Ele nasce na Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, e deságua no Oceano Atlântico, em Linhares, no Espírito Santo. Em seus 853 quilômetros de extensão, corta várias cidades dos dois estados. Mas é no município de Governador Valadares que o Rio Doce deixou seu maior número de “órfãos”.
Além da destruição do ecossistema e dos problemas em consequência da falta de água potável, o desastre ecológico, provocado pela ruptura da Barragem de Fundão, em Mariana, acabou com a prática esportiva de muitos valadarenses.
Quinze dias após a chegada da lama na região, estes atletas ainda não têm sequer ideia de quando poderão voltar a utilizar o leito do rio com esta finalidade. Surfe, canoagem, jet ski e rafting eram os principais esportes praticados no local. Maior canoísta brasileiro, Sebástian Cuattrin começou a remar nas águas do Rio Doce e representou o país em competições pelo Mundo afora.
A canoagem revelou o maior nome, mas era o surfe, que depende basicamente de ondas, o esporte mais inusitado do Rio Doce. Nascido em Belo Horizonte e criado em Governador Valadares, o médico Fernando Mourão, 30 anos, começou a frequentar o rio quando tinha apenas quatro anos. Levado pelo pai, que remava no local, o também médico Carlos Henrique Mourão, 60 anos, acabou tomando gosto pelo Rio Doce.
“Já fiz um pouco de tudo aqui. Comecei nadando, depois descendo de boia, aí vieram as pranchas de bodybord. Mais tarde, conheci o surfe no Rio Doce e me apaixonei. Como eu não sou de beber, aqui era minha terapia e minha maior diversão”, relembra.
Na época de cheia, vários surfistas desafiavam as corredeiras do Rio Doce – Foto: Reprodução
A chegada da lama
Quando não estava no consultório atendendo na semana passada, Fernando acompanhou passo a passo, a lama destruindo um dos seus locais favoritos em Governador Valadares.
“Está sendo uma tristeza para todo mundo aqui da cidade, não só para a gente que praticava esporte lá. Minha última descoberta no Rio Doce tinha sido o mergulho de apneia. Eu passei todo o sábado e parte da manhã do domingo lá mergulhando para despedir. À tarde a lama chegou”, conta o médico.
“Foi triste ver os peixes morrendo e outros lutando para viver”, diz. Ele garante ter visto uma diversidade muito grande de peixes no Rio Doce.
Um dos precursores do surfe no Rio Doce é o administrador de empresas Paulinho Guido, que começou a se aventurar ali em 1988. “Foram anos e anos de muita diversão. Agora ficou impossível. A lama desceu toda. Cobriu o leito do rio e acabou com a vida e a nossa diversão ali. Não dá para ter ideia de quando poderemos voltar a surfar ali”, lamenta Paulinho.
No período chuvoso, as ondas formadas no leito do rio chegavam a ter dois metros para alegria dos surfistas mineiros. “Era uma sensação muito boa, mas o surfe no rio é completamente diferente do que no mar. Você tem que ter muito mais atenção. No mar, a onda te puxa para dentro. No rio ela parece que vai te lançar para fora o tempo todo”, explica Fernando Mourão.
(Fonte: Hoje em Dia)