Projeto desenvolvido no programa de intercâmbio Brafitec abriu as portas do país para Yara Hermisdorff.
Dona de um sorriso largo e franco, Yara da Costa Hermisdorff é uma menina, de apenas 23 anos, com uma trajetória profissional de sucesso já em andamento. Yara concluiu em dezembro passado o bacharelado em Ciência e Tecnologia na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e está contratada desde 1º de janeiro deste ano pela empresa Schneider Eletric, num acordo para doutorado pelo dispositivo Cifre – Convention Industrielle de Formation par la Recherche, administrado pela Association Nationale Recherche Technologie (ANRT), órgão do governo francês equivalente ao CNPq no Brasil.
A história de Yara é emocionante e inspiradora. Quando criança, cursou todo o Ensino Fundamental na Escola Municipal Maria Cândida de Jesus, em Juatuba, cidade localizada na região metropolitana de Belo Horizonte/MG, com aproximadamente 25.000 habitantes. Sem acesso à internet e morando em rua sem pavimentação e sem saneamento básico, ela se divertia e ocupava todas as suas tardes dando aulas particulares. Cobrando menos de R$ 1,00 por hora de aula, aproveitava a situação para aprender, ao estudar as matérias junto com alunos que pertenciam à rede particular de ensino ou ajudando aos interessados em cargos de nível fundamental a ingressarem nas várias empresas da região.
Em 2009, a realidade mudou um pouco quando conseguiu uma bolsa para cursar o Ensino Médio na Cooperativa Educacional Nossa Senhora de Fátima, em Mateus Leme, a 20 Km de distância. O dinheiro que conseguia com as aulas particulares ajudava a pagar o transporte até a escola.
Em 2012, ingressou no curso de bacharelado em Ciência e Tecnologia da UFVJM, após cursar o início do curso de licenciatura em Química, na mesma instituição. “Já no primeiro período eu tinha certeza de que uma experiência fora do país poderia impulsionar tanto o meu lado profissional quanto o pessoal. Busquei, assim, me capacitar para conseguir essa oportunidade”, conta Yara.
Na escola de idiomas na qual cursou Inglês, exercia a função de trainee teacher. Em troca, ganhava a gratuidade das mensalidades. Outra estratégia utilizada para potencializar o aprendizado foi atuar como revisora de gramática inglesa de artigos científicos submetidos a uma revista de Veterinária.
Na graduação, participou durante dois anos e meio da Avanço Projetos e Consultoria, empresa júnior de Engenharia e Ciência e Tecnologia da UFVJM, como diretora de Recursos Humanos. “Essa experiência, sob a direção do professor Gustavo Molina, do curso de Engenharia de Alimentos, rendeu-me vários frutos. Tornei-me mais proativa e responsável e posso afirmar com toda certeza que ser introduzida nesse meio com as mesmas dificuldades e desafios de uma empresa, porém em uma menor escala, é uma grande vantagem. Acredito que buscar aplicar os conhecimentos adquiridos nas salas de aula e aprender a lidar com os diferentes tipos de pessoas tenham uma grande importância no futuro dos alunos participantes”, declara Yara.
Além de toda essa dedicação e investimento no aprendizado, Yara atribui à união da sua família e fé em Deus a razão para o seu sucesso. Segundo ela, seus pais sempre ensinaram sobre buscar a realização dos sonhos sem medo e nunca desistir. É por isso que Ísis da Costa Hermisdorff, única irmã, está cursando, com bolsa, doutorado em Zootecnia na Universidade Federal da Bahia, complementando a formação adquirida na graduação em Zootecnia também na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.
Para Yara, sua história deve motivar outros estudantes. Ao enfatizar o desejo de demonstrar para os outros como é possível alçar voos fora da fronteira dos muros da academia, ela ressalta como essencial acreditar no próprio potencial e no potencial da UFVJM.
Esse seu cuidado em motivar já havia sido demonstrado quando foi notícia no site da Diretoria de Relações Internacionais da UFVJM com uma entrevista que concedeu à universidade francesa École Supérieure de Chimie Physique Électronique de Lyon, França, sobre sua experiência no exterior, no início do intercâmbio Brasil France Ingénieur Technologie – Brafitec, em dezembro de 2016. Yara terminou sua entrevista com um conselho ao estudante que visa esse tipo de oportunidade: “estar aberto a todas as oportunidades que se apresentam e aceitar os desafios sem medo”.
E a se considerar as suas conquistas, essa receita da filha de Washington Eduardo Hermisdorff e Silvana da Costa Hermisdorff dá certo mesmo. Recentemente Yara foi contemplada com um tipo de visto chamado de “passeport talent“, uma iniciativa da França que facilita a entrada e permanência no país de qualquer pessoa com “talentos excepcionais” em áreas de tecnologia e criação.
A embaixadora júnior Yara da Costa Hermisdorff registra presença em um dos encontros do Programme Jeunes Ambassadeurs, em Lyon (Foto: Divulgação/UFVJM)
O intercâmbio
Yara Hermisdorff ficou sabendo em 2015 sobre o programa de intercâmbio Brafitec, uma cooperação entre o Brasil e a França que consiste em projetos conjuntos de pesquisa em parcerias universitárias em todas as especialidades de Engenharia, exclusivamente em nível de graduação, para fomentar o intercâmbio em ambos os países. Desde então começou a estudar a língua francesa em livros e cursos on-line. “Em agosto de 2016, após vários obstáculos relacionados ao problema no corte das bolsas, eu consegui uma e embarquei certa de que aquela era a oportunidade da minha vida”.
Aceita pela Ecole Supérieure de Chimie Physique Electronique de Lyon (CPE Lyon), Yara cursou lá o último ano do curso de Engenharia Química, estando no final do terceiro ano do bacharelado em Ciência e Tecnologia na UFVJM. Chamado de Master 2, esse último ano acadêmico é dividido em 6 meses de disciplinas e 6 meses de estágio em indústria. As disciplinas cursadas tinham como foco o estudo dos processos químicos e a busca da otimização deles através da aplicação da regulamentação europeia atual.
Nesse mesmo semestre foi selecionada para fazer parte de um programa da Câmara de Comércio e Indústria de Lyon e tornou-se embaixadora júnior. O objetivo do programa era o desenvolvimento de um projeto capaz de fazer a aproximação entre a região Auvergne-Rhône Alpes na França e o Brasil. Para isso cada estudante estrangeiro selecionado contou com a ajuda de um empresário da região, um coach. “No meu caso eu contei com a ajuda da Madame Florence Foare, empresária da área de marketing e comunicação na Elycoop e também da professora Arlete Barbosa dos Reis, do curso de Engenharia Química da UFVJM. Elaboramos um projeto que visa à elaboração de um novo sabão para lavar roupas embalado com um bioplástico solúvel em água fria”.
O segundo semestre do intercâmbio foi marcado por um estágio na empresa Schneider Electric, multinacional de origem francesa que atua nos âmbitos de controle, automação e distribuição elétrica em 190 países. Nesse estágio a estudante pertencia à Equipe de Materiais e Processos Avançados e tinha o objetivo de estudar novas formulações e processos para substituir os atuais isolantes elétricos utilizados pela empresa.
Esse estudo fez-se necessário porque os atuais componentes utilizados são suspeitos de causar alguns problemas de saúde aos empregados nas fábricas de produção. Os resultados obtidos ao fim do estágio foram promissores e lhe abriram as portas para a conquista de uma nova oportunidade, um doutorado Cifre.
O doutorado
O dispositivo Cifre é um acordo colaborativo entre uma empresa e um laboratório público. A empresa é responsável por estabelecer a missão, o projeto de estudo, e também por contratar o doutorando em um contrato de três anos. O laboratório, por sua vez, é responsável por fornecer o suporte acadêmico (incluindo a inscrição em uma escola doutoral) para a realização do trabalho.
Yara passou por um processo seletivo de três etapas, para aprovação junto à empresa Schneider Eletric, junto à universidade e por fim junto à Association Nationale Recherche Technologie (ANRT).
“Na empresa participei de uma série de entrevistas técnicas e análises do desempenho no período de estágio. Na Université de Reims Champagne-Ardenne passei por uma validação dos estudos técnicos, análise do nível de Inglês e Francês e análise de cartas de recomendação. Agradeço aos professores da UFVJM Rogério Melo, do curso de Engenharia Química, e Gustavo Molina pelas cartas”. A confirmação da conquista, no entanto, só veio após a aceitação da ANRT, que analisou tanto o caráter científico do trabalho, a sua pertinência, quanto o perfil e nível de estudos de Yara.
Contar uma história dá ao protagonista a oportunidade de perceber o caminho percorrido e estender o olhar a um horizonte que ele ainda não pode enxergar. “Olhando para trás consigo ver que somente hoje o meu percurso fez sentido. Acredito, assim, que o segredo para encontrar esse tal sentido é dizer sim a todas as oportunidades que aparecerem e dar sempre o seu melhor em todas elas”.
A UFVJM acredita que Yara irá colher mais que os resultados do importante projeto que está desenvolvendo, com impacto positivo sobre a saúde de milhares de pessoas, e orgulha-se de ser parte dessa história.
A Schneider Electric, empresa especialista global em gestão de energia, recebe a estudante Yara Hermisdorff para um contrato de doutorado Cifre por três anos (Foto: Divulgação/UFVJM)
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(Fonte: Dicom / UFVJM / Campus Mucuri)