Deputado estadual e secretário municipal de Governador Valadares têm bens bloqueados, afirma MPF

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Objetivo é garantir ressarcimento ao erário de verbas desviadas do Ministério do Turismo. Bloqueio também atingiu bens de ex-prefeito, de empresas envolvidas e de seus proprietários.

O Ministério Público Federal (MPF) obteve decisão que decretou a indisponibilidade de bens do deputado estadual João Lúcio Magalhães Bifano, assim como de outras seis pessoas [físicas e jurídicas], entre elas, o ex-prefeito do município de São Geraldo do Baixio, Wellerson Valério Moreira.

Também tiveram bens bloqueados as empresas Frederico Dias Falci-ME e Washington Nascimento-ME (anteriormente denominada WM Produções e Eventos Ltda-ME) e os empresários Frederico Dias Falci, Michael Alex Moreira e Lindomar Antunes de Assis.

Michael Moreira é irmão do ex-prefeito de São Geraldo do Baixio e embora não conste oficialmente como dono da empresa Washington Nascimento-ME, era quem de fato a administrava, ao lado de Lindomar Antunes.

O valor bloqueado foi de R$ 481.200,00, que corresponde ao total de recursos públicos federais desviados acrescidos de multa no triplo do valor principal.

Segundo a liminar concedida pela Justiça Federal em Governador Valadares/MG, a medida visa “preservar a existência de patrimônio suficiente para garantir a eficácia de eventual sentença condenatória”.

Os fatos aconteceram em 2009, quando o Município de São Geraldo do Baixio, na região Leste do Estado de Minas Gerais, firmou convênio com o Ministério do Turismo, no valor de 200 mil reais, para realização de um evento festivo, a XIX Corrida de Cavalos.

A ação relata que parte da verba foi utilizada para a contratação de artistas previamente escolhidos pelo ex-prefeito e pelo então deputado federal João Magalhães, autor da emenda parlamentar que destinou os recursos ao município. A contratação se deu por intermédio da empresa Washington Nascimento-ME que, para isso, apresentou as chamadas “cartas de exclusividade” dos artistas.

Essas cartas são uma característica intrínseca ao esquema de corrupção que envolveu parlamentares federais, prefeitos e empresários para desvio de verbas do Ministério do Turismo destinadas à realização de eventos festivos em municípios brasileiros.

Na verdade, conforme explica o MPF, o modo de operação dessa fraude seguiu o mesmo roteiro de outros esquemas que utilizaram recursos oriundos de emendas parlamentares, como os apurados na área da saúde (“Sanguessugas”) e na área de engenharia (“João de Barro”): realização de licitações fraudadas para direcionar a contratação de empresas previamente escolhidas e superfaturamento.

Números apurados pela Controladoria-Geral da União (CGU) indicam ter havido, a partir de 2007, verdadeira migração das fraudes para o Ministério do Turismo. Assim é que, se naquele ano, haviam sido destinadas pouco mais de 70 milhões de reais em emendas parlamentares para o MinTur, em 2008 esse valor foi quatro vezes maior (R$ 279.655.000,00), chegando a mais de R$ 430 milhões em 2009.

Para o MPF, “é possível afirmar que João Lúcio Magalhães Bifano foi o grande mentor do funcionamento do esquema – que foi utilizado dezenas de vezes nos municípios do leste mineiro e do Vale do Mucuri -, e cuidou disso direta e pessoalmente de sua execução, bem como dele se beneficiou, direta e indiretamente”, e essa conclusão não decorre de “mera ilação, mas de provas contundentes que lastrearam a Ação Civil por Ato de Improbidade Administrativa n. 8934-66.2012.4.01.3813”, atualmente em trâmite perante a Justiça Federal em Governador Valadares.

Em 2008, ano que pode ser considerado o ápice de sucesso do esquema, João Magalhães destinou quase 100% de suas emendas parlamentares à realização de eventos festivos pelo Ministério do Turismo. Foram R$ 7.890.000,00 de um total de 8 milhões de reais. Quando o esquema foi descoberto, a quantia foi decrescendo até chegar a zero em 2012, quando não houve absolutamente nenhuma emenda para tal finalidade.

“Ora, é incomum que um deputado federal que poucos anos antes não destinara nenhuma verba à realização de eventos pelo Ministério do Turismo passe, repentinamente, a destinar praticamente todas as suas emendas parlamentares a esse fim. É igualmente incomum que, passados poucos anos desde essa curiosa conduta, tenha ele retornado ao status quo ante e não tenha destinado nenhuma verba a esse fim”, afirma o MPF.

O município de São Geraldo do Baixio realizou três eventos custeados com recursos oriundos do Ministério do Turismo entre os anos de 2008 e 2009. Todos os repasses decorreram de emendas individuais realizadas pelo então Deputado Federal João Magalhães.

Superfaturamento

No esquema das festas, os Planos de Trabalho apresentados pelos municípios para recebimento de recursos previam a realização de duas atividades distintas: contratação de artistas e montagem da estrutura e logística do evento. No primeiro caso, as prefeituras realizavam um procedimento de inexigibilidade de licitação, sob o argumento de que os artistas que desejavam contratar eram exclusivos de determinada empresa. Para a montagem da infraestrutura da festa, era realizado procedimento licitatório, que, na verdade, constituía outra frente de desvios, já que as licitações eram simuladas, com a participação de empresas fantasmas, constituídas em nome de “laranjas”, apenas para dar ares de legalidade ao procedimento.

Em São Geraldo do Baixio/MG, a licitação para contratação da empresa que deveria divulgar e montar a estrutura do evento (palco, sonorização, iluminação, etc.) simulou a participação de três concorrentes: Mega Show Estruturas Ltda, WM Produções e Eventos e Frederico Dias Falci-ME. Esta última sagrou-se vencedora.

De acordo com a ação, dos R$ 56.400 pagos pela prefeitura à Frederico Dias Falci-ME, pelo menos R$ 37.800 foram desviados. Isso porque esse valor correspondia ao pagamento pelos serviços de divulgação na mídia, o que não foi realizado, já que o ex-prefeito jamais conseguiu comprovar sua realização na prestação de contas encaminhada ao Ministério do Turismo.

As irregularidades persistiram na contratação dos artistas. As tais cartas de exclusividade eram firmadas somente para os dias do evento. Ou seja, a empresa que se intitulava “empresária exclusiva” dos artistas atuava, na verdade, como intermediária entre a prefeitura e os verdadeiros empresários ou os próprios artistas. “Obviamente, o valor que a empresa integrante do esquema recebia do município era superior àquele posteriormente repassado ao artista contratado”, relata a ação.

Certo é que a própria seleção dos artistas se dava com aqueles com quem já havia uma negociação prévia, por meio da qual se assegurava que, caso o evento fosse de fato realizado, eles forneceriam a tal carta de exclusividade. Essas cartas garantiam que a empresa escolhida, e só ela, pudesse participar do esquema.

O Plano de Trabalho apresentado pelos municípios para recebimento da verba, por sua vez, indicava valores de cachê muito superiores aos valores efetivamente cobrados pelos artistas, o que possibilitava a apropriação da diferença pelos envolvidos no esquema.

Em São Geraldo do Baixio/MG, a empresa contratada – Washington Nascimento (antes, WM Produções e Eventos Ltda) – não é e nunca foi empresária exclusiva dos artistas Rio Negro e Solimões, Banda Forró Só Paulada, Banda Axé Mondo e Banda Rasta Chinela, que se apresentaram durante a festa. A dupla Rio Negro e Solimões, que afirmou jamais ter sido contratada por tal empresa, recebeu em torno de R$ 80 mil, enquanto a nota apresentada pela WM dizia R$ 135 mil.

Empresa de fachada

Na verdade, segundo o MPF, a WM Produções e Eventos Ltda é uma empresa de fachada, originalmente constituída em nome dos “laranjas” Washington Nascimento e Amarildo Gonçalves dos Reis. Em maio de 2011, Amarildo deixou a empresa, que passou a adotar o nome empresarial Washington Nascimento-ME.

Investigações conduzidas pela Receita Federal apontaram que somente no ano de 2009 a WM Produções movimentou mais de 1,2 milhão de reais, “sendo que a empresa parecia não existir de fato, pela inexistência de bens em seu nome”.

Apurou-se também que os sócios que figuram no contrato social não se conheciam e o endereço fornecido como sede da empresa era, na verdade, a residência do pai de Washington.

Por fim, o MPF apurou que os reais gestores e proprietários da WM Produções e Eventos eram Lindomar Antunes de Assis e Michael Alex Moreira, irmão do ex-prefeito de São Geraldo do Baixio/MG.

Segundo a ação, Michael seria o administrador de fato de várias outras empresas de fachada utilizadas nas fraudes envolvendo verbas oriundas do Ministério do Turismo, todas elas constituídas com o “intuito de fraudar licitações e desviar recursos públicos federais. (…) “Michael se utilizava das empresa Equipe Batidão Bruto Rodeo Festival Ltda, Destak Eventos Ltda, A.C.O. Silva -ME e Frederico Dias Falci-ME”.

Embora fosse sócio formal apenas da Equipe Batidão, há evidências de que ele era o verdadeiro representante da Destak e da A.C.O. Silva, utilizando-se da Frederico Dias Falci-ME para fraudar licitações.

Em pelo menos nove convênios firmados entre municípios da região e o Ministério do Turismo para realização de festas, os procedimentos licitatórios contaram com a participação dessas empresas.

Secretário municipal de Valadares também tem bens bloqueados

Um deles é o convênio nº 370/2010, celebrado entre o MinTur e a Associação Comercial e Empresarial de Governador Valadares/MG para realização da “II Etapa de Eventos Esportivos – Valadares Paragliding Open 2010”.

Para executar o convênio, no valor de 200 mil reais, a Associação Comercial realizou 11 processos administrativos, sendo nove inexibilidades de licitação para contratação de artistas e duas licitações, na modalidade convite, para contratação da empresa que ficaria responsável pela montagem da estrutura do evento.

À época, o ex-presidente da associação era Edmilson Soares dos Santos, atual secretário municipal de Desenvolvimento de Governador Valadares/MG.

Em conluio com os empresários Edmar Malaquias da Silva (suposto proprietário da Destak Eventos Ltda) e Michael Alex Moreira, ele inseriu nos planos de trabalho artistas previamente combinados, com indicação de cachês em valores superfaturados. Desde a celebração do convênio, também já se sabia que a contratação dos artistas caberia à Destak Eventos Ltda, já que somente essa empresa detinha cartas de exclusividade dos artistas relacionados no Plano de Trabalho para eventos naqueles dias e naquela cidade. Por sinal, os contratos com os artistas foram firmados 11 dias antes da proposta enviada ao Ministério do Turismo e um mês antes da própria celebração do convênio, o que, para o MPF, indica que a Destak Eventos já tinha certeza de que seria a empresa contratada.

Outro fato que chamou a atenção foi o de que todos os procedimentos administrativos, entre a autuação do processo de inexigibilidade até a requisição de contratação dos artistas, duraram menos de 24 horas, tempo demasiado rápido, o que indica não só a existência de prévio acerto entre os acusados, mas também que tais procedimentos tenham sido montados.

Outra irregularidade é que a Destak Eventos foi contratada sem a devida formalização, indicando ter havido uma contratação verbal, o que afronta a Lei 8.666/93.

Na verdade, a empresa, que foi criada apenas quatro meses antes do contrato, tinha por sócio-formal Edmar Malaquias, que, durante as investigações, admitiu que foi Michael Alex quem intermediou a contratação das bandas, fato confirmado pelos próprios artistas em depoimento ao MPF.

A Destak também foi a empresa contratada para organizar a logística do evento. Para simular a realização dos obrigatórios procedimentos de licitação, a Associação Comercial e Empresarial convidou outras duas empresas, a Mega Show Estruturas Ltda e a Frederico Dias Falci-ME, ambas recorrentes em casos envolvendo fraudes relacionadas à realização de eventos.

Segundo a ação, a Destak “foi criada para fraudar e desviar o dinheiro público recebido através do Convênio 0370/2008”. Tanto é assim que, apesar de firmar contrato com os artistas no valor total de R$ 159 mil, as notas fiscais apresentadas à associação comercial foram de R$ 172 mil, embora, na verdade, os valores efetivamente pagos aos artistas tenham sido ainda menores do que os previstos em contrato, conforme apurou o MPF durante as investigações.

Na execução dos contratos de montagem da estrutura do evento, também houve superfaturamento. Por exemplo, o Plano de Trabalho e correspondentes orçamentos que o embasaram previa a instalação de cinco tendas, mas só foram contratadas duas, pelo mesmo valor. Para piorar, a nota fiscal sequer chegou a especificar o quantitativo realmente fornecido, o que impossibilitou a fiscalização pelos órgãos de controle.

O Ministério do Turismo reprovou integralmente as contas prestadas pela associação, quantificando um prejuízo ao erário de R$ 314.066,20 em valores de 2013.

Também nessa ação, foi decretada indisponibilidade de bens de todos os oito acusados: Edmilson Soares dos Santos, Michael Alex Moreira, Edmar Malaquias da Silva, Frederico Dias Falci e Miller Kalil Lana Sirio, além das empresas Destak Eventos Ltda, Frederico Dias Falci-ME e Mega Show Estruturas Ltda-ME.

O valor bloqueado, nessa ação, alcançou a cifra de R$ 864.479,08.

(Fonte: Ministério Público Federal em Minas Gerais)

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