Ministério Público Federal instaura procedimento para acompanhar baixo nível do Rio São Francisco

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Estiagem prolongada tem causado preocupação aos municípios que dependem do rio para sobreviver, em especial às populações ribeirinhas, ameaçadas com o desabastecimento de água

O Ministério Público Federal (MPF) em Sete Lagoas/MG instaurou procedimento para apurar e acompanhar a situação de crise decorrente do baixo nível do rio São Francisco na região do lago da Usina Hidrelétrica (UHE) de Três Marias e seus impactos para os municípios situados a jusante da represa, ou seja, nas regiões central e norte do estado.

O reservatório integra a bacia do São Francisco, que abrange sete Estados e 540 municípios, sendo 240 em Minas Gerais, os quais contribuem com 72% do volume de águas superficiais que vertem para o rio.

De acordo com o MPF, a estiagem este ano em Minas Gerais, muito acima da média histórica, vem acarretando severo comprometimento da vazão do São Francisco, com diminuição do volume hídrico do reservatório da UHE de Três Marias e redução progressiva da quantidade de água liberada pela represa.

Há impactos em várias atividades da região do lago, algumas delas essenciais para a população e para a economia locais, como a captação de água para abastecer núcleos urbanos, irrigação, indústria, circulação de balsas, atividades turísticas, geração de energia elétrica e aquicultura. Populações abaixo do lago também enfrentam grandes dificuldades: o município de Pirapora/MG chegou a ajuizar uma ação para garantir, durante dois meses, um nível de vazão mínimo vertendo da represa até que fosse implantado sistema de bombeamento para atender ao seu sistema de captação de água – a captação anterior era feita por gravidade, o que estava se tornando inviável por causa da redução do nível do rio.

Transparência

No curso das investigações, e já com o intuito de realizar um levantamento abrangente dos problemas causados pelo período de estiagem e seus impactos nas atividades econômicas e no abastecimento da região, bem como verificar a atuação dos diversos órgãos envolvidos no assunto, o MPF participou, no último dia 22, de reunião com o presidente da Centrais Elétricas de Minas Gerais (CEMIG), empresa responsável pela operação da hidrelétrica de Três Marias, com a presidente do Comitê de Bacia do Entorno da Represa de Três Marias (CBHSF4), prefeitos e outros representantes de municípios situados no entorno do lago.

“Além da obtenção de dados específicos sobre a situação de operação da usina, um dos focos do encontro foi demandar da CEMIG maior transparência nas informações aos municípios e ao público em geral sobre essa situação”, explica o procurador da República Antônio Arthur Barros Mendes, responsável pela apuração no MPF. Na ocasião, foi ajustado com a Cemig que ela passaria a inserir no seu site informações básicas em relação à situação operacional da UHE Três Marias.

O MPF também participou de outro evento em Três Marias/MG, no dia 29 de julho, que envolveu a CEMIG, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), prefeitos dos municípios do entorno e à jusante da represa, o Comitê de Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF) e membros das comunidades já afetadas. Dessa vez, além de novamente discutirem a situação atual, CEMIG e ONS apresentaram os cenários projetados para os próximos meses quanto ao reservatório e ao rio São Francisco.

Usos prioritários

As estimativas da CEMIG e ONS, com base em modelos matemáticos, são as de que será preciso reduzir a vazão hoje praticada na UHE Três Marias para garantir, no final do mês de outubro, com alguma segurança, a manutenção do fluxo de água a jusante – a chamada vazão defluente [água liberada pela represa].

As informações, no entanto, são as de que a Agência Nacional de Águas (ANA) ainda não adotou tal providência, em virtude da necessidade, sobretudo, de atendimento a demandas de importantes usuários, como o projeto Jaíba, situado na região Norte do estado, que precisa de grande volume de água para sustentar suas atividades.

Para o procurador da República, “neste momento de crise, o MPF atuará para garantir que as decisões dos órgãos de gestão dos recursos hídricos – em especial a ANA – tenham como norte a preservação dos usos prioritários da água previstos em lei, ou seja, o abastecimento humano e a dessedentação de animais. Em situações de drástica escassez de água, como a que a região está enfrentando, os conflitos de utilização da água são inevitáveis, mas devem ser arbitrados de forma a garantir, primeiramente, água para as pessoas e para os animais, ainda que haja impactos negativos para outras atividades.”

Como parte dos impactos ocorre em municípios situados abaixo da represa de Três Marias, a Procuradoria da República em Montes Claros/MG foi convidada a atuar no caso em conjunto com a unidade do MPF em Sete Lagoas.

Plano de contingências

Por sinal, os impasses e a necessidade de se definir uma atuação articulada para evitar que a região sofra consequências ainda mais danosas levaram o Ministério Público Federal a convocar outra reunião, desta vez a ser realizada na sede da ANA, em Brasília/DF, no próximo dia 19 de agosto, quando estarão presentes representantes dos principais órgãos envolvidos com a questão.

Entre os assuntos da pauta estão a situação atual e cenários projetados para o regime operacional especial implantado na UHE Três Marias, as perspectivas do quadro climático e a discussão sobre os patamares de vazões afluente e defluente estimadas, em especial, para até outubro e novembro, quando deverá começar o período chuvoso.

Também serão discutidos os riscos potenciais para os usuários da água do rio São Francisco que moram na região imediatamente a jusante da UHE Três Marias, dada a possibilidade, em cenário extremo, da inexistência de vazão defluente ou de redução a níveis mínimos que não atendam às necessidades prioritárias de uso.

“Como desde 2011 as precipitações na bacia do rio São Francisco estão abaixo da média e no período 2013/2014 está ocorrendo o pior resultado de chuvas das últimas décadas, o MPF também acentua a necessidade de que os órgãos responsáveis por gerenciar situações de calamidade pública estejam preparados para atuar caso haja agravamento da crise”, afirma o procurador da República.

Foi também convidado para a reunião o titular da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, órgão vinculado ao Ministério da Integração Nacional, que é responsável por atuar em situações de desastres como secas e inundações.

Estoques pesqueiros

O Ministério Público Federal foi provocado, ainda, a atuar quanto aos riscos a que estão sujeitos os estoques pesqueiros da região. É que, segundo a denúncia, devido ao baixo volume de águas do reservatório, os peixes ficam concentrados em águas rasas ou poços, ficando mais expostos à captura, inclusive matrizes que ainda não completaram o ciclo de reprodução.

Uma das primeiras medidas adotadas pelo MPF foi a de requisitar ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) a produção de relatório técnico para verificar-se em que medida a situação atual gera risco iminente para a manutenção da fauna do rio São Francisco, especialmente quanto ao futuro da população de peixes no lago e a jusante do rio. O MPF também pediu que o Ibama apontasse possíveis soluções, a cargo do Poder Público, para reduzir ou eliminar tais riscos.

Na resposta encaminhada nesta terça-feira, 12/08, o Ibama sugere, como medidas emergenciais, o fechamento temporário da pesca amadora e comercial e a implementação de um programa de fiscalização no trecho do rio, com ações continuadas de fiscalização e repressão durante todo o período em que venha a ser determinado o defeso, além de articulação com o órgão ambiental estadual para ações integradas. (MPF)

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