Causa do rompimento da Barragem de Fundão foi a liquefação, conclui PCMG

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A Polícia Civil de Minas Gerais concluiu, nesta terça-feira (23/2), o primeiro inquérito policial referente ao rompimento da Barragem de Fundão, pertencente à mineradora Samarco, ocorrido em 5 de novembro de 2015, em Mariana (MG). Diante de todas as provas levantadas, a corporação conclui o inquérito com o indiciamento de sete pessoas, sendo seis funcionários da Samarco e um da VOGBR. Além dos indiciamentos, a polícia também representou, junto à Justiça, pela prisão preventiva de todos os suspeitos.

A partir do rompimento da barragem, vários crimes foram consumados, entre delitos contra a vida, o meio ambiente, a incolumidade e a saúde pública. As comunidades que se encontram nas proximidades do local onde ocorreram os fatos ou próximas aos locais por onde os rejeitos se estenderam foram afetadas de diversas formas.

O rompimento da Barragem de Fundão liberou aproximadamente 34 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério no meio ambiente. Parte destes rejeitos foi depositada nos cursos d’água afetados, causando em muitos a interrupção do fornecimento de água potável, tendo em vista as altas concentrações de substâncias acima dos limites permitidos.

A ruptura, que, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, foi o maior desastre ambiental da história do país, destruiu o distrito de Bento Rodrigues, deixando 725 pessoas desabrigadas, 17 mortos confirmados e dois desaparecidos.

Todos os corpos e segmentos corpóreos de vítimas provenientes do desastre e que foram localizados pelas equipes de buscas (em uma extensão de 110km do local do rompimento) foram identificados e liberados para as famílias. Os laudos verificaram três diferentes causas de mortes: asfixia por soterramento, afogamento e politraumatismo.

Área afetada pelo rompimento de barragem – Foto: Divulgação / EBC

Inquéritos

O primeiro inquérito, instaurado pela Polícia Civil em 6 de novembro de 2015, apurou a autoria, materialidade, circunstâncias, causas, consequências, danos e demais delitos provenientes da ruptura. O término das investigações ocorreu durante o período da terceira dilação de prazo concedida pela Justiça, que se encerraria em 12 de março. Esta primeira etapa da investigação durou três meses e meio. O inquérito possui 13 volumes, 2.432 páginas e cerca de 100 oitivas, além de demais documentos de interesse da investigação.

Em razão da diversidade de crimes e complexidade das perícias técnicas, o inquérito inicial foi desmembrado em outro inquérito. O segundo procedimento instaurado pela Polícia Civil apura os crimes ambientais e licenciamentos da Barragem do Fundão, e o prazo para conclusão é de 30 dias, encerrando-se no dia 22 de março. Os laudos que comprovarão/materializarão estes delitos ambientais são de complexa elaboração e devem abordar os danos ambientais em sua amplitude, de forma que todos os aspectos de nosso ecossistema sejam considerados.

Causa do rompimento

Considerando-se as análises técnicas, o laudo pericial, que integra a investigação criminal da Polícia Civil de Minas Gerais, concluiu que a causa do rompimento da Barragem de Fundão foi a liquefação (processo que ocorre quando o sedimento sólido apresenta repentina redução na resistência), que ocorreu, inicialmente, junto aos rejeitos arenosos que suportavam os alteamentos (elevações) realizados na região esquerda da barragem, no local onde foi feito o recuo do eixo, abrangendo praticamente toda a extensão do recuo. Sete fatores atuaram para que ocorresse o processo de liquefação:

1. Elevada saturação dos rejeitos arenosos depositados na Barragem de Fundão, não apenas daqueles depositados sob o recuo do eixo da barragem cujo nível de água em seu interior atingiu a elevação aproximada de 878m (de acordo com leituras dos piezômetros indicados pelo consultor Pimenta de Ávila), mas também dos rejeitos arenosos depositados no restante da barragem, em virtude da existência de fluxo subterrâneo de água e de contribuições de nascentes no entorno.

2. Falhas no monitoramento contínuo do nível de água e das poropressões junto aos rejeitos arenosos depositados no interior da barragem e junto aos rejeitos constituintes dos diques de alteamento realizados.

3. Diversos equipamentos de monitoramento encontravam-se com defeito, não sendo realizadas, inclusive pelo pessoal da VOGBR, as respectivas leituras, quando da emissão do laudo de segurança da barragem.

4. Monitoramento deficiente em virtude do número reduzido de equipamentos instalados na barragem. Havia regiões descobertas dos alteamentos realizados, em termos do número de piezômetros e medidores de nível de água instalados.

5. Elevada taxa de alteamento anual da barragem, em função do grande volume de lama que era depositado em seu interior (cerca de 20m de altura por ano, em média). É sabido que o alteamento de qualquer barragem de rejeitos deve acompanhar a elevação do nível do lago formado. Nos dois últimos anos, os alteamentos foram realizados a uma taxa anual muito superior à recomendada na literatura técnica, que é de no máximo 10m de altura.

6. Assoreamento do dique 02, o que permitiu infiltração de água de forma generalizada para a área abrangida pelos rejeitos arenosos, no lado direito da bacia de deposição de rejeitos.

7. Deficiência junto ao sistema de drenagem interno da barragem cujos volumes de água drenados, de acordo com os resultados de monitoramento apresentados pela Samarco para o meses de setembro e outubro de 2015 eram semelhantes e até mesmo inferiores a resultados obtidos em 2014.

Indiciamentos:

1) Ricardo Vescovi de Aragão, diretor presidente da Samarco
2) Kléber Luiz de Mendonça Terra, diretor-geral
3) Germano Silva Lopes, gerente geral de projetos da Samarco
4) Wagner Milagres Alves, gerente de operações da Samarco
5) Wanderson Silvério Silva, coordenador técnico de planejamento e monitoramento da Samarco
6) Daviely Rodrigues da Silva, gerente de geotecnia e hidrogeologia, coordenadora de operações de barragens da Samarco
7) Samuel Santana Paes Lourdes, engenheiro responsável pela declaração de estabilidade da Barragem de Fundão, da empresa VOGBR

Crimes e penas: pelas penas previstas nos Art. 121, parágrafo 2, incisos III e IV, por 19 vezes; c/c Art. 29; Art. 254 e Art. 271, todos do Código Penal, na forma do Art. 70 do mesmo diploma legal.

Art. 121, parágrafo 2º (homicídio qualificado). Inciso III: de que possa resultar perigo comum. IV: ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido. Pena: reclusão de doze a trinta anos.

Art. 29 – Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. § 1º – Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. § 2º – Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

Art. 254 (inundação). Pena: reclusão de três a seis anos, e multa, no caso de dolo, ou detenção, de seis meses a dois anos, no caso de culpa.

Art. 271 (corrupção ou poluição de água potável). Pena: reclusão de dois a cinco anos.

Art. 70 (concurso formal). Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o disposto no artigo anterior. Parágrafo único – Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art. 69 deste Código.

Vítimas fatais:

1) Cláudio Fiúza da Silva, 41 anos. Natural de Brasília de Minas/MG. Funcionário da Integral Engenharia.
2) Waldemir Aparecido Leandro, 48 anos. Natural de Rio Acima/MG. Funcionário da Geocontrole BR Sondagens.
3) Samuel Vieira Albino, 34 anos. Natural de Belo Horizonte/MG. Funcionário da Geocontrole BR Sondagens.
4) Sileno Narkievicius de Lima, 46 anos. Natural de João Monlevade/MG. Funcionário da Integral Engenharia.
5) Emanuelle Vitória Fernandes Izabel, 5 anos. Natural de Mariana/MG. Moradora de Bento Rodrigues.
6) Marcos Roberto Xavier, 32 anos. Natural de Ouro Preto/MG. Funcionário da Vix Logística.
7) Edinaldo Oliveira de Assis, 40 anos. Natural de Mariana/MG. Funcionário da Integral Engenharia.
8) Thiago Damasceno Santos, 7 anos. Natural de Mariana/MG. Morador de Bento Rodrigues.
9) Marcos Aurélio Pereira de Moura, 34 anos. Natural de Mossoró/RN. Funcionário da Produquímica.
10) Claudemir Elias dos Santos, 41 anos. Natural de Santa Bárbara/MG. Funcionário da Integral Engenharia.
11) Pedro Paulino Lopes, 56 anos. Natural de Santa Rita Durão/MG. Funcionário da Manserv Montagem e Manutenção.
12) Daniel Altamiro de Carvalho, 53 anos. Natural de Barra Longa/MG. Funcionário da Integral Engenharia.
13) Maria Eliza Lucas, 60 anos. Natural de Alpercata/MG. Moradora de Bento Rodrigues.
14) Maria das Graças Celestino da Silva, 64 anos. Natural de Belo Horizonte/MG. Moradora de Bento Rodrigues.
15) Mateus Márcio Fernandes, 29 anos. Natural de Mariana/MG. Funcionário da Manserv Montagem e Manutenção.
16) Antônio Prisco de Souza, 74 anos. Natural de Mariana/MG. Morador de Bento Rodrigues.
17) Vando Maurilio dos Santos, 37 anos. Natural de Mariana/MG. Funcionário da Integral Engenharia.

Desaparecidos, mas também considerados vítimas fatais pela Polícia Civil:

1) Ailton Martins dos Santos, 55 anos. Funcionário da Integral Engenharia.
2) Edmirson José Pessoa, 48 anos. Funcionário da Samarco.

(Agência Minas)

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