Siderúrgica em Ipatinga terá que pagar tratamento de saúde para expostos ao amianto

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A Justiça do Trabalho determinou que uma siderúrgica, com parque industrial situado no município de Ipatinga, realize o tratamento de saúde para seus trabalhadores atuais e ex-empregados, além dos familiares deles que estiveram expostos à fibra mineral asbesto (conhecido comercialmente como amianto). A empresa terá que pagar, ainda, uma indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 200 mil. A decisão é do juiz Jedson Marcos dos Santos Miranda, na 1ª Vara do Trabalho de Coronel Fabriciano, diante de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em face da empresa.

Na ação, o órgão ministerial alegou que os trabalhadores da siderúrgica prestaram serviços em contato com o amianto na confecção, transporte e instalação do material denominado anel/colchão de vedação, nas bases e nos abafadores dos fornos de recozimento localizados na unidade de Ipatinga. Segundo o MPT, “eles se expunham, direta e habitualmente, à fibra de amianto em suas atividades laborais sem a devida proteção”.

Tanto a fixação, quanto a remoção dos anéis/colchões de vedação eram realizadas manualmente. De acordo com o órgão, essas operações perduraram durante anos, sendo que a existência de resíduos nos anéis de vedação, recolhidos em caçambas abertas, foi registrada por Oficial de Justiça Avaliador Federal em sua diligência realizada em 7 de agosto de 2012.

Além disso, o MPT alegou que, após a jornada de trabalho, os empregados retornavam para casa usando o uniforme utilizado no trabalho. “Essas roupas eram lavadas em casa por eles mesmos ou por suas esposas, companheiras ou mães, todos submetidos à exposição das fibras de asbesto impregnadas nos uniformes”. Segundo o MPT, a empregadora também não promoveu, durante todo o período de utilização do asbesto, os exames médicos necessários para os trabalhadores expostos ao amianto, entre os quais se destacam a telerradiografia de tórax e prova de função pulmonar.

Defesa

Já a empresa argumentou, em sua defesa, que não fabricava ou comercializava amianto, pois apenas adquiria o produto pronto, via empresa especializada. Segundo a siderúrgica, o produto somente seria capaz de causar danos aos trabalhadores em caso de extração e transformação das fibras, quando há liberação de poeira, “o que não é o caso”.

A empregadora alegou que os equipamentos que utilizavam o produto foram desativados, com o devido recolhimento das sobras desses produtos. Além disso, o local da diligência foi também desativado. Por último, a siderúrgica alegou que “não havendo comprovação de labor, com exposição a níveis superiores aos recomendados pela NR-15, não se pode falar em pagamento do adicional de insalubridade, danos morais coletivos, pagamento de exames, e retificação do PPP”.

Decisão

Ao decidir o caso, o juiz reconheceu que “não existe dúvida de que o amianto é um mineral lesivo à saúde”. Seguindo o critério 203 da Organização Mundial da Saúde (OMS), o julgador ressaltou que a exposição ao produto aumenta o risco de câncer de pulmão, mesotelioma e asbestose, sendo que não há limite seguro para exposição.

Na visão do julgador, a empregadora sequer cumpriu as determinações impostas pela NR-15, anexo 12, e a Lei nº 9.055/95, então vigentes à época, cuja observância era obrigatória, uma vez que tais normas não se limitavam às empresas extrativistas ou que manipulavam a matéria-prima. Segundo o juiz, não cabe à ré simplesmente decidir se deveria ou não cumprir tais normas, conforme a sua interpretação.

“Aliás, diante da clareza solar das normas, não deveria ter dúvida quanto ao seu alcance, pois ao se utilizar do amianto em seu processo produtivo, tornava-se sujeito passivo da obrigação legal. No mínimo, caso tivesse alguma dúvida, deveria ter buscado nos órgãos governamentais ou mesmo judicialmente a certeza jurídica quanto à sua posição diante das normas que tratam da matéria, o que sequer foi feito”, ressaltou o magistrado.

Para o juiz, simplesmente ignorar a norma e suas exigências, sabendo dos malefícios que o amianto é capaz de causar à saúde, é agir com dolo eventual, assumindo os riscos do resultado. “Aliás, ainda que se admita que a conduta empresarial foi omissa, tal omissão é substancial, pois relevante para o resultado danoso, culminando na ofensa aos direitos da personalidade dos trabalhadores, sua categoria e da comunidade. Porquanto, atingiu a honra e a moral, inclusive coletiva”, pontuou o magistrado na sentença, reforçando que, pelo conjunto probatório, a empresa ré não cumpriu várias regras a que estava obrigada.

Exemplificando, o julgador destacou que a empresa não provou que, pelo fato de manipular e utilizar materiais contendo amianto, tenha enviado, anualmente, ao Sistema Único de Saúde e aos sindicatos representativos dos trabalhadores uma listagem dos seus empregados, com indicação de setor, função, cargo, data de nascimento, de admissão e de avaliação médica periódica, acompanhada do diagnóstico resultante. A empresa não mostrou também que providenciava a troca de vestimenta de trabalho, no mínimo, duas vezes por semana, conforme exigido pelo item 14.2 do anexo 12 da NR-15. Tampouco que disponibilizava o chamado “vestiário duplo” para os trabalhadores expostos ao asbesto, conforme preconizado no item 15 do anexo 12 da NR-15.

Segundo o julgador, a empresa também não demonstrou que, durante a realização do trabalho, tenha adotado a prática de eliminação dos resíduos que contivessem asbesto, de maneira que não se produzisse nenhum risco à saúde dos trabalhadores e da população em geral. O juiz destacou que só há nos autos prova de que a siderúrgica procedeu à substituição do amianto pela aramida, em 2007, tendo providenciado a retirada dos resíduos de forma gradual.

Mas, de acordo com o julgador, em 2012, o oficial de justiça, cumprindo diligência determinada nos autos do processo em trâmite perante a Justiça Federal comum, encontrou, na área de recozimento, em uma caçamba, restos de placas de amianto. Material com composição confirmada pelo laudo posteriormente produzido pela Polícia Federal.

Assim, no entendimento do julgador, a demandada demonstrou novamente o seu desprezo pelo cumprimento da vasta legislação sobre a necessidade de se eliminar o uso do amianto da sua cadeia produtiva. “Isso em total descompasso com a função socioambiental da empresa, ao ser encontrado em suas dependências resto do asbesto, quase cinco anos após o início da retirada dos resíduos”.

Para o juiz, a conduta negligente, omissa e dolosa da ré expôs a risco, inclusive, os familiares diretos, que residiam, à época, com os trabalhadores, já que estes levavam seus jalecos e uniformes para serem lavados em casa, expondo toda a família ao contato com as fibras de amianto. Além disso, na visão do julgador, a pretensão do MPT de custeio de tratamento de saúde dos trabalhadores e familiares não depende da prova de que tais pessoas estejam doentes. “Há de se recordar que a doença, causada pela exposição mencionada, é lenta, silenciosa e pode durar vários anos para se manifestar”, disse.

Obrigações

Assim, diante desse contexto, a decisão condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais coletivos de R$ 200 mil e, ainda, a uma série de obrigações, ratificando aquelas já determinadas na tutela de urgência antes concedida.

Entre elas está a obrigação de providenciar o custeio de eventual tratamento de saúde e, se for o caso, assunção do custeio de tratamento de saúde já em curso a todos os empregados e ex-empregados que prestaram serviços em setores em que havia manipulação de asbesto. A condenação inclui também o tratamento de todos os familiares dos empregados e ex-empregados que residiam com o trabalhador na época em que prestou serviços em setores com a manipulação do produto.

A empresa terá que providenciar exames médicos periódicos para todos os atuais e ex-empregados que estiveram expostos ao asbesto durante os últimos 30 anos. E promover a elaboração do plano de trabalho previsto no item 8 do Anexo 12 da NR-15, Portaria 3214/78, do então MTE, para as hipóteses de remoção do amianto.

Na decisão de embargos de declaração, o julgador acrescentou que, em relação à entrega dos PPP’s, o procedimento a ser adotado deverá ser idêntico àquele destinado ao cumprimento da realização de exames médicos. Em outras palavras, cabe à empresa notificar    os    trabalhadores    nos    endereços residenciais, conforme cadastro interno ou outro que lhe seja disponibilizado,  bem  como  via publicação  de  editais  a  serem  afixados  em  suas dependências  internas,  especialmente  nos  locais  de maior  acesso,  como  restaurantes,  oficinas  e  pontos de ônibus, e no sindicato profissional.

O magistrado acrescentou que a multa fixada somente será devida em caso de não notificação ou não entrega  dos  PPP’s  retificados  por  culpa  da  ré,  no prazo   determinado.   A   ausência   espontânea   do trabalhador ou ex-trabalhador, notificado, afasta a incidência da multa. Por unanimidade, os julgadores da Quarta Turma do TRT mineiro mantiveram integralmente a sentença.

Processo:

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