Fernão Dias Pais e dezenas de homens de sua tropa, entre eles o genro, Manuel Borba Gato, desbravaram parte das terras que hoje formam o Vale do Jequitinhonha, uma das regiões mais carentes do país, atrás de uma serra resplandecente de esmeraldas, a Sabarabuçu, e de uma lagoa cheia do mesmo tesouro, a Vupabuçu. Corria os anos de 1680 e 1681. A bandeira se aventurou na área da Serra Fria, hoje cidade do Serro, e garimpou, sem sucesso, outras pedras preciosas em leitos da região. Quase três séculos e meio depois, o garimpo ainda é o ofício principal de muitos cabras daquelas bandas.
Há grupos que procuraram pepitas no fundo de rios, como o Rio Jequitinhonha, sem se preocupar com o meio ambiente. Derramam produtos químicos no leito e tampam a vegetação ciliar com areia retirada. Mas um garimpeiro, o qual acredita ser o único no Brasil, ganha a vida de forma interessante. Belmiro Luiz Nascimento, de 51 anos, transformou o “empreendimento” da família numa atividade turística. Apoiado por entidades como o Sebrae e o Instituto Estrada Real, ele mostra a grupos de visitantes como os garimpeiros retiravam diamantes da terra e do fundo d’água na época dos desbravadores.
Belmiro foi garimpeiro e hoje mostra a visitantes como eram retirados tesouros da terra, em Diamantina – Foto: Jair Amaral / Jornal Estado de Minas
O turismo herdado dos bandeirantes é o tema da terceira reportagem da série A origem das Minas Gerais, que o EM começou a publicar na segunda-feira em razão dos 340 anos da coluna liderada por Fernão Dias. A expedição deixou a Vila de Piratininga, em 1674, à procura de esmeraldas. Adentrou no inóspito sertão que hoje forma o estado de Minas Gerais e, durante a jornada de sete anos, fundou povoados e abriu picadas. Sem saber, Dias e seus homens começavam a formar a Capitania de Minas Gerais.
O Vale do Jequitinhonha, embora seja uma área carente, contribuiu para manter a regalia da coroa portuguesa na época do Brasil colônia. De Diamantina e do Serro, saíram muitas pedras de diamantes. O garimpo da família de Belmiro tem cerca de 200 anos. Fica às margens do Ribeirão do Guinda, na área rural de Diamantina. O local é bem preservado e não há agressão ao meio ambiente: tanto o leito do ribeirão quanto a mata no entorno são preservados pelo homem, que cobra R$ 30 de cada visitante.
Assista o vídeo do garimpo em Diamantina que é aberto ao público
“Mas é claro que se vier um grupo maior ou crianças pequenas, a gente conversa sobre o preço. O passeio dura, em média, duas horas”, conta Belmiro. Ele mostra aos clientes todas as etapas de extração de diamantes e, no fim, reserva uma surpresa: um deles terá a chance de encontrar uma pequena pepita de diamante no meio do punhado de cascalho. “Não existe (com exceção desse) um garimpo artesanal que seja visitado”, disse Luciana Teixeira Silva, analista do Sebrae na região de Diamantina.
O passeio no garimpo de Belmiro faz parte de um projeto de turismo na região, ajudando a movimentar hotéis e restaurantes. A bandeira de Fernão Dias não fundou o arraial do Tejuco, primeiro nome da atual Diamantina, mas percorreu a região da Serra Fria, hoje Serro, de onde o município que também forneceu diamantes para Portugal fora distrito. O turismo, hoje, é um dos carros-chefes da economia local, a exemplo de localidades fundadas pela coluna do governador de esmeraldas.
Igrejas, chafarizes e casarões levaram Luiz, Simone e o filho Pedro, a conhecer Sabará – Foto: Jair Amaral / Jornal Estado de Minas
Em Sabará, na Grande Belo Horizonte, comerciantes faturam com as famílias que vão à cidade histórica conhecer igrejas antigas, ruas de calçamento de pedras, becos, chafarizes e os casarios coloniais. O odontólogo Luiz Corsi levou a esposa, a fonaudióloga Simone, e o filho, Pedro, para conhecer um pouco mais da história e da culinária do lugar. “A costelinha de porco com ora-pro-nobis é uma delícia”, aprovou Simone. O marido endossou o gosto da mulher e ressaltou os cartões-postais do município: “A igrejinha de Nossa Senhora do Ó (erguida em 1717) é um charme”.
Artesanato
As miniaturas da capela, de estilo barroco e com influência chinesa na arquitetura e na decoração interna, estão entre as campeãs de vendas nas lojas de artesanato. “As peças que mais saem são as miniaturas da Igrejinha do Ó e do Chafariz do Kaquende. São da época dos bandeirantes”, informou a artesã Márcia Regina Vieira. Ela também lucra com os terços que faz com sementes da planta conhecida por Lágrimas de Nossa Senhora: “Cada um custa R$ 15”.
Lucas e Silvane abriram restaurante em Piedade de Paraopeba, lugarejo fundado pela bandeira – Foto: Jair Amaral / Jornal Estado de Minas
O livro de assinaturas dos visitantes que passam pela associação de artesãos, onde Márcia exibe seu trabalho, mostra que muitos paulistas visitaram a cidade nos últimos meses, a exemplo da família do odontólogo Luiz Corsi. Ele, a esposa e o filho moram em Sorocaba, no interior de São Paulo, estado de onde a coluna de Fernão Dias partiu para procurar esmeraldas em terras que hoje formam Minas Gerais. Depois de cruzar a região que hoje é o Sul de Minas, a bandeira chegou ao Rio das Velhas, onde fundou Roça Grande, berço de Sabará.
Uma imagem de Dias se destaca na entrada da cidade. O turismo também ajuda a movimentar a economia em Piedade do Paraopeba, o segundo lugarejo fundado pela bandeira – o primeiro foi Ibituruna, no Sul do estado – e que hoje é distrito de Brumadinho, na Grande Belo Horizonte. O casal Lucas Nascimento, de 33, e Silvane Aguiar, de 37, se mudaram para lá no início do ano e abriram o restaurante e choperia Jeito Mineiro. “Queríamos ‘fugir’ de Belo Horizonte e viemos para cá. Estudamos as oportunidades de comércio e abrimos o empreendimento. Temos três colaboradores e, no terceiro mês em atividade, calculo que o movimento cresceu 40% em relação ao primeiro”, acredita Lucas.
(Fonte: Jornal Estado de Minas)