Educação Ambiental no Brasil – Coluna Dr. João Domingos

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A Educação Ambiental se constituiu com base em propostas educativas oriundas de concepções teóricas e matrizes ideológicas distintas, sendo reconhecida como de inegável relevância para a construção de uma perspectiva ambientalista de sociedade. Tal fato é relativamente simples de compreender quando pensamos a Educação Ambiental – EA como uma práxis educativa que se definiu no próprio processo de atuação, nas diferentes esferas da vida, das forças sociais identificadas com o meio ambiente. Em resumo, por sua especificidade histórica, pela diversidade de agentes sociais e de documentos e leis que foram produzidos, a Educação Ambiental adquire no Brasil características peculiares e um grau de estruturação que torna o país um destacado protagonista no cenário internacional. Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, a política ambiental brasileira foi gerida de forma centralizada, tecnocrática, sem a participação popular na definição de suas diretrizes e estratégias, à luz da Lei Federal n. 6.938, de 31/08/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente. Nesta época, um viés conservacionista, influenciado por valores da classe média europeia, foi evidente.

Nesse contexto, a Educação Ambiental se inseriu nos setores governamentais e científicos vinculados à conservação dos bens naturais, com forte sentido comportamentalista, e voltada para o ensino da ecologia. Havia também iniciativas socioambientais, entendendo a natureza como totalidade indissociável, mesmo em órgãos de meio ambiente, contudo, não eram tendências hegemônicas. O ocorrido gerou uma separação prática, por vezes em decorrência das premissas de algumas abordagens teóricas no tratamento dos aspectos ecológicos e pedagógicos. Apesar deste cenário, de uma cultura política tecnocrática e das orientações econômicas contrárias a demandas emancipatórias, é preciso explicitar que outros processos simultâneos ocorreram favorecendo a construção de uma Educação Ambiental no país complexa e bastante diversificada. Logo, para estes educadores e educadoras ambientais não é possível pensar a construção da sustentabilidade sem uma profunda mudança no comportamento pedagógico. Além disso, no que se refere ao modo como a Educação Ambiental é concebida e realizada, este tipo de reflexão propiciada levou a se aceitar que há aspectos específicos do mundo da educação que precisam ser discutidos para que as atividades tenham consequências concretas de transformação. Definitivamente, não basta a boa-fé ambiental, a sensibilização ou a transmissão de conteúdos da ecologia, é preciso entender a dinâmica social e, particularmente, a educativa. Esse embate entre visões de mundo na Educação Ambiental, estabelecendo posicionamentos distintos, se estrutura em eixos que se desdobram em vários pressupostos e que formam diferenciadas abordagens, às quais é necessário dar a devida atenção, ao se assumir determinada opção teórica e metodológica. Temos a certeza de que somos seres naturais e de que nós realizamos e redefinimos culturalmente o modo de existir na natureza pela própria dinâmica societária. Convicção de que houve um afastamento de nossa espécie de relações adequadas, idealmente concebidas como inerentes aos sistemas ditos naturais, sendo necessário o retorno a esta condição natural pela cópia das relações ecológicas. Temos o entendimento de que somos constituídos por mediações múltiplas – sujeito social cuja liberdade e individualidade se definem na existência coletiva – sujeito definido numa individualidade abstrata, numa racionalidade livre de condicionantes sociais, cuja capacidade de mudança se centra no entendimento do que é educar como práxis e processo dialógico, crítico, problematizador e transformador das condições objetivas e subjetivas que formam a realidade, ou seja, educação como processo instrumental, comportamentalista, de adequação dos sujeitos a uma natureza vista como harmônica e como processo facilitador da inserção funcional destes na sociedade. Temos que ser seres buscadores de transformação social, o que engloba indivíduos, grupos e classes sociais, culturas e estruturas, como base para a construção democrática de sociedades sustentáveis e novos modos de se viver na natureza, numa busca incondicional por mudança cultural e individual suficiente para gerar desdobramentos sobre a sociedade e como forma de aprimorar as relações sociais.

Há na Lei uma preocupação com a construção de atitudes e condutas compatíveis com a questão ambiental e a vinculação de processos formais de transmissão e criação de conhecimentos a práticas sociais. Há também efetiva preocupação em fazer com que os cursos de formação profissional insiram conceitos que os levem a padrões de atuação profissional minimamente impactantes sobre a natureza, dando à educação ambiental uma dinâmica intensa em termos político-institucionais e de projetos de formação de amplos setores sociais.

Assim, avançam a estruturação de redes de diferentes escalas em diálogo permanente com o Governo Federal, ampliação de Centros de Educação Ambiental, criação de Comissões Interinstitucionais Estaduais de Educação Ambiental nos estados, o fomento à criação de polos locais, salas verdes, Coletivos Educadores, Coletivos Jovens e Agendas 21, inclusive escolares. Na exposição dos princípios norteadores do ProNEA, alguns se destacam: respeito à liberdade e apreço à tolerância; vinculação entre ética, estética, educação, trabalho e práticas sociais; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; compromisso com a cidadania ambiental ativa; transversalidade construída a partir de uma perspectiva interdisciplinar, entre outros igualmente importantes, que apontam para a vinculação da Educação Ambiental à construção da cidadania.

Temos uma Educação Ambiental extremamente complexa, que permite múltiplas abordagens da questão ambiental e suas causas, constituída por abordagens similares ou não. É uma educação ambiental crítica, emancipatória e transformadora, alfabetização ecológica, educação no processo de gestão ambiental, que favorece a construção de alternativas consistentes em diferentes espaços de atuação nas unidades de conservação, processo de licenciamento, movimentos sociais, escolas, empresas e órgãos governamentais, com a possibilidade de enfrentamento de qualquer tratamento reducionista do ambiente.

A atual estrutura dos Órgãos Gestores, enquanto espaços interministeriais (MEC e MMA), bem como a existência da PNEA, abre para a possibilidade de consolidação da Educação Ambiental como política pública de caráter universal e democrático. O diálogo com os movimentos sociais e mestres, tende a qualificar a capacidade da Educação Ambiental na promoção de sustentabilidade democrática e no enfrentamento dos problemas socioambientais que existem no país. A Educação Ambiental brasileira incorpora plenamente a discussão da indissociabilidade entre o social e o ecológico, não sendo, portanto, necessária a adoção de outras denominações recentes no cenário internacional que procuram superar esta lacuna observada em outros países em que está se definiu com um sentido estritamente ou fundamentalmente biológico. O diálogo entre a educação ambiental e a educação popular iniciado nos idos de 1980 e suas implicações para a politização aproximaram o assunto do mundo da educação. O diálogo entre a educação ambiental e a educação pode propiciar uma nova perspectiva educacional e preservacionista.

A ação participativa e problematizadora da realidade socioambiental na escola e a relação desta com outros espaços pedagógicos, é que formará as mentes preservadoras do futuro. A Educação Ambiental, enquanto prática educativa, integra um conjunto de relações sociais que se constitui em torno da preocupação com o meio ambiente e que poderíamos chamar de campo ambiental. Este campo, no Brasil, resulta de um processo histórico de articulação das políticas nacionais e internacionais relativas ao meio ambiente e à educação, bem como da inter-relação entre movimentos sociais e ambientais que se mundializaram, aumentando a sua esfera de influência recíproca. Neste sentido, a questão ambiental e, consequentemente, a educação ambiental no Brasil, não pode ser compreendida fora de um sistema de relações mundializadas, não sendo, portanto, nem um processo exclusivamente interno da sociedade brasileira, nem apenas uma percepção forjada de fora para dentro. Mas é principalmente nas décadas de 80 e 90, com o avanço da consciência ambiental, que a educação ambiental se expande no Brasil e se torna objeto de um conjunto significativo de políticas públicas e da agenda de movimentos sociais.

A educação ambiental, em 1972, tornou-se referência para políticas públicas na I Conferência Internacional sobre Meio Ambiente na Suécia. E em outras conferencias também reinou absoluta. A Organização das Nações Unidas (ONU), num ciclo de 20 anos que se convencionou chamar o “ciclo social” da ONU, manteve a temática da educação ambiental. Essa frente, durante décadas, manteve as políticas e programas ambientais como referência e ajudou países a desenvolver políticas públicas nacionais. A sociedade civil também se manifestou e criou movimentos ecológicos, que incorporaram a temática ambiental em suas agendas. No Brasil, somente a partir dos anos 80, a partir da Conferência da ONU para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável – em 1992 é que se deslanchou a real preocupação com o meio ambiente. Na Rio 92 foi o ponto de partida de uma luta sem trégua para amenizar os efeitos destrutivos ao meio ambiente e a partir daí criou-se uma série de movimentos com a finalidade de proteger e estudar o meio ambiente.

A partir da Rio 92, os movimentos ambientalistas ganharam grande influência na difusão e na construção da identidade da Educação ambiental. A educação ambiental surgiu, sobretudo, da necessidade de se preocupar com uma nova sociedade que surgia. Assim, a educação e os movimentos ecológicos caminharam juntos. Não se pode mais separar os objetivos. As críticas ao empreendimento destruidor têm parceria dos movimentos ecológicos juntamente com a educação ambiental que desde a década de 70 lutam pela preservação ambiental.

Se a década de 70 é considerada o marco do aparecimento de movimentos protetores do meio ambiente, mais precisamente em 1974, quando começou a surgir associações e movimentos ambientalistas gerando despertamento nacional para a causa ambiental, os anos 80 foram de iniciação de uma época de esperança, com a vitória dos direitos civis, e a consequente entrada da causa ambiental na discussão nacional. No início houve muita resistência. Os operários viam a causa ambiental como fonte de desemprego, porém, os movimentos seringais é quem foram os precursores da mudança nessa história. À educação ambiental juntou-se o diálogo e isto propiciou o surgimento de uma educação ambiental preocupada com as questões de orientação pedagógica entre as práticas da educação ambiental, e a educação ambiental crítica, ao promover a discussão de acesso aos recursos ambientais. Surgiu daí um cidadão mais politizado nas causas ambientais. Somente a conscientização tem preparado o homem para o futuro ecológico. E continuar inserindo a educação ambiental é o único caminho para preparar as gerações futuras. A educação ambiental nessa visão tem de ser permanente e para todas as idades. Desde a infância e nos demais grupos de educação e social. Os educadores ambientais são os instrumentos para que a conscientização possa se propagar e perpetuar, sendo, sobretudo, mediadores da compreensão entre os grupos que se relacionam com o meio ambiente. Sua interpretação pode ser e deve ser contagiosa para proporcionar novas experiências de aprendizagem entre os atores que se cruzam entre o ambiente natural e social.

Com o passar dos anos e novas frentes de lutas, vem surgindo outras ferramentas de apoio ao meio ambiente dentre elas cotas para emissão de poluentes, incorporação de valor de um bem ambiental no produto final, pagamento do custo de direitos ambientais afetados, dispositivos econômicos direcionados ao mercado de carbono, tudo visando ter um efeito no impacto ambiental para frear os impactos negativos entre acumulação econômica e a preservação ambiental. O modelo desenvolvimentista, entre as quais está a proposta do desenvolvimento sustentável, tem um viés clássico quando se trata de educação ambiental. Conviver é o grande desafio. Preservar e tornar-se intocável retira do meio ambiente a proposta de que homem e meio ambiente podem conviver em harmonia.

A educação ambiental propõe a convivência harmoniosa. Usufruir e preservar para continuar usufruindo no futuro. A existência humana é a razão de se preservar o meio ambiente. O futuro da vida depende disto. A criação de sociedades sustentáveis, possibilita a chegada de um homem com uma capacidade de entender o meio ambiente e fortalecer a potência de ação dos grupos envolvidos na ideia de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, sustentável no futuro. Preservar, restaurar, manejar, fiscalizar, criar áreas protegidas, a educação ambiental deve trabalhar sempre com essas premissas dentro de uma visão modernizadora de que o homem vive em universo pessoal e que demanda extração para consumo e por isso precisa aprender a fazer uso racional da natureza e isto só terá efeito positivo se ensinado a conviver com o meio ambiente. O educador ambiental tem essa dupla responsabilidade, ensinar a realidade da vida no cotidiano, e criar entendimento nas várias esferas legais para que o homem possa conviver com os significados econômico, estético, sagrado, etc. Em razão da Constituição Federal, é o Poder Público responsável por ordenar as práticas protetivas de gestão ambiental pública.

A destruição que vem ocorrendo com o meio ambiente é responsabilidade de todos nós. Os poderes constituídos que tem o dever de proteger e o homem que tem a obrigação moral de cuidar – devem caminhar juntos para que o futuro seja menos sombrio para os nossos filhos. Assim deve o gestor público praticar a gestão ambiental pública dentro das regras da legislação ambiental para equilibrar a convivência humana no universo ambiental. Todas as interferências do estado no meio ambiente devem seguir os padrões legais para evitar danos desnecessários e irreparáveis e somente a educação ambiental pode ajudar na conscientização de todos e agir diretamente na participação das comunidades e nas discussões da gestão ambiental, principalmente, nas salas de aulas. A comunidade escolar deve ser estimulada pela educação ambiental a conservar todas as áreas em que haja intervenção humana. Está na Constituição o seu papel. A Lei n. 9.795/99, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental e em seu Decreto regulamentador (Lei n. 4.281/02), indica o caminho a ser seguido. Se a sociedade humana desconhece os elementos da prática consciente e a unidade dialética entre teoria e prática, na construção do conhecimento sobre a realidade, não poderá transformá-la, com a mediação de critérios éticos que são a base da Educação no Processo de Gestão Ambiental. O homem quando falar de meio ambiente tem que entender que fala de si mesmo. Essa conscientização técnica somente a educação ambiental pode proporcionar, somente um processo educativo pode formar homens ‘humanizados’, conscientes de si mesmo e das práticas ideais no meio que vive.

Portanto, a Educação Ambiental gera mudança de comportamento quando centrada nos conhecimentos técnicos sobre os processos e sua atuação universal no processo político no campo dos valores e comportamentos dentro de uma sociedade sustentável, fazendo com que o homem, mudando suas práticas, conviva de forma harmoniosa no meio em que impera.

Dr. João Domingos é advogado, vereador em Ladainha e pós-graduado em Gestão Ambiental e Docência do Ensino Superior (www.facebook.com/joaodomingos.domingos.5)


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