Penitenciária do Vale do Aço é modelo de humanização, estudo, trabalho e cultura

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Humanização. Essa é a palavra de ordem na Penitenciária Dênio Moreira de Carvalho, no município de Ipaba, no Vale do Aço. Lá, os detentos condenados por crimes sexuais ou envolvidos em disputas de gangues não ficam separados dos demais, em celas ‘de seguro’, como acontece na maior parte do sistema prisional brasileiro. O estigma fica do lado de fora. Entre os muros da penitenciária, a regra é a igualdade.

Essa é apenas uma das peculiaridades de uma das mais organizados e produtivos estabelecimentos prisionais do Estado. Há 14 anos no posto, o diretor geral Adão dos Anjos conta que, enfrentando fortes resistências dos presos, empenhou-se, logo que assumiu, em abolir aos poucos a segregação.

“A partir do momento em que você separa presos por grupos distintos, você fortalece um e enfraquece o outro. Eu nunca permiti essa divisão. Aqui dentro não faz diferença o artigo pelo qual o detento foi condenado. Todos são iguais e estão pagando pelo crime que cometeram. Não sou eu, os agentes ou outros presos quem deve julgá-los”, argumenta Adão, tenente reformado da Polícia Militar, com oito anos de estudos em seminário católico, graduação em Filosofia, que trabalha em presídio desde 1970.

Esse perfil ajuda a explicar por que a Dênio Moreira têm 230 presos estudando, sendo 14 em cursos superiores a distância de administração, ciências contábeis e turismo e 400 trabalhando. Mas as frentes de ressocialização não se limitam à profissionalização e ao estudo. Há oficinas culturais, grupos regulares de teatro e de música. Para as famílias dos presos, comemorações preparadas com esmero pelos servidores em datas como o Dia das Crianças e o Natal, com palhaços e distribuição de presentes.

No campo da espiritualidade, nada menos do que 11 denominações evangélicas, além dos católicos, atuam na penitenciária. Cada um dos quatro pavilhões tem um espaço próprio para os cultos e missas.

Grupo Vozes da Cela existe desde 2012 – Foto: Marcelo Sant’Anna/Imprensa MG

Ensino e oportunidades

Nas seis salas de aula da escola estadual que funciona dentro Dênio Moreira há oportunidades para todos. Há um preso de 56 anos aprendendo a ler e jovens cursando a graduação em Administração de Empresas. A diretora da escola, Lila Martins, tem 49 anos de idade, dos quais 17 deles dedicados ao ensino dentro da penitenciária de Ipaba.

“A minha tarefa é conscientizá-los da importância do aprendizado. A escola pode ser linda, toda pintada e organizada, mas se não tiver o interesse do aluno e um bom projeto pedagógico, de nada adianta. Preocupo-me com a qualidade do ensino. Tenho muito orgulho do meu trabalho. Tenho ex-aluno que foi aprovado em concurso público e que aprendeu a ler aqui dentro”, conta a pedagoga.

Os alunos da Escola Estadual Dênio Moreira de Carvalho participam de diversos projetos educacionais, concursos de redação e olimpíadas escolares. Em 2015, alunos da quarta série receberam medalha de ouro e alunos da oitava série, de bronze, na Olimpíada Internacional Matemática Sem Fronteiras, realizada no mês de abril.

Grupo musical Vozes da Cela

Edmilson Alves Lanes, de 45 anos, está preso há sete. Ele é o único remanescente da formação original do grupo Vozes da Cela, formado em 2012. De lá pra cá, muitos presos passaram pela banda de música gospel. Os ensaios acontecem às quartas-feiras e duram três horas. No repertório da banda há músicas de autoria dos próprios integrantes que trabalham cuidadosamente nos arranjos.

“A gente não faz barulho. Quem entende sabe que fazemos música de verdade. A harmonia é bem feita”, orgulha-se Edmilson, vocalista do grupo. Ele lembra que o Vozes da Cela começou com um solitário violão e muita vontade. Hoje, o grupo atua com vários instrumentos e é reconhecido na região, graças a apresentações em igrejas, escolas, universidades, em audiências públicas e outros eventos públicos além dos muros da penitenciária.

Casado há trinta anos, com seis filhos e nove netos, Edmilson diz que se emociona toda vez que sobe ao palco. A família já assistiu várias vezes às apresentações e isso, segundo o preso, contribuiu em muito para suportar em paz os sete anos de encarceramento.

Humanizar a pena é o segredo do sucesso

“Quando o preso chega aqui, geralmente ele vem de um ambiente de briga e discussão. Se ele vier com bomba e a gente retrucar com bomba, teremos uma guerra. Aqui a gente trabalha oferecendo oportunidades. Se der errado, a gente tenta de novo. A regra é nunca desistir do preso”, explica o agente penitenciário Arlan Gomes Ferreira, que trabalha na unidade há um ano e meio.

Para Adão dos Anjos o ambiente saudável dentro da unidade é possível graças à atenção ofertada ao preso. Tratar o preso com dignidade, independentemente do crime que ele cometeu, faz com que todos se sintam respeitados. E, neste caso, a recíproca é verdadeira. (Agência Minas)

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