das famílias. “Entendemos o cumprimento da lei, mas não temos o que fazer com essas famílias se houver a desocupação. Na prática, a prefeitura não pode fechar os olhos para elas”, frisou.
O diretor de Promoção e Defesa da Cidadania no Campo da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Agrário, Aldenir Viana Pereira, acrescentou que a solução deve ser definitiva. “Essas famílias não poderão ser colocadas num galpão”, alertou, acrescentando ter verificado que os trabalhadores rurais formaram no local uma ocupação produtiva. Wilton Soares Ribeiro Miranda, diretor de Mediação de Conflitos da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, informou que está acompanhando todo o processo e também defendeu que a desocupação seja adiada.
Jequitinhonha também abriga acampamento São Geraldo
Representante do Aurora, Verinha Salomão fez um histórico da situação da ocupação, destacando que ela foi iniciada em 4 de maio de 2015 e chegou a ter, no auge, 298 famílias. “Muitas foram desistindo, porque a luta pela reforma agrária não é fácil. Hoje precisamos vencer esse despejo na esperança de dialogar”, disse.
Em apoio às famílias da ocupação Aurora, participaram da audiência representantes do acampamento São Geraldo, também na área rural de Jequitinhonha. Eles informaram que são 250 famílias acampadas ali, muitas delas com crianças e idosos, e pediram apoio contra a falta de água e luz na ocupação.
(Fonte: ALMG)