ROSA SANTOS*
Publicado em 12/04/2016 – 12:24
Após assembleia na noite dessa segunda-feira, 11 de abril, professores da Rede Municipal de Ensino de Capelinha, no Vale do Jequitinhonha, decidiram paralisar as atividades nos próximos dias 13 e 14. Nesta terça-feira, dia 12, os educadores trabalharão vestidos de preto. “Estamos de luto pela Educação de Capelinha”, comenta uma professora.
Está marcada para esta quarta-feira, 13, uma passeata pelas principais ruas da cidade, passando pela porta de três órgãos públicos municipais: a Prefeitura, a Câmara e a Secretaria de Educação. A concentração será na porta do Sinserca, sindicato dos servidores municipais, a partir das 7h. O Sinserca fica na Rua Governador Valadares, 336, no prédio Minas Center. “A comunidade é convidada, todos precisam saber que os professores de Capelinha foram desrespeitados, os vereadores não votaram nossa reposição salarial”, destaca a professora Kelly Coelho, presidente da Comissão de Professores.
Professores protestam contra vereadores em Capelinha (Foto: Jornal Local)
Entenda o caso
Em fevereiro, o Sinserca enviou à Prefeitura alerta sobre a necessidade de votar a reposição salarial dos professores, e atender, assim, ao que determina a Lei Federal 11.738, do Fundeb (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica). No dia 18 de março, a Prefeitura enviou para a Câmara o projeto, e inicialmente o texto da lei seria apreciado pelos vereadores em plenário no dia 28 de março, mas o projeto foi para a sessão da Casa apenas no dia 5 de abril. Na sessão de 5 de abril, alguns vereadores tiveram dúvida sobre o prazo de votação, já que 2016 é ano eleitoral. O presidente da Câmara, Mazinho Rodrigues, então, marcou uma reunião extraordinária para o dia 8 de abril, para que o projeto fosse colocado em votação.
Começou aí um imbróglio: alguns vereadores alegaram que a votação do projeto após o dia 5 de abril poderia ir contra o que determina a legislação eleitoral. Teve vereador que lembrou: “É ano político, e poderemos ficar inelegíveis”. Outros contaram ter procurado orientação jurídica por conta própria, mesmo a Câmara tendo profissionais à disposição dos legisladores.
Os professores da Rede Municipal, que estavam na sessão a convite do presidente da Câmara, se revoltaram ao saber que não seria votado o projeto de reposição salarial. Começou então um protesto silencioso, com frases escritas a caneta em folhas de caderno. Revoltados, os educadores levantaram-se em grupo e deixaram a reunião. Do lado de fora da Câmara, entoaram palavras de ordem.
Na noite de ontem, em reunião com o Sinserca, ficou decidida a paralisação de dois dias. Após a reunião, os professores assim resumiram o fato: “Pensamos que seria votada nossa reposição salarial. Mas o que vimos foram os vereadores preocupados com seus próprios interesses, temerosos quanto ao fato de não poderem ser candidatos à reeleição. Alegando que o prazo para votação foi perdido, começaram a malhar o presidente Mazinho, tentando fazer ele de Judas. Mas pensamos que ele não atua sozinho, e que ele foi eleito presidente pelos próprios vereadores. Usaram como desculpa o fato de que, num primeiro momento, somente o presidente tem acesso aos projetos. Mas todo ano, no Brasil inteiro, existe essa votação de reposição salarial, para igualar nossos vencimentos aos dos demais profissionais do Magistério do Brasil. Então, os próprios vereadores poderiam ter cobrado o projeto do presidente da Câmara ou até mesmo da Prefeitura. É obrigação deles saber sobre as leis e os prazos. E eles também poderiam ter procurado a assessoria jurídica da Câmara para se informar melhor. Todos erraram, mas, como é mais fácil, resolveram apontar apenas um culpado”.
Uma professora chegou a dizer: “Os vereadores são muito caras de pau, eles só faltaram alegar que não votariam nossa reposição salarial para que tivessem a chance de vir pedir nosso voto nas eleições desse ano. Acho engraçado porque em vez de se preocupar com a política, que será daqui a três meses, eles deveriam ao menos concluir esse mandato atendendo aos interesses da população, em especial da nossa classe de professores”.
Professores protestam contra vereadores em Capelinha (Foto: Jornal Local)
O outro lado
Os vereadores Luciano do Mundo Animal (PTN), Tadeu Filipe (PSC) e Jailson Pereira (PSD) abordaram a questão nas redes sociais. Tadeuzinho publicou vídeo com o título: “Por um erro administrativo, professores ficam sem reajuste”, e, na gravação, afirmou: “Precisamos converter este quadro, pois através do erro do presidente da Câmara, os professores estão sendo prejudicados”. Jailson classificou o caso como “pegadinha” e afirmou que o presidente da Câmara manteve o projeto “escondido, e “só o apresentando em plenário para tramitação quando a lei eleitoral não permitia mais (…). Aí está a pegadinha: como o presidente não vota, nós vereadores que votássemos favoravelmente dentro do período eleitoral responderíamos por crime de responsabilidade. Absurdo, falta de respeito e de compromisso”.
Luciano, que fez diversas publicações em seu perfil no Facebook, teceu duras críticas ao Poder Legislativo, e afirmou que a Câmara de Capelinha não pode ser considerada a casa do povo, mas, sim, a casa da Mãe Joana. “É uma vergonha, a Câmara tem dezesseis funcionários efetivos insatisfeitos e inseguros, vereadores que só se preocupam com seu próprio umbigo e com o gordo salário”. E completou: “São duzentos mil reais por mês de repasse para um Legislativo falido. Na maioria das vezes, só aprovamos nomes de ruas e nos esquecemos de legislar. Por causa de irresponsabilidade e falta de compromisso com o servidor, perdemos o prazo para aprovar um projeto de correção, enquanto alguns estão preocupados é com as eleições, com quem vai ser candidato ou não”.
O presidente da Câmara, Mazinho Rodrigues, enviou comunicado ao Sinserca sobre o ocorrido, e afirmou que “não tem nenhum prazo perdido”. O comunicado afirma ainda que o projeto chegou à Casa Legislativa dia 18 de março, e que a apreciação começaria inicialmente dia 28, mas o projeto foi apreciado dia 5 de abril, na reunião próxima. Consta ainda no texto que a folha de pagamento do mês de março já havia sido fechada (os servidores municipais recebem sempre no início do mês), então “não houve qualquer prejuízo à categoria desde que o projeto chegou à Casa Legislativa”. “O parecer da Assessoria Jurídica da Câmara é enfático ao declarar que o impedimento de votar um projeto de aumento salarial em ano político se dá em casos de “revisão geral de remuneração”, e não de “revisão setorial”, como é o caso projeto em questão, que “busca a valorização do profissional” de uma determinada categoria”.
Na manhã desta terça-feira, o presidente da Câmara ressaltou: “Houve apenas o adiamento da votação para a reunião seguinte, conforme prevê o Artigo 244 do Regimento Interno da Câmara”. E garantiu: “O projeto vai para discussão do plenário na próxima sessão, e cada vereador deve votar de acordo com sua consciência”. Mazinho informou também que “a próxima reunião ordinária da Casa está marcada para o dia 19 de abril, porém, é possível que haja uma sessão extraordinária exclusiva para discussão e votação do projeto de reposição salarial dos profissionais do Magistério do município de Capelinha”.
Também procurada pela reportagem, assim falou a secretária municipal de Educação, Nicinha Ribeiro: “Me solidarizo com os educadores, acho que paralisação ou greve é um direito do trabalhador. A reposição salarial é uma questão que envolve lei e verba federal, fico sem entender qual é o temor dos vereadores. Ainda não consigo vislumbrar um argumento que justifique oficialmente a não votação do projeto. Algumas professoras me procuraram, reitero o que disse a elas, que estou à disposição de todos na Secretaria de Educação”.
Apenas R$ 163
O salário de cada vereador de Capelinha é de R$ 6.475. O do prefeito é de R$ 20 mil, e cada secretário municipal recebe R$ 5 mil. Estes valores diferem e muito do que ganha um professor: R$ 1.438. A reposição salarial, que ainda não foi votada na Câmara, é de 11,36%, o que dá um valor de R$ 163 de reposição salarial, e os vencimentos dos professores chegariam ao valor de R$ 1.601. “Chega a ser uma vergonha, nós mendigando por cento e sessenta e três reais, e eles, que ganham muito mais que nós, brigando para saber quem está mais errado. É humilhante”, resume uma professora.
O telefone da Câmara de Capelinha, para mais informações, é o (33) 3516-1799.
(* Fonte: Jornal Local)